Para presidente, governo deve priorizar áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte
Dhiego Maia / Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) defendeu nesta sexta-feira (26) uma medida polêmica: descentralizar os investimentos para os cursos de filosofia e sociologia no país. A iniciativa é uma das bandeiras de seu ministro da Educação, Abraham Weintraub.
Weintraub propôs a contenção de recursos para as duas áreas do conhecimento em uma transmissão ao vivo pelo Facebook de Bolsonaro nesta quinta-feira (25). Ao lado do presidente, Weintraub, disse que "a função do governo é respeitar o dinheiro do pagador de imposto".
"Então, o que a gente tem que ensinar para as crianças, para os jovens? São, primeiro, habilidades, de poder ler, escrever, fazer contas". Para o ministro, também é importante ensinar um ofício que "gere renda para a pessoa, bem-estar para a família, que melhore a sociedade em volta dela".
Sobre a alteração na distribuição de recursos para faculdades de humanas, o ministro citou o Japão como exemplo. "Ele [Japão] está tirando dinheiro público do pagamento de imposto de faculdades que são tidas como para uma pessoa que já é muito rica ou de elite, como filosofia", disse Weintraub.
Nesta sexta, o presidente voltou ao assunto na mesma rede social e reforçou a ideia de Weintraub. Para Bolsonaro, o objetivo da proposta em estudo é “focar em áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte.”
Segundo Bolsonaro, as áreas mais competitivas são aquelas ligadas à "medicina veterinária, engenharia e medicina". O presidente e nem o ministro detalharam como a proposta será posta em prática.
Bolsonaro só disse apenas que os alunos já matriculados em filosofia e sociologia “não serão afetados”.
Segundo o presidente, a função do governo “é respeitar o dinheiro do pagador de impostos, ensinando para os jovens a leitura, escrita e a fazer conta e depois um ofício que gere renda para a pessoa e bem-estar para a família, que melhore a sociedade em sua volta”, escreveu no Facebook.
UNIVERSIDADE PÚBLICA NÃO FAZ PESQUISA
Essa não é a primeira polêmica do presidente envolvendo o ensino superior. Recentemente, Bolsonaro declarou nas redes sociais que “poucas universidades têm pesquisa, e, dessas poucas, a grande parte está na iniciativa privada, como a Mackenzie em São Paulo”.
A informação do presidente é incorreta, segundo mostrou análise publicada na Folha pelos especialistas em educação, Sabine Righetti e Estevão Gamba.
O Brasil está entre os 15 países com a maior quantidade de estudos científicos publicados no mundo. Cientistas brasileiros lançaram cerca de 200 novos artigos acadêmicos diariamente em 2017. A maioria desses trabalhos está em instituições públicas.
USP, Unesp e Unicamp produzem, sozinhas, um terço de toda a ciência feita nas 198 universidades do país. Essas instituições lideram um grupo de universidades brasileiras intensas em pesquisa, que também conta com federais como UFRJ, UFMG e UFRGS. Nenhuma delas é privada.
Informações sobre a pesquisa científica no Brasil —como quantidade de artigos produzidos, produtividade per capita dos docentes, recursos captados para ciência e impacto dessas publicações acadêmicas— estão no RUF (Ranking Universitário Folha) desde 2012.
O RUF 2018 mostra, por exemplo, que a Unicamp tem os docentes e os pesquisadores mais produtivos do país. Que os trabalhos acadêmicos dos professores da USP são os mais mencionados. Que a UFABC é a universidade brasileira com mais pesquisas inseridas internacionalmente.
Ao contrário do que afirmou o presidente, o RUF 2018 mostra que a maioria das 93 universidades particulares do país produz pouca ciência —as exceções são as instituições moderadas em pesquisa, como as PUCs Rio, Rio Grande do Sul e Paraná.
Mais da metade dessas universidades sequer consegue manter insumos fundamentais para a atividade científica (como um terço dos professores em dedicação integral ou um número mínimo de programas de pós-graduação). Na prática, não poderiam, legalmente, ter status de “universidade”.
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