- O Globo
Áudio de Onyx esclarece que houve sim intervenção na Petrobras e em duas etapas: na periodicidade dos reajustes e na revogação da alta
O ministro Onyx Lorenzoni, ao mandar a mensagem para caminhoneiros dizendo que o presidente daria uma “trava” na Petrobras, estava queimando as possibilidades de convencer o país de que a estatal é livre para fazer seu preço. O ministro Paulo Guedes e o presidente da Petrobras bem que tentaram persuadir os interlocutores de que nada havia acontecido, mas a divulgação, ontem, do teor do áudio mostra que tudo é o que parece.
Esta semana inteira foi dedicada ao esforço de desfazer a impressão de que acontecera uma intervenção. O ministro da Economia disse e repetiu que foi apenas um telefonema do presidente da República ao dirigente da estatal para levantar uma dúvida e dizer uma frase espirituosa: “quando eu comemoro os 100 dias, você quer jogar diesel no meu chope?”. E o presidente teria ligado apenas porque não entendeu o aumento. Se toda vez que Bolsonaro não entender algo ele provocar tanta confusão como dessa vez o país viverá aos solavancos.
A divulgação ontem da mensagem do chefe da Casa Civil liquidou a fatura. Houve intervenção e em duas etapas. Primeiro ele “deu uma trava” determinando a periodicidade, e depois revogou uma alta já anunciada.
Quando entrevistado na GloboNews, em 3 de agosto, durante a campanha, o então candidato Jair Bolsonaro disse que poderia privatizar a Petrobras. Na última quinta-feira, falou à jornalista Natuza Nery que tem “simpatias” pela ideia. Sua convicção é volátil. Vai de um extremo ao outro. Da intervenção à simpatia pela privatização.
O governo apresentou uma série de medidas para desfazer o nó criado com a crise do preço do diesel e as ameaças de paralisação dos caminhoneiros. Algumas decisões são boas, mas não são novas. Anunciou R$ 2 bilhões para uma série de obras de melhoraria das estradas, como a BR-163, em termos parecidos com o que houve nos PACs. Quando foi perguntado sobre o fato de outros governos terem prometido as mesmas obras, o ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomes de Freitas disse que agora é diferente.
— Porque estamos aqui, só por isso. Vai acabar porque vamos acabar. Fizemos 23 leilões em 100 dias, simples assim.
Essa nova versão do “la garantía soy yo” ficou ainda mais enganosa porque o ministro Tarcísio foi diretor do DNIT no governo Dilma. Ou seja, ele está lá há bastante tempo. Outro detalhe: os leilões feitos nesses 100 dias iniciais foram preparados pelo governo Temer.
A intenção de melhorar a qualidade das estradas sempre será boa, para os caminhoneiros e todos os que trafegam nas perigosas e mortais estradas brasileiras. Torçamos para que dê certo. O problema é o anúncio ter vindo no meio de tanta demagogia. O ministro Onyx Lorenzoni disse, na coletiva em que foram apresentadas as medidas para agradar os caminhoneiros, que “este é um governo diferente, um governo do diálogo, dialogamos com o parlamento e com todos os setores. Eles têm sido ouvidos”. Como prova falou que havia sido criado o Fórum de Transporte Rodoviário de Carga. A verdade é que este é o governo que mandou dissolver inúmeros foros de diálogo. Só quer conversa com os seus. “A questão é que os caminhoneiros têm carinho e consideração pelo presidente e o presidente tem carinho e consideração por eles”, disse o chefe da Casa Civil.
Os caminhoneiros são fundamentais num país desta dimensão, que depende tanto do modal rodoviário. E é importante que eles sejam ouvidos. Governos democráticos ouvem setores. Todos. Não apenas aqueles pelos quais têm carinho e consideração.
As outras medidas, como a linha de crédito para a compra de caminhão, também não são novas. Se alguém tivesse dormido nos últimos quatro anos, e acordasse em meio à coletiva da manhã de terça-feira com o ministro Tarcísio ficaria convencido de que era o governo Dilma anunciando mais um daqueles pacotes de dinheiro do BNDES.
“O capitão aqui jamais vai abrir mão de defender e proteger os caminhoneiros”, disse Onyx no aúdio ao grupo. Em vez de negociar uma saída, o ministro promete adesão. Esse é um assunto incandescente. Os caminhoneiros não querem aumento, mas a intervenção do presidente na formação de preços da Petrobras tem o poder de desmontar todo o projeto de atrair grandes investimentos privados para o setor de petróleo.
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