O Estado de S. Paulo
Os líderes do Centrão subiram
o sarrafo ao patrocinarem a escandalosa e pouco transparente votação de R$ 5,7
bilhões para o fundo eleitoral em plena pandemia da covid-19.
A maioria dos partidos apoiou a manobra para garantir esses recursos, numa
votação sem que o placar identificasse os nomes a favor e contra.
Mandaram às favas as pressões e as críticas
à destinação dessa montanha de dinheiro para o financiamento das campanhas dos
partidos e, de quebra, prejudicaram investimentos nos Estados.
A verba para o fundo eleitoral vai sair
justamente do espaço do Orçamento destinado
ao pagamento de emendas de bancadas. Esse tipo de emenda prevista no Orçamento,
pelo menos em tese, permite que os parlamentares de um mesmo Estado, ainda que
de partidos diferentes, se juntem para apoiar projetos mais estruturantes para
as suas localidades, como, por exemplo, uma obra de uma importante rodovia
estadual.
Essa dimensão do gasto é importante porque a maioria dos líderes do Centrão é de oposição aos atuais governadores, sobretudo no Nordeste e no Norte. Eles não têm, portanto, nenhum interesse em favorecer obras em ano eleitoral que possam beneficiar governadores que são seus adversários.
O que os parlamentares fizeram ao rechear o
cofre do fundo eleitoral foi tirar verba de projetos que beneficiariam a vida
de quem os elegeram em 2018 para ganhar em 2022.
E esse mesmo ciclo implacável continuará em
2023, se os eleitores não levarem em consideração o que aconteceu nesta e em
outras importantes votações do Congresso –
que promovem o “tratoraço” orçamentário – na hora de depositar o voto na urna
no ano que vem.
Especula-se, equivocadamente, que essa
verba para a campanha ficaria fora do teto porque as despesas da Justiça
eleitoral já escapam dessa regra constitucional, que impõe um limite ao
crescimento anual das despesas.
Não é bem assim. Somente gastos não
recorrentes da Justiça eleitoral com a realização de eleições, como o custeio
das urnas e com a operação do pleito, é que integram a lista de exceções
incluída na Constituição.
A verba para o fundo eleitoral é um gasto
que está, portanto, dentro do teto. Para o governo federal, porém, o incremento
dos recursos para o fundo, consumindo espaço das emendas de bancada, não é lá
um risco fiscal muito grande a pressionar as despesas de custeio da máquina
administrativa.
Por isso, é pouco provável que o
presidente Jair Bolsonaro vá vetá-lo. Como é dinheiro de emenda de
bancada já contratada, o governo vai dizer que essa é uma decisão do Parlamento
e deixar para lá.
Em 2020, Bolsonaro foi chamado nas redes
sociais de traidor, inclusive por antigos apoiadores, por ter sancionado o
Orçamento com R$ 2 bilhões para a campanha das eleições municipais. Mas o jogo
seguiu, e as pressões da sociedade contra essas velhas práticas políticas têm
sido ignoradas pelos parlamentares. É bem verdade que o uso das emendas de
bancadas tem sido desvirtuado e se transformado, num varejão de obras
paroquiais.
Sob todos os aspectos, porém, há uma perda
substancial da qualidade do gasto, que poderia ser usado para combater os
efeitos duradouros da pandemia nas áreas de saúde, educação, social e estímulo
ao emprego. Todos que votaram a favor do fundo sabem que o impacto negativo da
pandemia não fica restrito a 2020 e 2021. Ainda assim, deram um sim na votação.
Os congressistas também incluíram novamente
as chamadas RP9, como são chamadas as emendas do relator, que abriram a brecha
para a formação de um orçamento paralelo bilionário, veículo de distribuição de
verbas sem os critérios e transparência das demais emendas.
Essas emendas de relator são hoje o que
garante a organização da coalizão política que dá governabilidade ao
presidente, substituindo as “malas de dinheiro” para a compra de voto e apoio.
Seguindo o script de antes, o presidente deve vetar a RP9, e o Congresso,
derrubar o veto. Tudo bem combinadinho.
No embalo do aumento do fundo eleitoral, o
Congresso também retirou proposta da Economia que tentava restringir os abusos de
contabilidade criativa na revisão de projeções de queda das despesas
obrigatórias, fonte do impasse político em torno do Orçamento deste ano.
É em meio a esse caldo político que o
Orçamento do ano eleitoral de 2022 estará sendo construído, e a reforma tributária do Imposto de
Renda, votada. Já dá para imaginar no que vai dar.
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