Folha de S. Paulo
Mercado acredita em mais carestia, alta de
juros nos EUA pode afetar Brasil
A cada semana a guerra da inflação parece
um pouco mais perdida para Jair
Bolsonaro. Nesta quarta (26), foi
divulgada a taxa do IPCA-15 de janeiro, que veio um tico acima da média
esperada pelos povos dos mercados financeiros. Foi o bastante para montes de
bancos, corretoras e consultorias elevarem seus chutes informados, previsões,
para a inflação deste ano.
Antes de continuar: o IPCA-15 é a inflação
medida de meados do mês passado, dezembro, no caso, a meados deste. O IPCA
mensal, medida "oficial" de inflação para o consumidor, mede a
inflação de um mês só, mês "cheio".
O problema vai bem além disso, de revisão pessimista das projeções da carestia, especialmente em termos políticos. Bolsonaro e o centrão estão ouriçados para aloprar, baixar impostos e fazer dívida extra de dezenas de bilhões de reais a fim de tentar baixar os preços de gasolina, diesel e a conta de luz (apenas tentar: nem isso pode dar certo). O tiro pode sair pela culatra, nas nossas fuças, porque um aumento de déficit pode ter efeito em taxas de juros e dar um sinal de que o governo pode tentar medidas ainda mais desesperadamente idiotas ou perigosas.
Como se não bastasse, em março começa de
fato e no dinheiro a mudança
da política monetária dos Estados Unidos (nas taxas de juros de lá). Em
março também, o país das elites e do dinheiro começa a prestar atenção à
campanha eleitoral. O Fed, o banco central americano, avisou
nesta quarta que em março para de vez de comprar títulos públicos e privados (na
prática, subsidia, reduz, as taxas de juros no mercado) e que passa a elevar
sua taxa básica, que está perto de zero e, em termos reais, muitíssimo
negativa. Em geral, não são boas notícias para o preço do dólar, quando não
causa confusão maior (como ocorreu aqui em 2013).
Nas previsões para o ano, o IPCA seria de
algo entre 5% e 6% (embora o banco Credit Suisse tenha elevado sua previsão
para 6,2%). Deve ser, portanto, menor que os 10% de 2021. Mas, pelas
estimativas de agora, a inflação anual (acumulada em 12 meses) deve ficar pela casa
de 9% até junho e em 7% em setembro, véspera da eleição. Não vai dar para
sentir o refresco, até porque os salários, na média, vão estar represados por
causa da economia estagnada.
Pode ser pior, como sabemos: a safra de
grãos não vai ser tão boa como se previa, o preço da carne vai ficar nas
alturas, o preço do petróleo continua a subir. A inflação está ainda mais
disseminada (há mais produtos e serviços ficando mais caros). A carestia nos
serviços não está com cara boa e tende a aumentar (por causa da reabertura e
reajustes de aluguéis e outros serviços com contratos de reajuste).
Não, não é uma disparada —por ora, a
expectativa é de inflação menor, repita-se. O problema é a inflação caindo
devagar em um ambiente inflamável, com eleição por aqui, alta de juros nos EUA
e, para ajudar, tumulto
político na Europa (a crise da Ucrânia).
Inflação, ainda mais inflação de comida, é
veneno de popularidade. O que Bolsonaro vai aprontar?
Por ora, tem essa especulação de emenda constitucional para reduzir impostos
sobre energia. Por vezes, essas bolhas de rumores inflam em meses de férias do
Congresso, embora Bolsonaro venha falando disso faz meses. Mesmo que passe no
Congresso, pode não tem impacto relevante em preços.
Dado o tamanho do estrago na popularidade
do governo, por atrocidades várias, laborfobia, incompetência, genocídio e
inflação, o que mais Bolsonaro vai querer inventar? O que pode fazer se, além
de continuar impopular, vir debandada de aliados lá por março e abril?
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