quinta-feira, 17 de novembro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Discurso de Lula na COP27 resgata papel do Brasil

O Globo

Presidente eleito errou feio ao aceitar carona em jatinho de empresário, mas falou o que se esperava dele

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva errou feio ao aceitar a carona no avião de um empresário envolvido na Operação Lava-Jato para Sharm el-Sheikh, no Egito, onde acontece a conferência do clima das Nações Unidas, a COP 27. A atitude mostra que não apenas a extrema direita acampada diante dos quartéis vive numa realidade alternativa. As amizades do PT com empresários estão na raiz de escândalos de corrupção que o Brasil não esqueceu — e nem deveria.

É uma pena, pois a presença de Lula na COP27, além de bem-vinda, é essencial para resgatar o Brasil dos escombros a que foi lançado pela diplomacia errática e pela política ambiental devastadora do governo Jair Bolsonaro. Em seu discurso, Lula falou o que se esperava. Prometeu lutar contra o desmatamento ilegal, cuidar dos povos indígenas e dar cidadania aos habitantes da região. Em tempos normais, seria um discurso previsível. Depois de quatro anos de destruição da Amazônia sob Bolsonaro, foi um alívio.

É notável a presença brasileira na COP27. A ida de Lula, de ambientalistas respeitados, como a deputada federal eleita Marina Silva (Rede-SP) ou a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, de governadores, senadores e representantes da sociedade civil demonstra o amplo apoio da sociedade brasileira à causa ambiental. Marca a saída de cena da ideologia do atual governo, baseada na ideia de que o futuro do território amazônico depende da ocupação, mesmo que ilegal, por garimpeiros, madeireiros e grileiros. É uma visão absurda, pois inexiste oposição entre preservação e soberania.

Ao revelar a intenção de realizar a COP30 na Amazônia em 2025, Lula implicitamente assumiu compromisso com resultados de sua política ambiental antes do fim do mandato. Não será fácil. Como afirmou Marina ao GLOBO, será gigantesco o trabalho para reerguer o aparato estatal. A infraestrutura de monitoramento está sucateada, as equipes de fiscalização sofrem carência crônica de pessoal e, pior, falta previsão no Orçamento para recuperar tudo isso. Enfrentar tal quadro demandará capacidade de gestão ímpar do próximo ministro do Meio Ambiente.

Para obter sucesso, o novo governo precisará trabalhar em sintonia. Terá de exercer todo o poder de repressão do Estado contra o desmatamento e, ao mesmo tempo, buscar investimento nacional e estrangeiro para gerar empregos em atividades ambientalmente responsáveis. Mesmo num cenário imaginário em que na Amazônia houvesse fartura de emprego, o crime organizado e os destruidores da floresta não desapareceriam da noite para o dia. É irreal imaginar uma situação sem a necessidade de combater grileiros, garimpeiros e madeireiros ilegais.

Ao mesmo tempo, é forçoso reconhecer que a penúria na região é um catalisador para o desmatamento. Os países ricos, maiores responsáveis pela crise climática, têm o dever moral de financiar maciçamente projetos voltados à população amazônica. Uma Amazônia com as árvores em pé e um povo miserável não garante um futuro sustentável. Lula acertou em Sharm el-Sheikh ao ressaltar a necessidade de cuidar das pessoas, não só dos biomas.

Espera-se que, doravante, acerte também ao separar o espaço público de interesses privados, entenda que a anulação de processos na Lava-Jato não foi salvo-conduto para retomar práticas nefastas e recuse caronas, presentes e favores dos “empresários amigos”.

Diretor da Polícia Rodoviária Federal deveria ser afastado

O Globo

Silvinei Vasques transformou a PRF numa corporação a serviço de Bolsonaro e do bolsonarismo

O Ministério Público Federal (MPF) fez bem ao pedir o afastamento do diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silvinei Vasques, acusado de usar indevidamente o cargo para favorecer a campanha à reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Ainda que falte menos de um mês e meio para o fim do atual governo, Silvinei não tem condições de permanecer no comando da corporação, sob o risco de contaminar ainda mais a imagem dela com o bolsonarismo.

Em ação na Justiça Federal do Rio, o MPF pede também a condenação de Silvinei por improbidade administrativa. Ele é acusado de fazer campanha para Bolsonaro em diversos eventos. Às vésperas do segundo turno, pediu explicitamente numa rede social voto para o presidente, mensagem que depois apagou. Para o MPF, o ato, além de configurar ilícito eleitoral, demonstra uso do mais importante cargo na hierarquia da PRF para favorecer determinado candidato, “violando de morte os princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade”.

Silvinei é investigado também pelas blitzes deflagradas pela PRF no dia do segundo turno. As inspeções causaram engarrafamentos em inúmeras rodovias, atrasando ou impedindo eleitores de chegar às seções eleitorais. O maior contingente de agentes foi empregado em estradas do Nordeste, reduto eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Silvinei chegou a desrespeitar uma ordem do ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O empenho incomum da PRF no dia da eleição não se repetiu no dia seguinte, após a vitória de Lula, quando, em protestos golpistas, caminhoneiros bolsonaristas bloquearam estradas gerando engarrafamentos quilométricos por todo o país. A PRF só agiu quando Moraes ameaçou multar ou até prender Silvinei caso ele não tomasse providências para liberar as rodovias.

Convertida ao bolsonarismo, a PRF tem tomado decisões patéticas. Recentemente, o setor de inteligência da corporação, que não deve ter mais com que se ocupar, enviou um ofício à Wikipédia pedindo a exclusão da página com o perfil de Silvinei. Argumenta que o conteúdo reúne informações inverídicas, com objetivo de prejudicar a imagem da corporação e dele. A página cita apenas fatos conhecidos.

A PRF tem um trabalho importantíssimo a executar nas rodovias, não só na fiscalização do Código de Trânsito Brasileiro, mas também na vigilância dos carregamentos de drogas e armas que abastecem as organizações criminosas. No governo Bolsonaro, ela se afastou das estradas para participar de operações em favelas, com letalidade inaceitável. Precisa voltar ao seu papel de origem. Trata-se de uma instituição de Estado, que não pode estar a serviço do governo de turno. Quanto mais tempo Silvinei permanecer no cargo, mais danos causará à corporação e ao próprio Brasil.

Deslizes aéreos

Folha de S. Paulo

Viajar às expensas de empresários não ajuda imagem de Lula e de ministros do STF

Na condição de presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está no centro das atenções e das expectativas —e do escrutínio e da cobrança— de um país que segue marcado por antagonismos políticos e dúvidas quanto ao futuro.

Nesse contexto, a viagem do petista e de seus convidados à COP27, no Egito, a bordo do jato particular do empresário amigo José Seripieri Filho, que foi alvo da Operação Lava Jato, foi um mau passo que não passaria despercebido. O episódio, revelado pela Folha, criou ruído, explorado por opositores, e provocou desconforto mesmo entre apoiadores.

De acordo com informações colhidas em círculos do entorno de Lula, o risco de repercussão negativa havia sido previamente detectado. Alertas foram emitidos e, como se viu, desconsiderados.

Também se alegaram dificuldades objetivas para o transporte, uma vez que não há verbas oficiais para custear despesas de um presidente eleito, e o PT não teria recursos para fretar um jato. Aventou-se ainda, segundo relatos, a possibilidade de pedir apoio ao atual governo, mas temeu-se, em caso de concordância, pela segurança —um receio que soa fantasioso.

Por fim, foi descartada a opção que parecia a mais adequada, recorrer a um voo comercial. Assim fez, aliás, a correligionária Dilma Rousseff, em novembro de 2010, quando compareceu a uma reunião do G20 na Coreia do Sul após vencer a disputa ao Planalto.

Por si só, o usufruto da aeronave por Lula não contraria formalmente a lei, ainda mais antes da posse. Mas decerto não ajuda a imagem de um futuro governante —e, no caso, um ex-presidente com pesada bagagem de casos rumorosos— aceitar favores generosos de detentores do poder econômico.

Na mesma direção, também não deve ser tomada como procedimento corriqueiro a viagem de cinco ministros do Supremo Tribunal Federal a Nova York, com direito a hospedagem, para participar de evento patrocinado pela Lide, organização comandada pelo empresário João Doria, ex-governador de São Paulo.

Mais uma vez, não se pode considerar que o fato em si demonstre favorecimento ou falta de isenção dos magistrados. Porém, uma hipotética decisão de Lula ou do Supremo que beneficie os citados empresários correrá sempre o risco de ser criticada à luz de uma suposta licenciosidade pregressa.

Trata-se, sobretudo, de valorizar a liturgia republicana de modo a não oferecer margem a interpretações, capciosas que sejam, sobre possíveis conflitos de interesses.

Recessão democrática

Folha de S. Paulo

Avanço global do autoritarismo é fenômeno complexo que precisa ser combatido

Dos 8 bilhões de habitantes do mundo, 5,7 bilhões, ou mais de 70%, vivem em ditaduras ou em autocracias eleitorais —que são, segundo a terminologia do instituto sueco V-Dem, regimes nos quais há eleições, mas vários componentes da democracia, como liberdade de expressão e mecanismos de controle institucional, estão prejudicados.

Onze anos atrás, quando o planeta atingiu a marca dos 7 bilhões de habitantes, essa proporção era de 50%. No período, o número de autocracias fechadas passou de 25 para 30, um incremento relativamente modesto. Houve, porém, deterioração qualitativa em indicadores de democracia em vários países.
Boa parte do salto de 50% para 70% se explica porque a Índia, com 1,4 bilhão de habitantes, deixou de ser uma democracia para tornar-se uma autocracia eleitoral.

Regressões foram observadas também em países que não chegaram a perder o status de nação democrática, caso do Brasil. Mesmo os EUA e países avançados da Europa tiveram problemas, respectivamente, com a eleição de Donald Trump e o fortalecimento de partidos com tendências autoritárias.

Contudo vale registrar que brasileiros puseram fim ao governo Jair Bolsonaro (PL), que investia na corrosão institucional, e americanos derrotaram nas urnas a ala trumpista do Partido Republicano.

Há também países que já não se encontravam no campo da democracia e experimentaram piora.
É o caso da Rússia, que provocou uma guerra ao invadir a Ucrânia, intensificando a repressão interna, e da China, que deixou de ser uma ditadura coletiva, conduzida por partido único, para converter-se numa bem mais personalista sob Xi Jinping, que afastou rivais e eliminou barreiras a sua liderança.

Várias teorias tentam compreender o fenômeno. Há aquelas que recorrem à economia, as que se fundam na psicologia, outras que responsabilizam as redes sociais. Todas têm algum poder explicativo, mas é difícil apontar uma que comporte as diversas instâncias de regressão em todos os países.

O medo da imigração, por exemplo, parece ser um dos principais ingredientes a alimentar o populismo direitista nos EUA e na Europa, mas ele pouco esclarece sobre a situação no Brasil ou na Índia.

A recessão democrática contemporânea é um fenômeno complexo e não pode ser subsumido em um modelo simples. Isso não nos desobriga de tentar compreendê-lo em suas múltiplas dimensões nem de buscar antídotos —já que ainda não se encontrou um sistema de organização social e política superior à democracia liberal.

A bomba fiscal dos Estados

O Estado de S. Paulo

Atual governo parece ter esquecido que dívidas estaduais têm garantia da União e responsabilidade solidária do Executivo com entes federados. Caberá a Lula lidar com esse problema

Os bons resultados fiscais apresentados pelos Estados nos últimos anos estão muito próximos de serem revertidos, situação que parece distante das prioridades do gabinete de transição do governo eleito. Depois de apresentarem um superávit de R$ 64,8 bilhões em 2020 e de R$ 124,1 bilhões no ano passado, os Estados devem voltar a apresentar dificuldades para arcar com suas despesas em 2023, o que pode resultar em corte nos investimentos, salários atrasados para o funcionalismo público e redução na oferta e na qualidade de serviços de saúde e educação.

O jornal Valor revelou que os Estados devem registrar uma perda nominal de R$ 25,1 bilhões em receitas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) neste ano. O cálculo, que considera a arrecadação apurada entre julho e outubro e projetada para novembro e dezembro, é o resultado de duas leis complementares aprovadas pela Câmara e pelo Senado neste ano. As mudanças, que impuseram um teto e alteraram a base de incidência do tributo, têm caráter definitivo sobre aquela que é a maior fonte de arrecadação dos governos regionais e que incide sobre combustíveis, energia, comunicações e transportes.

Mesmo ciente desses efeitos, o governo Jair Bolsonaro apostou na popularidade eleitoral proporcionada pela redução nos preços dos combustíveis e nas faturas de energia e telecomunicações e investiu na descredibilização do discurso dos governadores. Para vencer as poucas resistências, o governo se comprometeu a compensar os Estados com perdas acima de 5%, mas somente em 2023 e após comparar a arrecadação de todo o ano de 2022 à de 2021.

O Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) já havia estimado que o prejuízo alcançaria R$ 125 bilhões em 12 meses e, agora, instituições financeiras começam a respaldar as contas dos Estados. Como mostrou o Estadão, o Itaú estimou que os Estados terão de fazer um ajuste fiscal da ordem de R$ 70 bilhões para se adaptar às consequências das leis e manter as contas em dia. Se as receitas e despesas forem mantidas, os entes federativos deverão registrar um déficit de 0,7% na proporção do Produto Interno Bruto (PIB), após um provável superávit primário de 0,5% neste ano.

Não faz muito tempo que os Estados eram fonte de preocupação para o governo federal, o que mostra que o País nada aprendeu com os erros do passado. Do lado das receitas, situações atípicas e relacionadas à pandemia de covid-19 foram consideradas permanentes, entre elas o reforço das transferências da União, a proibição dos reajustes de salários de servidores e os efeitos da reabertura da economia e da inflação elevada. De caráter rígido e permanente, o custeio de despesas com saúde e educação pode ser fortemente comprometido, um aspecto que tem passado despercebido nas discussões dos necessários ajustes no Orçamento fictício de 2023 – sem contar o financiamento do piso nacional da enfermagem aprovado pelo Legislativo, uma discussão que chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) e que, tudo indica, deve se estender ao longo do governo Lula.

Estados que acabaram de aderir a regimes de recuperação fiscal depois de anos de negociações com o Executivo federal já indicam a necessidade de ajustes. No Rio Grande do Sul, a previsão é de um déficit de R$ 3,7 bilhões em 2023; Minas Gerais, que registrou em 2021 o primeiro superávit em nove anos, prevê um déficit de R$ 3,5 bilhões. Não são os únicos casos.

O beligerante governo Bolsonaro parece ter esquecido que as dívidas assumidas pelos Estados contam com garantia da União e optou por ignorar a responsabilidade solidária que tem com os entes federados, sobretudo em se tratando de direitos fundamentais assegurados pela Constituição, como saúde e educação. Envolto nas negociações da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, o governo eleito, por sua vez, muito em breve será lembrado da importância do resgate do pacto federativo em suas dimensões político-administrativas e, principalmente, fiscais.

Alimentando a crise moral

O Estado de S. Paulo

Lula em jatinho de empresário suspeito, ministro do STF falando de política, FA dando recado ao poder civil, protestos antidemocráticos: o País normaliza o intolerável

O País precisa de paz e serenidade. É urgente a tarefa de pacificação e reconstrução nacional. Diante disso, os principais atores políticos precisam se esforçar um pouco mais para desarmar os espíritos. Devem, sobretudo, dar o bom exemplo de respeito tanto às leis quanto aos padrões éticos, medindo as consequências de seus atos e palavras. Alguns acontecimentos recentes, no entanto, mostram que estamos longe de superar a crise moral que tomou o País de uns anos para cá e que leva cidadãos comuns a acreditar que tudo podem.

As eleições indicaram que parte considerável da população – no mínimo 58 milhões de eleitores – continua tendo sérias restrições ao comportamento do petista Lula da Silva. O que faz então o presidente eleito? Em sua primeira viagem internacional após as eleições, Lula foi à COP-27, no Egito, no jatinho particular de um empresário enrolado na Justiça. O entorno do petista tratou de minimizar a polêmica ao dizer que Lula ainda não é presidente e que não houve nada de ilegal. É verdade, mas a carona está longe de constituir a atitude de um presidente eleito que tem pela frente a missão de mostrar ao País que os interesses nacionais vão finalmente se sobrepor aos interesses privados. Como diz a frase atribuída ao imperador romano Júlio César, à mulher de César não basta ser honesta, é preciso que pareça honesta.

Enquanto isso, em Nova York, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), assediado por um bolsonarista que questionava a lisura das eleições, perdeu a compostura. “Perdeu, mané, não amola”, disse Barroso, referindo-se à derrota de Jair Bolsonaro nas eleições. Não são necessárias especiais considerações sobre o papel da Corte constitucional – e os ataques e incompreensões que vêm sofrendo – para dar-se conta de que um ministro do STF deve se abster de qualquer manifestação que possa expressar uma posição política – ou ser assim entendida. É compreensível a irritação do ministro, mas quem tem um cargo público não pode responder prescindindo do fato de ter um múnus público.

Nessa desordem se enquadra também a nota dos comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha sobre as manifestações contrárias ao resultado das eleições. Como já tivemos a oportunidade de dizer neste espaço (ver o editorial Uma nota que não deveria existir, 12/11), o Alto-Comando não tem competência para dar recados às instituições democráticas nem à população. No Estado Democrático de Direito, as Forças Armadas (FA) têm de ficar caladas sobre temas civis. Devem ser o Grande Mudo. E não existe circunstância, por mais excepcional que seja, a autorizar atitude diferente.

Deve-se reconhecer, no entanto, que a confusão não se dá apenas no âmbito das autoridades públicas. Inconformados com a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro, não poucos brasileiros têm ido às ruas clamar por resistência e intervenção militar. São pessoas que se consideram democráticas, participaram da campanha eleitoral, elegeram senadores, deputados federais, governadores e deputados estaduais, mas, porque seu candidato presidencial perdeu a eleição, acham-se no direito de pedir às Forças Armadas  que interfiram no funcionamento do regime democrático. Ou seja, para essa turma, a democracia só vale em caso de vitória do seu candidato.

Para piorar, as manifestações antidemocráticas têm sido acolhidas, por parte de lideranças civis e políticas, numa aura de legitimidade rigorosamente contrária ao Estado Democrático de Direito. No Brasil, há liberdade de expressão e de associação, mas não há liberdade para resistir à vontade das urnas, para que uma minoria tente impor sua vontade, para que alguns inventem pretexto para atuação fora dos trilhos institucionais. É preciso chamar as coisas pelo seu nome. Não existe patriotismo quando este se afigura antidemocrático. Os verdadeiros patriotas respeitam o resultado das urnas e as atribuições constitucionais das Forças Armadas, pois não há Pátria à margem da lei.

A paz de que o País tanto precisa virá da responsabilidade efetiva com o interesse público. O mau comportamento de um não pode ser desculpa para o outro agir igualmente mal. É tempo de exemplaridade, não de exceções.

G-20 busca estabilidade

O Estado de S. Paulo

Cúpula deu novo passo rumo ao isolamento de Putin e sinalizou freio de arrumação nas relações EUA-China

É um sinal dos tempos que o centro gravitacional da cúpula do G-20, tradicionalmente voltada a temas econômicos, tenha sido dominado pela geopolítica. Foi a primeira desde a invasão russa à Ucrânia e desde o sobressalto nas tensões entre EUA e China após a visita da presidente da Câmara norte-americana, Nancy Pelosi, a Taiwan.

A cúpula reforçou o isolamento do presidente russo, Vladimir Putin, que não compareceu, nem sequer virtualmente. Não à toa, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, em conferência a distância, se dirigiu ao grupo como “G-19”. Mesmo a Índia e a principal parceira da Rússia, a China, sinalizaram certo descolamento de Putin em gestos sutis, mas que, considerando suas dimensões, movem significativamente as placas tectônicas geopolíticas.

O comunicado do G-20 ecoa o premiê indiano, Narendra Modi, ao dizer que esta era “não deve ser de guerra”. Usando alguns dos termos mais fortes desde o início da guerra, o presidente chinês, Xi Jinping, disse que o G-20 deve “se opor resolutamente a tentativas de politizar a energia e alimentos ou utilizá-los como instrumentos ou armas de guerra” – uma alfinetada às sanções ocidentais que não disfarça o incômodo com Putin.

Mas o evento mais relevante foi o encontro entre Xi e o presidente americano, Joe Biden, o primeiro desde que Biden assumiu a presidência. Os comunicados oficiais foram protocolares e não houve transações substantivas, mas, dada a espiral descendente na relação entre as superpotências nos últimos anos, esses são fatos mais positivos que negativos.

Xi tem conclamado o Partido Comunista a acelerar a modernização militar, e vocaliza cada vez mais explicitamente a ambição de “reunificar” Taiwan. Em Washington, há um raro consenso bipartidário sobre a necessidade de frear a ascensão militar chinesa com parcerias no Pacífico e restrições ao comércio de tecnologias sensíveis.

O paralelo com a “guerra fria” é tentador, mas, diferentemente da URSS, a China não busca uma “revolução global” e tem profundos laços econômicos com o Ocidente, a começar pelos EUA. Isso torna a relação entre as potências mais complexa e, em certo sentido, mais desafiadora para o mundo. Se não é realista esperar pelo fim da rivalidade geopolítica, é viável encontrar meios para impedir que ela frature ainda mais a economia global e não se degenere em um confronto direto.

Nesse sentido, o encontro foi razoavelmente construtivo. Biden foi cuidadoso ao insistir que não haverá mudança na política “Uma China”, em que Washington reconhece, sem endossar, a concepção de Pequim de que Taiwan é parte da China. Os líderes concordaram em designar representantes para retomar conversações suspensas desde a visita de Pelosi em temas como extradições, narcotráfico ou mudanças climáticas. Mais importante seria restaurar a comunicação entre os comandos militares para fortalecer a confiança mútua.

As relações entre China e EUA não precisam ser e não serão amigáveis, mas, para o bem de todo o mundo, devem ser ao menos previsíveis, estáveis e bem gerenciadas.

Posição do governo eleito reduz chance de país presidir BID

Valor Econômico

Governo eleito prefere alguém ligado ao partido, uma visão estreita do que seja uma participação de Estado em um organismo multilateral

Em 62 anos de existência, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a principal instituição de financiamento multilateral para América Latina e Caribe, nunca teve um presidente brasileiro. O candidato atual do país, o ex-presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, é tido como a melhor chance de o país estrear na direção da instituição. Se depender do governo eleito, porém, o país não chegará lá.

Guido Mantega, ex-ministro de governos petistas, pediu de repente, e sem sucesso, o adiamento da eleição do novo presidente, após Mauricio Claver-Carone, indicado pelo presidente Donald Trump, ter sido demitido do cargo por abuso de poder e favorecer a namorada na instituição.

O governo de Jair Bolsonaro foi corresponsável pela eleição de Carone. Advogado americano de ascendência cubana, ex-assessor de segurança de Trump, ele foi indicado como o primeiro americano a assumir o cargo máximo do banco, tradicionalmente reservado a um latino-americano. Bolsonaro, seguindo seu ídolo, aceitou de bom grado a indicação, para a qual pretendia como contrapartida uma vaga em uma das vice-presidências da diretoria executiva, composta por 14 membros. Carone venceu e simplesmente ignorou a demanda brasileira.

Trumpista, Carone criou uma atmosfera de tensão no banco, além de contratar uma namorada para a instituição. Sua demissão abriu um espaço a um novo presidente, que será eleito neste domingo pela Assembleia de Governadores do banco. Depois desse fracasso, que compartilhou com o governo direitista colombiano de Iván Duque, o Brasil indicou para disputar o cargo Ilan Goldfajn, ex-economista chefe do Itaú Unibanco, ex-presidente do Banco Central no governo de Michel Temer e atual diretor licenciado do Departamento do Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional.

As chances de Ilan diminuíram drasticamente depois que o ex-ministro Guido Mantega, da equipe de transição do governo eleito, enviou uma carta à secretária do Tesouro americano, Janet Yellen - os EUA têm 30% dos votos em uma eleição que é ponderada pela fatia de participação de seus membros -, solicitando o adiamento da eleição, até que o novo governo brasileiro indicasse outro candidato.

O argumento de Mantega é de que o adiamento possibilitaria a articulação de uma candidatura conjunta com outros países, como a Argentina - que, ao lado do Haiti tem uma participação de 11,81%, ligeiramente superior à do Brasil e Suriname, com 11,44% - e permitisse uma aliança mais ampla de interesses de países latino-americanos. Só não indicou por que essa aliança não poderia ser feita em torno de Ilan, que reúne qualidades técnicas e profissionais mais que suficientes para ocupar o cargo. A Presidência é disputada por Brasil, Argentina, Chile, México e Trinidade e Tobago.

A explicação para a ação do governo eleito de Lula é que ele prefere alguém ligado ao partido, uma visão estreita do que seja uma participação de Estado em um organismo multilateral. Ilan não é e nunca foi bolsonarista, nem comunga das ideias delirantes do atual governo. Liberal, tem posições que o aproximam do espectro de apoiadores que Lula procurou em sua campanha eleitoral para formar uma frente bem-sucedida a favor da democracia. Ilan foi um dos organizadores de manifesto do Centro de Debate de Políticas Públicas que defendia o respeito aos resultados das urnas, quando Bolsonaro fazia o contrário e pregava o descrédito.

Em sua sabatina, no domingo passado, Ilan defendeu bandeiras do futuro governo, como ações contra as mudanças climáticas e redução da pobreza. Ele qualificou a insegurança alimentar como tema urgente e disse que “é fundamental alcançar um crescimento equitativo, sustentável e inclusivo”, apurou o Valor. “Combater a pobreza, melhorar a educação e os serviços de saúde fazem parte do mandato central do BID”, afirmou.

Ilan disputa o cargo com o ex-ministro da Fazenda do Chile Nicolás Eyzaguirre Guzmán e o ex-vice-presidente do BC do México Gerardo Esquivel Hernández, entre outros. Os países desenvolvidos (EUA, europeus, Japão) detêm 44,8% dos votos. A indicação de Ilan para o BID, que não ocorreria sem o respaldo destes países, que também possuem a maior fatia do poder de decisão do FMI, é um ponto muito forte a seu favor. A falta de apoio político do próximo governo do Brasil, maior economia da região, porém, pode ter sido um tiro mortal em sua candidatura.

2 comentários:

Anônimo disse...

Esses talkinglittleheads queriam que Lula voasse em jatinhovda FAB 'devidamente' selecionado, revisado e preparado pelo nanoGeneral Heleninho, sob supervisão do entubadoGeneral BocasdeMatildes?
Ou ia ter cocaína a bordo ou iria pro inferno, ou as duas opções ao mesmo tempo...
Imbecis do mercadinho!

Anônimo disse...

Teoria da Conspiração na cabeça!
Trump e seu fan club pelo mundo fértil
das alucinações