Folha de S. Paulo
Lula precisa fazer mais do que não ser
Bolsonaro
Com pouco mais de três meses de existência,
já deu para sentir um gostinho de como será o governo de Luiz Inácio Lula da
Silva. Comecemos pelos aspectos positivos. Lula trouxe de volta à Presidência
um pouco de normalidade. Não temos mais um mandatário que debocha das vítimas
da Covid-19 ou que governa pela sabotagem, editando decretos e portarias que
erodem as leis que deveriam regulamentar e nomeando desqualificados ou mesmo
infiltrados para dirigir órgãos com cuja missão não concorda.
Mais do que isso, foi bom ver o governo federal finalmente agindo para retirar os garimpeiros ilegais de territórios indígenas e enfatizando a importância de políticas públicas básicas, como a vacinação. Lula não é Bolsonaro, e isso é ótimo. Convenhamos, porém, que não ser Bolsonaro é a parte fácil. Infelizmente, não basta para credenciar Lula, à frente de seu terceiro mandato, como um bom presidente.
É aí que eu começo a me preocupar. Minha
impressão é que Lula já não exibe a mesma forma política de antigamente. Trocou
o pragmatismo que caracterizou suas duas primeiras gestões por uma espécie de
anseio em acertar as contas com o passado. Contrariando a ideia de governo de
união nacional esboçada durante a campanha, Lula parece guiar-se pelo menos
parcialmente pelo fígado, voltando-se contra as principais leis aprovadas
durante o governo de Michel Temer e a tudo o que evoque, ainda que muito
vagamente, a operação Lava Jato.
Ao fim e ao cabo, o que definirá o sucesso
ou fracasso de Lula 3 não serão reinterpretações da história e sim o desempenho
da economia. Aqui os sinais são ambíguos. O presidente parece hesitar entre uma
agenda estruturante, que permitiria uma retomada consistente mais adiante, e a
ideia, tão popular quanto equivocada, de que basta um bom volume de gastos
públicos para assegurar o crescimento.
Lula vai bem em não ser Bolsonaro, mas precisamos de muito mais.
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