Folha de S. Paulo
Para garantir governabilidade o governo terá
que garantir mais proporcionalidade partidária na distribuição dos ministérios
O malogro de Lula 3
estava escrito na pedra, como já examinei aqui. Aqui não há nenhuma surpresa, como
veremos a seguir. Houve surpresas, mas de outra natureza: o 8/1 gerou onda de solidariedade nacional que beneficiou
o governo. O mesmo vale, em grau menor, após as evidências que vieram à tona em
2024 de planos golpistas. Os ganhos políticos advindos destes eventos
estão se dissipando.
Três fatores estavam presentes —alguns antes mesmo da posse— que prenunciavam
claramente o que viria. O primeiro deles é o caráter hiperminoritário do
Executivo, levando-o a formar coalizão frouxa de 18 partidos, mais do que o dobro dos
seus mandatos anteriores (8 e 9 partidos, respectivamente). A coalizão mais
heterogênea da série histórica implica elevado custo de gerenciamento.
Em segundo lugar, as preferências dessa
coalizão conflitam com as do Executivo em temas comportamentais e economia. Mas
o gerenciamento segue o padrão histórico de governos do PT, exacerbando problemas
de governabilidade. Ele é marcado por forte desproporcionalidade na
distribuição do portfólio ministerial (o PT e aliados históricos detêm
quase a metade dos ministérios) e a compra de apoio via emendas, como aconteceu
agora com o "ajuste fiscal".
Terceiro, e ainda mais importante, antes mesmo de tomar posse, o governo
contratou problemas fiscais: a medida de transição expandiu a despesa federal
em R$ 150 bilhões.
Lula 3 defronta-se com um dilema. Para garantir governabilidade o governo terá
que garantir mais proporcionalidade na distribuição dos ministérios. Mas ao
fazer isso diluirá ainda mais a marca política de Lula 3, que já é muito débil
(como sinalizado, entre outras coisas, nas eleições municipais). Com isso, o
partido e seu líder maior enfrentarão uma erosão sem paralelo de reputação e do
declinante capital político.
Há ainda outro fator desestabilizador: os problemas de saúde do presidente o enfraquecem;
transformam-no em pato manco, o que reduz paulatinamente a eficiência do
gerenciamento tradicional. Para os parceiros da coalizão, os ganhos de
participar do governo são decrescentes com o tempo. O poder de barganha do Executivo
diminui pela incapacidade de fazer promessas críveis.
O encurtamento do horizonte político do Executivo se dá em um contexto em que
ele terá incentivos ainda mais fortes e senso de urgência para deixar um
legado, o que poderá levá-lo a radicalizar sua retórica e a perseguir políticas
expansionistas. Na realidade, isto já aconteceu no início do mandato com as
críticas ao Banco Central. Não se trata apenas de estratégia política de
deslocamento da culpa pela performance fiscal pífia que se anunciava. Aqui se
acopla à ideia de entrar para a história como líder mundial em três frentes: no
combate à pobreza (pela via da expansão do gasto social), na defesa da
democracia e na área ambiental.
Mas a estratégia está malogrando em virtude do desempenho fiscal
desastroso e consequente crise de credibilidade. A defesa da democracia, por
sua vez, foi profundamente maculada pelo apoio a tiranias como as de Maduro, Ortega e Putin. E na área ambiental, onde estariam os frutos fáceis de
colher, a incapacidade do país de enfrentar o problema no plano doméstico
debilita suas pretensões internacionais.
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