Valor Econômico
Quinze dias atrás, sugerimos aqui que a
discussão do tarifaço não pode silenciar o debate do problema dos juros, que
continuam absurdamente altos no país apesar da inflação em queda. Em nome da
coerência, então, seguem dois comentários sobre a proposta que a coluna
apresentou, feita pelo professor da UnB José Luis Oreiro a pedido da Comissão
de Debates e Estudos Estratégicos da Câmara. O economista sugeriu uma reforma
na arquitetura institucional da condução da política monetária no país.
Luiz Gonzaga Belluzzo, economista que
dispensa apresentações, entende que a coluna tratou de “questões cruciais” e
fez as observações abaixo sobre câmbio-juros na configuração da política
monetária.
As condições monetárias nos países desenvolvidos - particularmente nos EUA, o gestor da moeda de reserva - determinam o volume de capitais que procuram os mercados emergentes. Às políticas econômicas “internas” cabe o papel de buscar relações entre câmbio e juros atraentes para os capitais em movimento.
Num ambiente internacional de livre
movimentação de capitais, os bancos centrais dos países de moeda fraca
encontram dificuldades em manter, simultaneamente, boas condições de crédito
doméstico e a estabilidade de sua moeda.
O controle da liquidez em moeda forte é,
portanto, crucial para a sempre precária combinação entre estabilidade e
crescimento nas economias de moeda não conversível. Os países periféricos mais
bem-sucedidos, como a China, preferiram manter controles seletivos e
pragmáticos de câmbio e de capitais. Acumulam reservas elevadas em moeda forte
(dólares ou euros) com o propósito de evitar “choques de desvalorização” que
possam afetar negativamente a taxa de juro doméstica.
Nas pegadas da globalização financeira, o Brasil
manteve por 20 anos uma combinação câmbio-juro hostil ao crescimento da
indústria e amigável à arbitragem sem risco.
Diante de frequentes episódios de aguçamento da
instabilidade cambial, as vozes de sempre descarregam as culpas sobre os ombros
das “condições internas”. Proclamam - sempre e sempre - os danos do “risco
fiscal”, exibido como um pecado irremissível. Ignoram que os países de moeda
não conversível se dilaceram entre o objetivo de manter a inflação sob controle
e o propósito de não danar o crescimento ou colocar em risco a estrutura
industrial e, consequentemente, o “arcabouço” de geração de renda e emprego. No
Brasil, a derrocada exportadora da indústria faz parceria com a invasão das
importações de produtos manufaturados, prenhes de incentivos e subsídios
oferecidos generosamente pelos competidores espertos.
O consultor e economista Felipe Adaime, ex-VP
do Banco de Chicago, sugere que o colunista deveria ser “mais cauteloso” na
escolha de “especialistas” de esquerda e “mesclá-los” com vozes do mercado.
Escoimadas de divagações e alguns insultos, seguem resumidas observações de
Adaime, que foi aluno de Maria da Conceição Tavares na UFRJ, mas diz não se
orgulhar disso, porque ela lhe teria ensinado “um monte de porcarias”.
Todas essas sugestões [de Oreiro] já foram
testadas, especialmente nos governos Sarney, Lula e Dilma, e nenhuma deu certo,
nem aqui nem em lugar algum.
O Brasil não caiu em armadilha alguma dos juros
e do câmbio - foi levado à situação atual porque a esquerda acha que resolve
todos os problemas emitindo moeda e tomando dívida. Se fosse simples assim, não
haveria pobreza no mundo. Não dá certo porque o crescimento tem que estar
associado à produtividade, à tecnologia e, mais que tudo, ao capital. Também
precisa ter estoque de mão de obra, território e recursos naturais. O Brasil
tem quase tudo isso, mas é pobre, sem capital. Essa é uma das razões para os
juros altos. Como a demanda por capital excede sua oferta, impacta o preço do
capital - os juros.
Oreiro começa mal na primeira sugestão. A
principal função de qualquer banco central é preservar a moeda, não se envolver
com política de crescimento e emprego. É óbvio o conflito de interesses nessas
três questões, que não podem ser entregues ao mesmo administrador. Nos EUA, o
BC não administra todas essas variáveis. Atua coordenado com o ministro da
Economia para que não aconteça o que acontece aqui: cada um puxa a corda para
um lado, a Fazenda com política monetária irresponsável e o BC com política de
juros superconservadora para mitigar os efeitos danosos sobre a inflação.
A segunda sugestão de Oreiro é a flexibilização
da meta de inflação. Se isso ocorrer, o BC perderá toda a sua credibilidade e
entraremos numa espiral inflacionária.
A medida número 3 foi plagiada do Plano Real,
que precisava de mais um governo do PSDB para se consolidar. O câmbio tinha que
ser mantido fixo ou quase fixo por mais tempo até que a inflação estivesse
completamente dominada. A crise nos países asiáticos e na Rússia, infelizmente,
precipitou a mexida no câmbio.
De fato, ainda temos alguma correção monetária
na economia e o principal culpado por isso é o governo federal, que não
consegue controlar seus gastos.
A quarta medida envolve a dívida pública, que
está chegando numa situação em que não terá mais compradores para os títulos
públicos. Uma das razões para os juros estarem tão elevados é o tamanho da
dívida e o risco, percebido pelos investidores, de comprar esses títulos. Quem
vai querer papéis pré-fixados numa situação de inflação ascendente, como vai
acontecer no Brasil, devido ao déficit fora de controle?
Na quinta proposta, ele [Oreiro] está sugerindo câmbio administrado? Isso seria terrível e teria o mesmo efeito de um tabelamento de preços. Basta olhar para a Argentina, modelo de câmbio administrado - ou melhor, subsidiado. O tripé “câmbio flutuante-meta de inflação-equilíbrio fiscal” consertou a economia em pouco tempo e permitiu que o Plano Real sobrevivesse até hoje.
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