quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Opinião do dia – Romero Jucá

Não acho que [o impeachment] perdeu (força). Em política nada está morto. Em política cada dia é uma conjuntura diferente. Impeachment é consequência de um conjuntura. Ela às vezes esquenta, às vezes esfria. Há dois meses a conjuntura do Brasil era outra. Mas não podemos discutir a solução do Brasil apenas após o impeachment porque ninguém sabe se vem, nem quando vem. [...] Não posso dar uma resposta porque não conheço os procedimentos de investigação [contra Lula]. Seria leviano. Mas se pode dizer que o Lula hoje é um ponto de confronto político, como foi a Dilma no ano passado e ainda permanece. É mais uma frente de embate político.
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Romero Jucá, “Impeachment de Dilma não está morto”, O Estado de S. Paulo, 9 de fevereiro de 2016

Moro aceita provas da Suiça: ação contra Odebrecht segue

Moro diz que provas da Suíça são legais e manda seguir ação contra Odebrecht

• Juiz da Lava Jato reabre prazo para alegações finais das defesas dos executivos da empreiteira e diz que 'buscam apenas ganhar mais tempo'

Por Ricardo Brandt, Fausto Macedo e Mateus Coutinho – O Estado de S. Paulo

O juiz federal Sérgio Moro rechaçou nesta quarta-feira, 10, estratégia da defesa de um dos executivos ligado à empreiteira Odebrecht, Márcio Faria, e negou pedido de exclusão dos autos da Lava Jato de documentos bancários da conta na Suíça em nome da Havinsur S/A – offshore que tem como beneficiária econômica e controladora a Odebrecht, segundo o Ministério Público Federal.

Moro determinou que o processo contra a maior empreiteira do País tome seu rumo. No dia 2 de fevereiro, o juiz havia determinado a suspensão do prazo para entrega das alegações finais dos defensores dos réus.

Após ouvir manifestação do Ministério Público Federal e dos advogados de Márcio Faria, preso desde 19 de junho de 2015 na Operação Erga Omnes, Sérgio Moro mandou seguir a ação.
“Denegado o pedido, deve-se retornar à fase de alegações finais”, assinalou o magistrado.

Para tentar excluir dos autos os documentos bancários suíços, a defesa alegou que a Justiça do país europeu havia reconhecido que o envio dos extratos não foi realizado pelas vias regulares da cooperação jurídica internacional.

Essa argumentação, porém, não foi acolhida por Moro, que escreveu. “No fundo, a Odebrecht, seus executivos e seus advogados, ao mesmo tempo em que deixam de explicar nos autos ou em suas inúmeras manifestações na imprensa os documentos alusivos às contas secretas, buscam apenas ganhar mais tempo, no que foram bem sucedidos considerando a decisão da Corte Suiça, mas isso somente em relação aos procedimentos na Suíça, que terão que ser corrigidos, sem qualquer, porém, afetação ou reflexo, como também decidiu expressamente aquela Corte Suíça, da possibilidade de utilização dos documentos nos processos no Brasil.”

O juiz da Lava Jato ignorou outro argumento da defesa. “Quanto às demais alegações de que ele (Márcio Faria) e a Odebrecht seriam vítimas de uma espécie de conspiração universal, são desnecessários comentários do Juízo.”

Ele destacou que a ação penal que envolve os executivos ligados à empreiteira apura crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. “Dirigentes da Odebrecht teriam, principalmente, efetuado o pagamento de milhões de dólares e reais em vantagem indevida para executivos da Petrobrás. Para tanto, teriam utilizado contas secretas em nome de offshores no exterior, realizando transferências em favor de outras contas secretas em nome de offshore no exterior e que seriam controladas pelos executivos da Petrobrás. Parte relevante do acervo probatório consiste na documentação parcial dessas contas e de comprovantes bancários das transferências havidas a débito de contas controladas pela Odebrecht.”

Sérgio Moro enfatizou que ‘apesar do reconhecimento do erro procedimental suprível por parte do Ministério Público Suíço, a Corte Suíça não proibiu as autoridades brasileiras de utilizar os documentos, nem solicitou a sua devolução’.

“Pelo contrário, denegou expressamente pedido nesse sentido da Havinsur/Odebrecht. O erro procedimental deve ser corrigido na Suíça, sem qualquer relação com os procedimentos no Brasil. O erro procedimental não é suficiente para determinar a ilicitude da prova, já que suprível. Não se trata aqui de prova ilícita, ou seja produzida em violação de direitos fundamentais do investigado ou do acusado, como uma confissão extraída por coação, uma busca e apreensão sem mandado ou uma quebra de sigilo bancário destituída de justa causa. Há apenas um erro de procedimento, na forma da lei Suíça e suprível também nos termos da lei Suíça e da decisão da Corte Suíça.”

Defesa. Por meio de nota, a defesa de Marcio Faria informou que protocolou petição na manhã desta quarta-feira, na Justiça Federal, em que “reafirmou que o envio das provas ‘foi ilegal'” e que “não se tratou de um mero ‘erro procedimental na transmissão de documentos'”.

“Disse ainda que a Suíça não ‘deu carta branca para nosso país’ utilizar os documentos livremente. Ao contrário, as próprias autoridades suíças haviam alertado o Brasil, no mesmo dia em que os documentos aqui chegaram, para a existência de uma exceção que impediria o seu uso em processos brasileiros. Essa exceção é exatamente o procedimento ilegal de cooperação que a Suíça chama de ‘cooperação selvagem’, e que o Tribunal Penal Federal daquele país, na decisão do mês passado, reconheceu ter acontecido.”

Ex- presidente da Andrade Gutierrez volta a ser preso

• Solto na sexta passada após fechar acordo de delação premiada, Otávio Azevedo vai para a cadeia novamente, desta vez por suposto desvio na Eletronuclear

Há apenas cinco dias em prisão domiciliar, o ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Azevedo foi novamente preso ontem pela PF, em São Paulo. A prisão foi ordenada pelo juiz Marcelo da Costa Bretas, da 7 ª Vara Federal no Rio, que investiga fraudes na Eletronuclear desde que a Lava- Jato foi fatiada. A prisão domiciliar fora decidida pelo juiz Sérgio Moro, da 13 ª Vara Federal de Curitiba, após acordo de delação premiada. O juiz do Rio entendeu que a decisão de Moro não revoga mandado de prisão já expedido por ele na investigação da Eletronuclear. Em outro processo, Moro considerou válidas as provas enviadas pela Suíça contra a Odebrecht.

O regresso à cadeia

• Ex-presidente da Andrade Gutierrez voltara para casa há 5 dias; caso se refere à Eletronuclear

Jailton de Carvalho - O Globo

- BRASÍLIA- O ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques de Azevedo, que estava em prisão domiciliar desde sexta-feira por decisão do juiz Sérgio Moro, da 13 ª Vara Federal de Curitiba, foi levado ontem à tarde para a carceragem da Polícia Federal em São Paulo. A ordem de prisão foi expedida pelo juiz Marcelo da Costa Bretas, da 7 ª Vara Federal do Rio de Janeiro, que está à frente das investigações sobre fraudes na Eletronuclear, uma das frentes da Operação Lava- Jato.

Moro autorizara Azevedo a deixar o Complexo Médico- Penal, em Curitiba, e acompanhar os desdobramentos das investigações em casa, em São Paulo, depois da conclusão do acordo de delação premiada que fez com a Procuradoria Geral da República ( PGR). Bretas entendeu, no entanto, que a decisão de Moro não teria força para revogar o mandado de prisão que ele expediu contra o ex-presidente da Andrade Gutierrez ao longo das investigações sobre fraudes na Eletronuclear.

Em outubro do ano passado, o relator da LavaJato no Supremo Tribunal Federal, ministro Teori Zavascki, entendeu que o caso não estava relacionado diretamente ao esquema de corrupção na Petrobras, origem das investigações da operação, e o remeteu à Justiça Federal no Rio.

Ontem, o empresário estava em casa, em São Paulo, quando foi surpreendido no fim da tarde por agentes da Polícia Federal, que cumpriram o pedido de prisão preventiva. De acordo com a assessoria de imprensa da PF, Azevedo passaria a noite na carceragem do órgão na capital paulista. O executivo seguirá hoje de manhã para o Rio. A defesa do empresário informou que entrará na Justiça, também hoje, com um pedido de revogação da prisão.

Conflito de juízes
Marcelo Bretas e Sérgio Moro são juízes federais. A decisão de um não tem repercussão automática sobre a decisão do outro. O advogado Juliano Breda, responsável pela defesa de Azevedo, disse que vai pedir ao juiz do Rio que reconsidere a ordem de prisão. Para ele, não há motivos para que o executivo volte à cadeia.

— Vou pedir que ele (Bretas) tome a mesma decisão do juiz Sérgio Moro. A prisão é desnecessária, não se configuram mais os elementos da prisão preventiva — afirmou Breda.

Azevedo foi preso pela primeira vez em junho do ano passado, na 14 ª fase da Operação Lava- Jato, por ordem de Sérgio Moro.

Ontem, logo no início do expediente, Bretas enviou um e- mail para a Polícia Federal em São Paulo com a informação de que a ordem de prisão expedida por ele contra Azevedo não foi revogada pelo despacho de Moro. Portanto, o executivo deveria ser reconduzido ao cárcere.

A decisão dele só poderia ser revista por uma instância superior do Judiciário e não por um juiz que está no mesmo nível da hierarquia. A PF em São Paulo cumpriu imediatamente a ordem do juiz.

— Vamos apresentar os argumentos que levamos a 13 ª Vara de Curitiba e pedir a revogação da prisão ou a prisão domiciliar — disse o advogado de Azevedo.

Em acordo de delação premiada, Azevedo se comprometeu a fazer revelações sobre fraudes na usina nuclear Angra 3, em obras da Copa do Mundo, na hidrelétrica de Belo Monte, na ferrovia Norte- Sul e também na Petrobras. Ele teria citado os nomes do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB- RJ) e do senador Edison Lobão (PMDB- PA) como destinatários de propina da Andrade Gutierrez. Juliano Breda disse que sequer confirmaria a existência de acordo de colaboração.

Azevedo havia sido solto junto com outro executivo da Andrade Gutierrez, Elton Negrão. Eles assinaram acordo de delação premiada via MP Federal, mas os termos ainda não foram homologados pelo Supremo Tribunal Federal. Ambos são acusados dos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

Distante de Lula, Dilma aprofunda ofensiva na saúde

Por Andrea Jubé – Valor Econômico

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff aposta no combate ao vírus zika e à epidemia de microcefalia como vacina ao avanço das investigações da Operação Lava-Jato sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que podem atingi-la. A avaliação de auxiliares de Dilma é que o desgaste da imagem de seu antecessor a prejudica diretamente e a torna mais vulnerável ao impeachment que, adormecido, não foi enterrado. Ela comandará do Rio de Janeiro, sede dos Jogos Olímpicos, a megaoperação de sábado em que 220 mil militares sairão às ruas contra o mosquito Aedes aegypti.

Auxiliares presidenciais ouvidos pelo Valor reconhecem que a desconstrução da imagem de Lula respinga em Dilma, ainda que ela tenha optado por não fazer uma defesa pública de seu antecessor. "Lula é o fiador político dela e do nosso governo", definiu um assessor do núcleo próximo de Dilma.

O cerco da Lava-Jato contra Lula afunilou-se nos últimos dias. Durante o Carnaval, o juiz Sergio Moro autorizou a Polícia Federal a abrir um inquérito específico para tratar da ligação do sítio de Atibaia (SP), frequentado pelo ex-presidente, com a empreiteira OAS, investigada na operação. A propriedade está registrada em nome de dois sócios de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente: Fernando Bittar e Jonas Suassuna, sócios na firma Gamecorp, contratada da Oi. Nenhum deles veio a público até agora falar sobre o assunto.

Dilma não telefonou para Lula nem se encontrou com ele desde o início do bombardeio de denúncias contra seu antecessor, apenas determinou que o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner - principal elo entre ambos -, orientasse lideranças petistas e aliados a saírem em defesa do ex-presidente.

A avaliação de auxiliares presidenciais é que, mesmo tentando se resguardar do avanço da Lava-Jato sobre seu padrinho político, Dilma encontra-se sem o seu maior escudo de proteção. No auge da crise política, quando o acolhimento do impeachment ainda era uma ameaça, Lula desembarcou em Brasília e fez diversas reuniões com lideranças do PMDB e de partidos aliados para desmobilizar o cerco contra Dilma. Em atos petistas, ele exortava a militância a defender a presidente e o governo.

No Planalto, ministros do núcleo político afirmam que houve um recuo da ofensiva pró-impeachment no Congresso Nacional, mas alertam que é cedo para cantar vitória.

A estreia do governo com uma derrota, mesmo que parcial, logo no reinício das atividades do Congresso, acendeu a luz amarela no Planalto. O mau resultado deu-se na votação de uma das medidas provisórias do ajuste fiscal, em relação à qual Dilma fizera um apelo aos parlamentares na véspera, na leitura da mensagem presidencial. As alterações ao texto da medida provisória que eleva a tributação sobre os ganhos de capital reduziram as expectativas de arrecadação para os cofres federais. Por 205 votos a 176, o texto original do Executivo foi derrotado. "É um sinal evidente de desmobilização da base", admitiu um assessor presidencial.

Em meio ao acirramento da Lava-Jato, o Planalto transformará o enfrentamento ao vírus zika na principal agenda positiva de Dilma. Ela comandará pessoalmente do Rio de Janeiro a mobilização das Forças Armadas no sábado, contra a proliferação do mosquito. Serão 220 mil militares, distribuídos entre 356 municípios - sendo 115 considerados endêmicos, capitais, regiões metropolitanas e cidades com unidades militares - que eliminarão focos do inseto e farão esclarecimentos à população.

Dilma também vai manter a programação de fazer, pelo menos uma vez por mês, entrega de moradias do programa Minha Casa, Minha Vida. No dia 3 de fevereiro, Dilma entregou residências em Indaiatuba (SP), enquanto ministros fizeram entregas simultâneas em cinco Estados.

Sem meios de alavancar no curto prazo as novas concessões ou impulsionar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com as grandes empreiteiras do país implicadas na Lava-Jato, o Planalto elegeu o combate ao mosquito e à epidemia do vírus zika como a agenda estrategicamente positiva da vez, apta a reverter a baixa popularidade da presidente.

Nos últimos dias, Dilma dedicou a agenda a encontros com lideranças religiosas, a quem pediu empenho no combate ao mosquito, e a reuniões com ministros sobre o tema. Ela também comandou uma videoconferência com governadores, no dia 29 de janeiro, para divulgar as atividades da Sala Nacional de Coordenação e Controle do vírus zika. Enquanto a economia não recuperar o fôlego, e o Congresso não enterrar o impeachment, o combate ao vírus zika e o programa Minha Casa, Minha Vida, serão os "escudos" anti-Lava-Jato de Dilma.

Disputa política dificulta aprovação da CPMF

• Recriação depende de escolhas de liderança do PMDB e comando da CCJ

Simone Iglesias e Cristiane Jungblut - O Globo

- BRASÍLIA- Aposta do governo para resolver a crise fiscal, a CPMF esbarra numa série de prazos e dificuldades políticas na Câmara que atrapalham sua recriação. A presidente Dilma Rousseff espera contar com R$ 10,15 bilhões da contribuição neste ano, com a cobrança do tributo a partir de setembro, mas esse dinheiro está muito distante de entrar efetivamente no caixa. A primeira dificuldade política envolve a disputa pela liderança do PMDB na Câmara, cujo resultado influenciará diretamente o andamento da proposta.

Para que a CPMF tramite rapidamente, o governo precisa que o atual líder do PMDB, Leonardo Picciani ( RJ), aliado fiel de Dilma, seja reconduzido. Isso porque caberá a ele escolher o novo presidente da Comissão de Constituição e Justiça, onde a proposta está parada há quatro meses. Caberá ao novo presidente da comissão pautar sua votação. Já se Picciani perder para o candidato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( RJ), o deputado Hugo Motta ( PB), a tendência é que Cunha atue para dificultar o andamento da proposta.

O deputado Arthur Lira (PP- AL), que era presidente da comissão até o mês passado, acumulou a função de relator da nova contribuição e antecipou ao GLOBO que seu relatório será favorável à recriação. Ele promete apresentar seu voto na primeira sessão da CCJ, mas destaca que caberá ao novo presidente da comissão decidir quando pautar a matéria. Para garantir a cobrança a partir de setembro, o governo precisa que a proposta seja promulgada em maio, para cumprir o prazo obrigatório antes do início da cobrança.

No entanto, além do problema na CCJ, a avaliação reinante hoje é que não há clima no Congresso para a aprovação novos impostos. Como forma de tentar sensibilizar deputados e senadores, o Ministério da Fazenda passou a considerar a possibilidade de alíquota regressiva — ou seja, cujo percentual reduza a cada ano. A informação foi revelada no domingo pela coluna de Lauro Jardim. O governo não apresentou uma proposta concreta, já que a redução impacta no orçamento estimado para os próximos anos com a CPMF.

— A regressividade seria uma diminuição ano a ano e conforme a redução da dependência da arrecadação do imposto. Isso está sendo calculado pela receita — disse ao GLOBO um auxiliar de Dilma.

Corte no orçamento deste ano
Amanhã, o governo sinalizará se ainda conta ou não com a CPMF. Será anunciado o corte no Orçamento da União deste ano. Com a economia em retração e um Orçamento inflado, a área econômica analisa cortes entre R$ 20 bilhões ea R$ 50 bilhões. A reação negativa à proposta é tanta que a presidente foi vaiada na semana passada pelos congressistas, ao defender a recriação do tributo durante discurso feito na sessão de reabertura dos trabalhos do Legislativo. No dia seguinte, Dilma chamou o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB- AL). Queria saber a repercussão de sua ida ao Congresso e as chances de aprovar a CPMF.

Para tentar salvar politicamente a medida, Dilma foi aconselhada a apresentar uma pauta mais ampla de controle de gastos, como fixação de um teto para as despesas do governo. A tentativa é convencer ou sensibilizar os parlamentares de que o governo precisa do dinheiro de forma emergencial, para fechar as contas, mas fará esforços de melhora do gasto público no longo prazo. Os parlamentares avisaram que o simples aumento ou criação de imposto não passa. Na quarta-feira, o governo foi derrotado na votação da Medida Provisória 692, que tratava de aumento de tributos sobre a alienação (venda) de imóveis. A Câmara alterou alíquotas e valores da tributação, reduzindo à metade a previsão de arrecadação com a MP.

O senador Romero Jucá (PMDB- RR), que foi relator do Orçamento de 2015, disse que a CPMF só passa se vier acompanhada de outras medidas:

— A CPMF só passa se com medidas concretas de redução de gastos do governo. É preciso compor uma equação. Não adianta só o aumento de imposto. Da forma como algumas despesas obrigatórias estão crescendo, vai ter que criar uma CPMF a cada ano. O modelo de gasto chegou à exaustão, à falência.

Já a oposição diz que a CPMF não será aprovada. O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado ( GO), disse que o discurso da presidente Dilma não alterou a disposição do Congresso contrária à CPMF.

— Foi um discurso de anúncio de impostos. Não sensibilizou ninguém. Ele veio muito mais por conveniência. Ela sabe que não vai passar, qualquer pessoa de bom senso sabe. Mas ela não tem DNA politico — disse Caiado.

Grupo de Picciani propõe ‘saída honrosa’ para Motta

• Confiantes na recondução do deputado fluminense à liderança da bancada do PMDB na Câmara, aliados vão argumentar que desistência do paraibano evitará derrota pública de Cunha

Daiene Cardoso e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Confiantes na recondução do deputado Leonardo Picciani (RJ) à liderança da bancada do PMDB na Câmara na próxima semana, aliados do peemedebista vão propor uma “saída honrosa” da disputa para o deputado Hugo Motta (PB). Diante da possibilidade de derrota de Motta, candidato de Eduardo Cunha (RJ), o grupo de Picciani vai argumentar que a desistência do paraibano evitará uma derrota pública do presidente da Casa.

Nas contas do grupo, Picciani teria hoje 45 votos favoráveis a sua permanência no cargo, de um total esperado de 70 parlamentares votantes. Assim, o candidato de Cunha teria pouco mais de 20 votos. Na avaliação do ala pró-Picciani, o maior derrotado da disputa será Cunha, alvo da Operação Lava Jato e sob risco de perder a presidência da Câmara por decisão do Supremo Tribunal Federal.

A avaliação é a de que uma derrota seria péssima para Cunha em um momento em que tenta salvar seu mandato. Um revés mostraria que ele não tem mais solidariedade dentro do próprio PMDB. É por essa razão que, segundo peemedebistas, Cunha tem feito campanha para Motta como se fosse para si próprio.

Os aliados do atual líder pretendem procurar Motta na próxima terça-feira, 16, véspera da eleição da bancada, para mostrar que a posição de Picciani estaria consolidada. “O gesto vai criar condição para mostrar à bancada que todos estão na mesma direção (de busca da unidade) e que não precisa disputa”, disse um aliado do Picciani.

A operação foi proposta pelo deputado Leonardo Quintão (MG), que protagonizou a destituição temporária de Picciani da liderança da bancada no final do ano passado. Durante uma semana, o mineiro ocupou a liderança, até que o fluminense recuperou apoios e retomou o posto. Quintão chegou a se lançar na disputa, mas sem a ajuda de Cunha e diante do esvaziamento de sua candidatura, anunciou apoio a Picciani. O atual líder preferiu evitar polêmica e não comentou a articulação. “Estou trabalhando para ir à votação”, afirmou.

O grupo de Motta garante que fechou novos apoios nos últimos dias, suficientes para deixá-lo à frente do adversário. “Não vamos parar até o dia da eleição”, disse o deputado Lúcio Vieira Lima (BA). Empenhado na eleição de seu candidato, Cunha passou o feriado de carnaval recebendo deputados em sua casa no Rio.

Piora perspectiva para dívida pública e projeções superam 80% do PIB em 2018

Por Sergio Lamucci – Valor Econômico

SÃO PAULO - As projeções para a dívida pública nos próximos anos mostram um quadro preocupante, apontando para trajetória de crescimento acelerado. O endividamento bruto, que fechou 2015 em 66,2% do PIB, pode bater em quase 84% em 2018, nas projeções do Itaú Unibanco.

As estimativas também são negativas quando se excluem as reservas internacionais da dívida bruta. O indicador, que ficou um pouco abaixo de 42% do PIB no ano passado, pode superar 58% do PIB em 2018. Esse cenário contribui para a piora da percepção do risco Brasil, podendo levar a novos rebaixamentos do rating pelas agências de classificação de risco.

As previsões do Itaú consideram que o setor público continuará a ter déficits primários ao longo desse período, que deverá ser marcado por desempenho muito fraco da atividade econômica e juros reais elevados. Uma receita que segue em queda e o pouco ou nenhum espaço para cortar gastos levam a esse cenário de novos rombos no resultado primário, conceito que exclui despesas com juros.

O economista Luka Barbosa, do Itaú, diz que a dinâmica desfavorável da dívida brasileira está hoje em trajetória insustentável. Para ele, reverter os déficits primários, com reformas que combatam o crescimento estrutural de despesas como as da Previdência é fundamental para enfrentar o problema, afirma. "São necessárias reformas do lado das despesas", resume Barbosa, que vê a necessidade de superávit primário de 2,5% a 3% do PIB para estabilizar a dívida em relação ao tamanho da economia.

Barbosa estima que o resultado primário terá rombo de 1,5% do PIB em 2016, de 2% em 2017 e de 2,5% em 2018. O desempenho da economia também deve seguir ruim. Depois de retração de 4% neste ano, ele espera crescimento de apenas 0,3% no ano que vem, com expansão de 1,4% em 2018.

Com projeções um pouco menos pessimistas para o crescimento e o resultado primário, a Tendências Consultoria vê uma alta menos acentuada da dívida nos próximos anos. Em 2018, o indicador baterá em 78,3% do PIB, nas estimativas da empresa, que projeta retração da economia de 3% e déficit primário de 0,8% do PIB neste ano. Para 2017 e 2018, a Tendências vê um superávit primário de 0,3% e 0,5% do PIB, pela ordem.

Mas o analista de finanças públicas da Tendências, Fabio Klein, adverte que a consultoria deverá revisar para baixo as projeções de crescimento. Como isso implica um cenário pior para a arrecadação, a estimativa para o resultado primário também deve cair.

Nesse cenário, as projeções para a dívida bruta vão aumentar, diz Klein, que vê uma trajetória "preocupante" para o endividamento do governo. O panorama para as contas públicas deverá seguir complicado, uma vez que os gastos públicos deverão continuar a crescer e a receita a cair, num quadro de fraqueza da economia, afirma.

Alguns analistas preferem olhar para a dívida bruta descontando as reservas. Sócio e gestor da Kapitalo Investimentos, Carlos Woelz considera que essa medida reflete de modo mais adequado a qualidade do crédito do Brasil. As reservas são um ativo líquido do país, dizem Woelz e Barbosa. Com isso, faria sentido considerá-las quando se examina a situação fiscal.

Calculado pelo Banco Central, o conceito de dívida líquida tradicional exclui, além das reservas, ativos como os créditos do Tesouro junto aos bancos públicos, que cresceram muito nos últimos anos. Com isso, o indicador perdeu espaço entre os especialistas, por não refletir o impacto dos empréstimos do governo a instituições como o BNDES.

Em 2015, o conceito que abate apenas as reservas da dívida bruta subiu relativamente pouco - de 39,7% para 41,6% do PIB -, porque a disparada do dólar contribuiu para amortecer a alta do indicador. O movimento do câmbio inflou o valor das reservas quando convertidas em reais, impedindo assim uma elevação maior da dívida, excluindo os recursos em moeda forte. Para os próximos anos, não se espera um salto do dólar da mesma magnitude ocorrida em 2015, quando o dólar pulou da casa de R$ 2,65 para R$ 4. Nesse quadro, as estimativas são de alta forte também da dívida bruta abatidas as reservas. O Itaú Unibanco estima que o indicador vai atingir 58,2% do PIB em 2018.

Woelz, que trabalha com números parecidos ao Itaú, diz que o nível atual, na casa de 42% do PIB, não é alto demais. O problema é justamente a trajetória projetada para os próximos anos, que indica um crescimento insustentável, afirma ele.

Woelz aponta uma piora nas contas públicas a partir de setembro do ano passado, que o deixou mais pessimista quanto às perspectivas fiscais. A Kapitalo calcula o resultado primário excluindo operações extraordinárias, fazendo um ajuste sazonal e anualizando o saldo. Na média móvel de seis meses, que suaviza variações mais bruscas, o déficit em junho chegou a ficar próximos de zero, mostrando um esforço fiscal considerável, segundo Woelz. Na média dos seis meses até dezembro, porém, o rombo voltou a superar 1% do PIB, evidenciando a deterioração do resultado das contas públicas. Woelz observa que, quanto mais demorar o ajuste, maior terá que ser o aumento do superávit primário para equilibrar a situação das contas públicas, impedindo uma alta exagerada da dívida.

Economista do Banco Votorantim, Roberto Padovani prefere olhar para a dívida bruta, por ser o indicador mais comparável ao de outros países. Para ele, embora a situação das contas públicas exija atenção, o principal imbróglio é político. Se esse nó for desatado, abre-se espaço para se resolver a questão fiscal, por meio de algum aumento de impostos, de medidas como a reforma da Previdência e o limite aos gastos, além de mudanças que deem mais transparência e flexibilidade às contas públicas. Segundo Padovani, a preocupação principal dos investidores hoje em relação ao Brasil se concentra na crise política, e não se a dívida está em trajetória explosiva.

José Serra*: Mais remédios, menos inépcia

- O Estado de S. Paulo

Isoladamente, o setor da saúde é o que mais sofreu retrocessos na era petista, o que não é pouco dizer. Basta lembrar que, no início da década passada, três em cada cinco brasileiros achava que a saúde em nosso país estava no rumo certo. Hoje essa proporção é bem inferior a um décimo. Tudo de ruim parece ter confluído para se chegar a esse resultado: falta de planejamento e de prioridades claras, retrocesso nas parcerias do Ministério da Saúde com Estados e municípios, loteamento político dos baixos aos altos escalões, corrupção e despreocupação com o custo e a eficiência das diferentes ações do setor.

Este último foi o caso típico da área de medicamentos, após os avanços obtidos durante os dois governos do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Vou analisar neste artigo um exemplo: a imensa demora do registro de medicamentos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), criada durante minha gestão no ministério. Trata-se de um dos grandes gargalos da saúde no Brasil – por isso, aliás, apresentei projeto de lei sobre o tema.

A demora excessiva e injustificada para a concessão do registro dos medicamentos priva a população de remédios essenciais na cura de doenças de toda sorte, incluindo as que oferecem elevado risco de vida. Por sua vez, a restrição da oferta de remédios inibe a concorrência ao diminuir as alternativas disponíveis para os compradores, aumentando ainda mais o custo dos tratamentos nos sistemas público e privado. Não é preciso ser economista para compreender como isso acontece.

São onerados os pacientes, as entidades de saúde, as contas públicas e os cidadãos em geral. O Estado (isto é, os contribuintes) acaba sendo o mais prejudicado, pois as compras governamentais representam, por baixo, cerca de 20% do mercado. Paralelamente, a falta de transparência no processo de registro retira a necessária previsibilidade ao planejamento das ações dos profissionais de saúde, bem como entidades públicas e privadas do setor. Mais grave ainda, as dificuldades na obtenção de registro criam um ambiente perigosamente propício à corrupção, na linha do “criar dificuldades para vender facilidades”.

Alguns números ilustram a seriedade do problema e a medida da transgressão das leis vigentes. O prazo para registro de medicamentos segundo a legislação em vigor é de 90 dias, sem distinção para o tipo de medicamento. Pesquisa recente revelou que esse parâmetro legal virou uma piada diante dos prazos efetivamente observados.

Vejam só: no caso de medicamentos novos, o prazo médio chegou a 512 dias; para os biológicos, essenciais no combate ao câncer, 528 dias; e para os similares, 850 dias. Os genéricos são os mais afetados: o prazo médio para aprovação chegou a 997 dias! Quase mil dias, ou três anos, para conceder um registro, postergando, sem critérios claros, o benefício da concorrência e dos custos menores para a saúde das pessoas!

Há casos dramáticos, como o de um medicamento oncológico que aguardou 58 meses, quase cinco anos, para ter o registro concedido. Durante 44 desses 58 meses não foi sequer submetido à análise!

Essa é a situação a que chegamos, na era petista, na saúde. São números que devem ser conhecidos e seus impactos, bem avaliados, até para que a sociedade pressione pelas mudanças. Precisamos de editoriais, reportagens, debates, pronunciamentos no Congresso e ações legislativas. Neste último campo, apresentei projeto de lei (727/15) que ataca o problema em cinco frentes.

Em primeiro lugar, estabelece prazos distintos de acordo com critérios claros de complexidade técnica de análise e urgência de pôr à disposição dos pacientes. São criadas três categorias, urgente, prioritária e ordinária, com prazos mais realistas de 90, 180 e 360 dias, respectivamente.

Em segundo lugar, os prazos fixados são para valer e passam a contar a partir do momento do pedido de registro. Não poderão ser driblados mediante expedientes burocráticos de fracionamento dos pedidos de diligência. Todas as informações necessárias podem ser solicitadas no início do processo. Casos excepcionais, em que a complexidade técnica exija informações adicionais, devem ser bem justificados, de forma transparente e compreensível.

Em terceiro lugar, para que tudo isso funcione são necessárias a transparência sobre o andamento do processo e a responsabilização do funcionário encarregado em cada estágio, ou seja, a “apuração de responsabilidade funcional”, conforme o § 8.º do artigo 2.º do projeto.

Em quarto lugar, é preciso ter claro que a responsabilização não se pode circunscrever a casos individuais. A Anvisa como um todo deve estar comprometida com o estrito cumprimento de prazos para registro de medicamentos. Daí a importância de se fixar de forma clara e objetiva no contrato de gestão da agência as metas e os prazos, que devem ser seguidos à risca. Conforme estabelecido no artigo 20 do nosso projeto, “o descumprimento injustificado das metas e obrigações pactuadas no contrato de gestão, em dois exercícios financeiros consecutivos, implicará a exoneração dos membros da diretoria colegiada pelo presidente da República”.

Por fim, o projeto trata do problema do enorme estoque de casos acumulados: são aproximadamente 2 mil pedidos de concessão de registro e mais de 5 mil pedidos de renovação, perdidos no cipoal burocrático causado por uma legislação obsoleta, inépcia gerencial e negligência administrativa. Todos esses pedidos serão imediata e automaticamente reenquadrados na nova legislação. E a Anvisa terá de fazer, evidentemente, um mutirão para resolvê-los em prazos decentes.

O leitor sabe que uma nova legislação, por melhor que seja, não vai resolver a questão dos medicamentos. É tão somente uma condição necessária. A suficiência virá do conhecimento amplo do problema, da mobilização que sejamos capazes de fazer e da pressão que devemos exercer sobre o poder público federal. Mãos à obra!
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* José Serra é senador (PSDB-SP)

José Roberto Toledo: Dilma e o consumidor

- O Estado de S. Paulo

A confiança do consumidor cresceu em janeiro, segundo a pesquisa mensal CNI/Ibope. E não foi pouco. Chegou ao maior patamar em cinco meses. Em tese, isso é uma boa notícia para Dilma Rousseff, porque nada se correlaciona mais com a popularidade presidencial do que algumas das questões que estão por trás da medida de confiança do consumidor. Porém, nós já vimos esse aumento acontecer antes e, para azar de Dilma, não se sustentou.

Após oito quedas consecutivas que começaram no final de 2014, o INEC (Índice Nacional de Expectativa do Consumidor) cresceu em julho e agosto do ano passado e, novamente, em outubro e novembro – apenas para cair praticamente tudo o que tinha subido nos meses subsequentes. Assim, desde junho do ano passado, a confiança do consumidor tem se mantido somando altos e baixos – dentro da mesma média, que é a menor da série histórica.

O INEC é a síntese de seis questões econômicas, mas apenas três delas explicam incríveis 92% da desaprovação de Dilma. Isso mesmo: segundo regressão linear calculada pelo Ibope, mais de 9 em cada 10 respostas negativas sobre como a presidente está governando o País se devem à economia. E essa correlação só vem aumentando com o tempo. Por mais que denúncias de corrupção danifiquem, é o bolso que mata a popularidade presidencial.

Entre os três cavaleiros do apocalipse da governabilidade, um está montado num pangaré e tem metade da influência dos outros dois. Trata-se da situação financeira atual do entrevistado, em comparação com o passado recente. A cada ponto porcentual que ela cai, a desaprovação de Dilma cresce 0,7 ponto. Ou seja, a medida que a renda média vinda do trabalho diminui, a presidente tende a penar ainda mais no purgatório da opinião pública.

Mas esse é o menor dos seus problemas. Quando o consumidor perde a esperança e sua expectativa de comprar bens de maior valor reflui, a popularidade de Dilma sofre um revés ainda maior. A cada ponto que diminuir essa expectativa, a desaprovação ao trabalho do governante aumenta em 1,4 ponto. Quando sai a notícia de que a venda de automóveis é menor em “x” anos, e a de TV e geladeiras, a mais baixa em “y” meses, pode estar certo de que a taxa de aprovação de quem está no Planalto vai cair.

Pior do que isso, só o desemprego. Segundo os cálculos do Ibope, a cada ponto de aumento da percepção das pessoas de que o desemprego vai crescer, a impopularidade de Dilma cresce 1,5 ponto. É um desastre.

Entre outras coisas, significa dizer que com as taxas oficiais de desocupação medidas pelo IBGE em alta, será muito difícil – para não dizer quase impossível – para o governo recuperar seu apoio perdido. Aqui, porém, cabe enfatizar um ponto importante: a expectativa de aumento do desemprego é diferente da taxa de desemprego em si. Elas se movem independentemente uma da outra.

Não chega a ser uma regra, mas é comum que a expectativa de aumento do desemprego se antecipe às oscilações das taxas oficiais. É como se o trabalhador soubesse o que vai acontecer antes dos economistas, seja porque ele está vendo que as vagas de seus colegas que deixaram o emprego não são preenchidas, seja porque ele vê parentes serem demitidos, seja porque ele próprio percebe que está prestes a entrar no seguro-desemprego.

O crescimento do INEC em janeiro foi um sinal positivo que vai na contramão de quase todos os outros indicadores econômicos. Por isso é bom esperar pelos dados de fevereiro e março. Se eles mantiverem a tendência, o governo pode sonhar com a remota possibilidade de Dilma começar a escalar o poço em que se meteu.

A despeito do que venha acontecer, os cálculos do Ibope servem para lembrar que a Lava Jato pode ter aleijado o PT, combalido Lula, mas que, ainda assim, não é o maior problema de Dilma. Para a presidente, o que pesa mesmo é o bolso do consumidor.

Rogério Gentile: As condutas de Lula

- Folha de S. Paulo

O PT reage aos questionamentos sobre os supostos privilégios concedidos a Lula com o inconformismo e a prepotência de quem considera que o ex-presidente, em razão dos serviços que prestou ao país, devesse ser tratado como alguém acima do bem e do mal.

Invariavelmente, cita seu "legado de realizações", o "sucesso dos seus programas sociais" e "a elevação do Brasil no cenário mundial" como uma espécie de salvo-conduto para todo o resto. Afinal, quem fez tanto pelo povo brasileiro só pode ser uma pessoa honrada. Será?

O discurso do "bom homem" é acrescido do da "vítima das elites", perseguido a todo custo para que não possa voltar em 2018. "Nunca antes um ex-presidente foi tão caluniado, difamado e injuriado", escreveu Rui Falcão, o presidente do PT, esquecendo-se de que o próprio Lula já chamou Sarney "de grande ladrão".

O fato é que, por mais que o PT tente construir uma narrativa política, buscando desviar a atenção geral para assunto distinto do que está sendo questionado, jamais houve indícios tão consistentes e constrangedores quanto os que estão sendo apontados agora a respeito das condutas do ex-presidente.

Com o agravante de que, diferentemente de outros episódios que envolveram o PT, quando a complexidade das situações afetava o entendimento, as suspeitas que recaem sobre Lula são de fácil compreensão popular.

Há muitas dúvidas no ar: empreiteiras que trabalham para o governo presentearam o ex-presidente com as obras e a mobília do sítio que costuma frequentar? Por que a OAS gastou R$ 770 mil para reformar um tríplex em Guarujá que estava sendo negociado com a família de Lula? Por que, segundo testemunhas, a reforma atendia ao gosto da família se ela não era a proprietária? O que o seu filho fez para receber R$ 2,5 milhões de uma consultoria investigada?

Lula não está acima do bem e do mal. Se não fez nada de errado, pode muito bem se explicar à sociedade.

Luiz Carlos Azedo: Depois da folia

• O PT decidiu utilizar todos os meios ao seu alcance para ir às ruas contra um suposto cerco político ao ex-presidente Lula para incriminá-lo na Lava-Jato

- Correio Braziliense

Tudo o que todos querem, nesta altura do campeonato, é uma luz no fim do túnel na crise brasileira, mas até agora não apareceu. Passada a quarta-feira de cinzas, ou seja, depois de um dos carnavais mais animados dos últimos tempos – “nunca vi tanta gente nas ruas, em 38 anos de trabalho”, disse-me um taxista carioca -, a sensação é de que tudo não passou de um megabaile da Ilha Fiscal, pois nada impede que a situação do país possa piorar.

Enquanto os brasileiros caíam na folia, as bolsas globais afundaram pelo quinto pregão seguido, em um movimento que não ocorria desde o início do ano. A Bolsa de Tóquio caiu 5,4% na terça-feira de carnaval. Londres recuou 1% e Nova York perdeu 0,08%. A queda continuou na quarta-feira de cinzas e o Brasil sentiu o impacto. Os bancos corrigiram as previsões de recessão para 4% em 2016, com inflação de 7,6% e dólar a R$ 4,70. O que mais os assusta é a combinação de uma crise dos bancos europeus com a volta da “nova matriz econômica”, sob comando do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.

Para os que não sabem, seis dias antes da Proclamação da República, em 9 de novembro de 1889, Dom Pedro II promoveu um baile para 2 mil pessoas na pequena e charmosa ilha da baía de Guanabara, em frente ao Paço Imperial, na hoje denominada Praça XV de Novembro. A festa homenageava a oficialidade do encouraçado chileno Almirante Cochrane (ele mesmo, o comandante da recém-criada Marinha brasileira na Guerra da Independência) e, ao mesmo tempo, comemorava as bodas de prata da princesa Isabel e do Conde D’Eu.

A intenção do imperador era provar que a monarquia seguia viva e forte, mas a conspiração republicana estava em marcha. Em 17 de novembro, o governo provisório comandado pelo Marechal Deodoro da Fonseca obrigou a família imperial a deixar o país para o exílio em Paris, onde Dom Pedro II morreu dois anos depois. Antes que alguém tire conclusões apressadas, vamos deixar claro: não há nenhum golpe militar em marcha.

O alto-comando do Exército, porém, anda preocupado com a radicalização política e as consequências da desconstrução da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência em 2018, por causa da Operação Lava-Jato. O que os militares temem é a violência política nas ruas. Cresce a mobilização do PT e de seus aliados contra os protestos dos “coxinhas”, como são chamados os militantes da oposição organizada via redes sociais, para barrar a proposta de impeachment da presidente Dilma Rousseff e defender a candidatura de Lula em 2018.

Um sinal de que o PT e seus aliados, como o PCdoB, que está no comando do Ministério da Defesa, pretendem radicalizar a atuação de rua é o protesto marcado para 17 de fevereiro, pela CUT, MST, UNE e UBES, na porta do Fórum de São Paulo, onde o ex-presidente Lula deverá depor para esclarecer à Justiça qual é a sua verdadeira relação com os imóveis mais badalados do momento: o tríplex do Condomínio Solaris, no Guarujá, e o sítio Santa Bárbara, em Atibaia. O Ministério Público Paulista investiga se as propriedades pertencem de fato ao ex-presidente ou não.

Manifestações deste tipo não costumam dar muito certo, pois somente irritam as autoridades do Judiciário, que não costumam aceitar pressões, ainda mais abertas, como essa. Mas o PT resolveu politizar o debate sobre a suposta ocultação de patrimônio de Lula, cuja defesa argumenta que o ex-presidente e sua esposa, Mariza Letícia, desistiram da compra do apartamento de praia e apenas utilizam o sítio de Atibaia porque o imóvel foi “disponibilizado” pelos sócios de um dos filhos. Pode ser que esse inquérito não dê em nada, além do desgaste de imagem já ocorrido, pois é preciso provar que Lula seja mesmo proprietário de um ou dos dois imóveis. Mobiliário e benfeitorias, por ora, são apenas os indícios. Com base nisso, o PT decidiu utilizar todos os meios ao alcance para ir às ruas contra o que caracteriza como um suposto cerco político ao ex-presidente para incriminá-lo na Lava-Jato.

A culpa
Quem semeia vento colhe tempestade. O juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato, autorizou a abertura de um inquérito específico para que a PF investigue o Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP). A força-tarefa suspeita que empreiteiras como OAS e Odebrecht tenham realizado obras na propriedade como compensação por contratos com o governo.

Lula é a luz no fim do túnel para o PT, na sucessão de Dilma, em 2018. Pode não ser para Dilma, que acabará responsabilizada por ele, publicamente, pela crise econômica e pela desarticulação da base política do governo — o que já o faz reservadamente. Mas o ex-presidente não tem como proceder da mesma maneira em relação à crise ética. Nesse caso, Dilma é quem poderia responsabilizar Lula pelo escândalo da Petrobras, do qual tirou o corpo fora, e outros descalabros, mas isso seria um suicídio político, que não oferece garantia de que se livrará da pecha de incompetente.

Demétrio Magnoli: O maior de todos os erros

- O Globo

Como regra, artigos assinados por Rui Falcão, presidente do PT, no site de seu partido têm tanta relevância quanto discursos corriqueiros em câmaras de vereadores interioranas. Uma exceção é o texto de escassas 231 palavras publicado há três dias, que convoca uma insurgência contra o Judiciário. Falcão não emite uma opinião, não mobiliza argumentos, não deflagra um debate. De fato, anuncia uma operação política articulada pelo próprio Lula. Se levada adiante, ela será o maior de todos os erros do ex-presidente.

Lula encontra- se sob investigação. No âmbito da Lava- Jato, a Polícia Federal colhe informações sobre imóveis do edifício Solaris, no Guarujá, inclusive um tríplex reformado pela OAS para o ex-presidente. O Ministério Público de São Paulo convocou- o a prestar depoimento sobre o misterioso caso do sítio em Atibaia, que utiliza como se fosse proprietário, reformado por um pool de empresas envolvidas no “petrolão”. Ele também é investigado no âmbito da Operação Zelotes, que trata de um suposto esquema de compra de medidas provisórias. Na mira do texto de Falcão encontram- se as três investigações, que jamais recebem menção explícita.

“Nunca antes neste país”, escreve o presidente petista, produzindo uma ironia involuntária, “um ex-presidente da República foi tão caluniado, difamado, injuriado e atacado como o companheiro Lula”. Até aí, nada. O trecho que interessa aparece na sequência: “Inconformado com sua aprovação inédita ao deixar o governo, o consórcio entre a oposição reacionária, a mídia monopolizada e setores do aparelho de Estado capturados pela direita quer convertê-lo em vilão”. Como a “oposição reacionária” e a “mídia monopolizada” não têm poder para instaurar inquéritos, o alvo do chamado à militância são os “setores do aparelho de Estado capturados pela direita” — isto é, na deplorável linguagem escolhida pelo lulopetismo, o sistema de justiça.

As investigações em curso evidenciaram que Lula recebeu favores extraordinários de grandes empresas condenadas por corrupção em negócios com a Petrobras. A promiscuidade entre o ex-presidente e os empresários corruptos foi tacitamente admitida por Gilberto Carvalho, o principal lugar- tenente de Lula, que qualificou os presentes como “a coisa mais natural do mundo”. No estágio atual, a imagem do segundo “pai dos pobres”, propalado sucessor de Getúlio Vargas, já sofreu ferimentos políticos talvez incuráveis. Mas, na esfera criminal, Lula só será indiciado se emergirem sinais convincentes de que ele atuou para retribuir os favores recebidos, subordinando o interesse público aos interesses dos generosos empresários. Nesse contexto, o grito de guerra de Falcão parece uma tentativa de intimidação da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário. Na hipótese de inocência de Lula, é um erro dramático.

Um raio no céu claro? Não. Perto do texto de Falcão, no site do PT, encontra- se a convocação da Frente Brasil Popular para um ato público em defesa de Lula, diante do Fórum Criminal da Barra Funda, em São Paulo, em 17 de fevereiro, na hora marcada para o depoimento do ex-presidente. A Frente Brasil Popular é formada por PT, PDT e PCdoB, além de diversas entidades e movimentos sociais, como a CUT, a UNE, o MST e a Associação Juízes pela Democracia. Na convocação, denuncia- se uma “postura golpista e antidemocrática” de “setores do Poder Judiciário”. De fato, o campo político liderado pelo PT está dizendo que investigar Lula é uma ousadia inaceitável. A democracia exige o privilégio, a desigualdade perante a lei — eis a estranha mensagem veiculada pelo lulopetismo (e, curiosamente, por “juízes pela democracia” engajados numa mobilização partidária contra o Judiciário).

Um compêndio sintético dos erros de Lula exigiria um pequeno livro. Contudo, até hoje, a lista não abrange um ataque direto às instituições da democracia. No seu ativo, o ex-presidente tem o respeito ao princípio da alternância no poder, sedimentado pela decisão de virar as costas ao movimento continuísta ensaiado entre correntes do PT. Tem, ademais, apesar de inúmeras hesitações, o reconhecimento das prerrogativas do Judiciário, expresso nas suas declarações, à época do “mensalão”, de que “os companheiros que erraram devem responder por seus erros”. A operação política anunciada por Falcão e pela Frente Brasil Popular, que não existiria sem a concorrência do próprio Lula, representará uma ruptura histórica.

José Dirceu, José Genoino et caterva ergueram o punho para declararem- se presos políticos na hora da execução de suas sentenças de prisão. Lula, porém, exercitou a prudência, afastando- se sabiamente das manifestações dos seus. Preservou, com isso, o fio que conecta o PT à democracia. Todos podem apontar, justificadamente, as pequenas rebeliões petistas contra o sistema de justiça. Ninguém, contudo, tem o direito legítimo de atribuí-las ao núcleo dirigente do lulopetismo, que só opera com o aval de Lula. A distinção não tem importância para as vozes extremistas que pregam o banimento do PT, mas é crucial para a maioria moderada da opinião pública. É ela que, agora, está em jogo.

No ato diante do fórum da Barra Funda, os militantes organizam- se para ecoar a palavra de ordem “Lula é meu amigo; mexeu com Lula, mexeu comigo!”. O PT está, inadvertidamente, oferecendo uma perigosa sugestão. Será que Falcão usará a palavra “golpismo” se Eduardo Cunha aparecer com uma chusma de apoiadores iracundos para intimidar policiais, procuradores e juízes num futuro depoimento como investigado?

Numa democracia digna desse nome, o cidadão Lula da Silva não possui direitos especiais, superiores ao do cidadão Cunha ou de qualquer anônimo. O cerco de um fórum por milicianos, mesmo se desarmados, equivale a dizer que a lei é propriedade de quem tem as ruas. Lula parece esquecer- se disso. Os demais brasileiros lembrarão.

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Demétrio Magnoli é sociólogo

Bernardo Mello Franco: A Quarta-Feira de Cinzas

- Folha de S. Paulo

O PT completou ontem (10) 36 anos de existência. Por ironia do calendário, a data caiu na Quarta-Feira de Cinzas. O partido fez aniversário em clima melancólico, como quem se despede do Carnaval.

Embora continue no poder, o petismo continua a sangrar com a Lava Jato e a impopularidade de Dilma Rousseff. Depois da folia, terá que enfrentar ameaças de deserção no Congresso e em sua base sindical.

O primeiro risco será aberto pela chamada janela da infidelidade. A partir da semana que vem, os políticos terão 30 dias para mudar de partido sem perder o mandato. Pelas negociações em curso, o PT pode ser a maior vítima do troca-troca.

No ano passado, a legenda já perdeu quatro deputados federais para siglas novatas -um para a Rede Sustentabilidade e três para o exótico Partido da Mulher Brasileira. Agora a pressão virá de centenas de candidatos a prefeito que temem perder as eleições municipais por causa do desgaste do petismo. A janela será a última chance de mudar de sigla antes de outubro.

O segundo risco de deserção está ligado à nova agenda econômica da presidente. Dilma prometeu apresentar em breve uma proposta de reforma da Previdência, incluindo a exigência de idade mínima para a aposentadoria de servidores.

A medida é mais que necessária, mas abrirá uma nova frente de atrito com as bases petistas. Até a CUT, sempre pronta a defender o governo, ameaça se rebelar.

Sob fogo cerrado da Lava Jato, o ex-presidente Lula se limitou a registrar o aniversário do PT com um vídeo divulgado na internet. Na gravação, ele faz uma referência rápida a "erros" do passado e evita comentar o noticiário que o envolve.

O maior líder petista parece abatido. No fim do vídeo, ele diz uma frase reveladora sobre o momento da sigla que fundou em 1980: "Vamos torcer para que quando estivermos comemorando 37 anos estejamos mais fortes do que estamos hoje".

Ribamar Oliveira: Não haverá superávit e o governo sabe disso

• Receitas estão em queda pior que no ano passado

- Valor Econômico

Antes de definir o valor do contingenciamento das dotações orçamentárias deste ano, o governo terá que tomar uma decisão muito mais difícil. A presidente Dilma Rousseff e os ministros da área econômica terão que avaliar se vale a pena manter a ilusão de que é possível alcançar a meta de superávit primário de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB).

Essa é a primeira vez que o ano começa com economistas de fora e de dentro do governo conscientes de que a meta fiscal é uma miragem. O melhor caminho para o governo talvez seja o de mostrar total transparência para a sociedade sobre a situação de penúria das contas públicas.

No início de 2015, o governo anunciou o contingenciamento recorde de R$ 69,9 bilhões das despesas e disse que ele era necessário para alcançar o superávit primário estabelecido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A estratégia oficial de dizer que era possível cumprir a meta foi mantida até julho, quando, finalmente, a equipe econômica entregou os pontos.

A alegação apresentada pelo governo para a demora em reconhecer a impossibilidade de fazer o superávit primário foi que a deterioração da receita tributária só ficou clara em meados de 2015. Quando isso aconteceu, a mudança da meta ocorreu.

A novidade deste ano é que não será possível para o governo manter o mesmo discurso. Quem ainda tinha esperança de que o superávit primário fixado na LDO para 2016 era uma possibilidade concreta, decepcionou-se com as informações preliminares sobre a arrecadação tributária da União em janeiro. Os dados do Siafi, o sistema eletrônico que registra todas as receitas e despesas da União, mostram queda real de cerca de 5% da arrecadação dos tributos administrados pela Receita (excluindo a contribuição à Previdência Social) em janeiro, na comparação com o mesmo mês de 2015.

O Siafi mostra queda generalizada da receita de todos os tributos em janeiro, refletindo a continuidade da forte retração da economia brasileira. Os analistas do mercado refizeram os seus cálculos e agora estimam uma queda de 3,2% do PIB neste ano, de acordo com o boletim Focus, divulgado ontem pelo Banco Central. Para alguns, a recessão poderá ser ainda pior, podendo superar os 4%.

A queda da receita em janeiro deste ano é muito grave, pois a comparação é com o mesmo mês de 2015 que, por sua vez, já tinha registrado uma redução real de 4,5% em relação a janeiro de 2014. Está ocorrendo uma queda real em cima de uma queda real. O quadro da receita tributária é, portanto, desesperador.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) determina que até 30 dias após a publicação do Orçamento, o Poder Executivo estabelecerá a programação orçamentária e financeira para todo ano, ou seja, o famoso contingenciamento das dotações. O decreto com a programação poderá, portanto, ser publicado amanhã no "Diário Oficial da União", pois o prazo previsto na lei termina no domingo.

As equipes técnicas dos ministérios do Planejamento e da Fazenda passaram os últimos dias refazendo as suas estimativas sobre os gastos e as receitas da União neste ano. O retrato fiscal que está surgindo dessa reavaliação é certamente desanimador.

Haverá a revisão para pior de quase todos os parâmetros macroeconômicos que são utilizados na estimativa das receitas. A retração da economia será maior do que o 1,9% projetado no Orçamento. A redução real da massa salarial provavelmente será maior do que os 4,55% utilizados nas estimativas de arrecadação da Previdência Social. A queda vertiginosa do preço do petróleo afetará sensivelmente a receita com royalties. Além disso, é cada vez mais improvável que o governo arrecade R$ 37 bilhões com a venda de ativos, como está previsto na lei orçamentária.

A situação é agravada pelo fato de que a maior parte das despesas ditas obrigatórias está indexada a algum mecanismo de correção que lhes garante, no mínimo, a preservação de seu valor real. Nesse caso estão, por exemplo, os benefícios previdenciários, assistenciais e o seguro-desemprego. Some-se a isso o fato de que há um crescimento vegetativo superior a 3% ao ano no número desses benefícios.

Com as receitas tributárias em queda e as despesas obrigatórias sendo mantidas constantes, em sua maioria, restaria ao governo obter, como em anos anteriores, uma receita extraordinária de grande monta. O problema é que algumas das chamadas receitas atípicas já foram consideradas na lei orçamentária, como é o caso da arrecadação que será obtida com a regularização dos ativos enviados ao exterior de forma ilegal por brasileiros e os recursos que ingressarão nos cofres do Tesouro com a concessão de serviços públicos. Para as contas fecharem com um superávit primário neste ano, o governo teria que obter outras receitas extras em valor significativo.

A alternativa seria reduzir fortemente as chamadas despesas discricionárias, ou seja, aquelas que o governo é livre para passar a tesoura. Há, sem dúvida, gordura no Orçamento deste ano que pode ser cortada. O problema é que, no ano passado, essas despesas ficaram próximas do que foi realizado em 2013. Assim, para cortar em relação ao gasto em 2015, o governo teria que trazer a despesa discricionária de 2016 para um patamar igual ao de 2012 ou de 2011.

Nesse caso, o corte atingiria os investimentos, pois os gastos com custeio da máquina administrativa (luz, telefone, água, papel, diárias, passagens etc.) foram fortemente reduzidos no ano passado. O máximo que o governo poderá fazer é manter as despesas de custeio constantes ou em ligeira queda.

Uma parte do corte realizado nos investimentos em 2015 significou simplesmente um calote nas empresas, que deixaram de receber pelos serviços ou obras que entregaram à União. Assim, o governo terá, neste ano, de regularizar esses pagamentos, em primeiro lugar. Poderá reduzir ainda mais os recursos para alguns programas que considera prioritários, como, por exemplo, o Minha Casa, Minha Vida (MCMV). Mas isso traria um desgaste político, que dificilmente o governo aceitaria correr.

Lula, um peso para o PT – Editorial / O Estado de S. Paulo

Há quem diga que o maior problema do PT é o governo que reelegeu em outubro de 2014. Não é mais. Os petistas já desistiram de Dilma Rousseff. Mantêm as aparências, até porque ninguém lá quer abrir mão das boquinhas conquistadas. Mas o PT deixou de ser o partido do governo a partir do instante em que recusou apoio a medidas consideradas essenciais pelo Planalto para enfrentar a crise econômica. A conclusão do processo de ajuste fiscal e a reforma da Previdência são dois exemplos relevantes.

Ao deixar Dilma ao relento, o PT contava com o bônus Lula. Mas o bônus virou ônus. Hoje, o PT é obrigado a carregar o peso político e moral em que se transformou o seu principal líder: Luiz Inácio Lula da Silva. A concretização daquilo que todo mundo sempre soube que mais cedo ou mais tarde aconteceria – o envolvimento cada vez maior e mais profundo de Lula nas investigações de corrupção – obriga o PT a defender o seu cacique a qualquer custo. O articulador formal dessa ingrata missão é um pau-mandado de Lula, o presidente nacional do PT, Rui Falcão. Na segunda-feira passada, ele divulgou uma das peças fundamentais de sua estratégia no site “Agência PT de Notícias”.

O texto é uma impressionante peça de ficção que começa fazendo aquilo em que o PT é insuperável: atacar. Escreve Rui Falcão: “Nunca antes neste país um ex-presidente da República foi tão caluniado, difamado, injuriado como o companheiro Lula. Inconformado com sua aprovação inédita ao deixar o governo, o consórcio entre a oposição reacionária, a mídia monopolizada e setores do aparelho de Estado capturados pela direita quer convertê-lo em vilão”.

Lula deixou o governo com uma aprovação inédita, há mais de cinco anos. Desde então, seu prestígio despencou, junto com o de Dilma e o do PT, e não foi por culpa da “oposição reacionária”, da “mídia monopolizada” – seja lá que bobagem se pretenda dizer com isso – ou de “setores do aparelho de Estado capturados pela direita”. Faltou coragem a Falcão para nomear claramente os “capturados”: a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e setores do Judiciário, como a 13.ª Vara Criminal Federal, do juiz Sergio Moro.

O grande lance de ilusionismo de Falcão, porém, é a tentativa de apagar da memória dos brasileiros cinco anos de governo Dilma, o que, por si só, deixa claro que o PT abandonou de vez a soçobrante nau governista. Agora, aposta no futuro: “O legado de realizações a favor dos mais pobres, a elevação do Brasil no cenário mundial, os sucessos na educação, na saúde, nos programas sociais, na área da infraestrutura, em seus oito anos na Presidência, precisa ser destruído para que Lula não possa retornar em 2018”.

Ora, o “legado de realizações” já está sendo destruído. São as realizações que, na verdade, Lula herdou, ampliou e aprofundou, só negligenciando a necessidade de dar-lhes sustentabilidade na área econômica e institucional por meio de reformas estruturantes do Estado. A destruição desse legado, de que os indicadores econômicos e sociais dão notícia diariamente, é a obra-prima de Dilma Rousseff. Não é por outra razão que o PT quer distância dela.

Se tivesse realmente um mínimo de comprometimento com o verdadeiro interesse social, o PT teria tido a coragem de apoiar as medidas impopulares indispensáveis ao saneamento das contas públicas e à criação de condições para que o governo assuma a responsabilidade não de impor, mas de coordenar um amplo e eficiente programa de recuperação econômica e retomada do crescimento.

Mas o PT acha que pode se salvar, como sempre, iludindo os brasileiros, agora combatendo “a escalada golpista” e o “cerco criminoso ao Lula”. Este, aliás, está envolvido em novo inquérito policial, de caráter sigiloso, no âmbito da Operação Lava Jato, a respeito do já famoso sítio em Atibaia que amigos generosos e desinteressados “disponibilizam” para recreio do clã Da Silva. O “criminoso” responsável por mais esse ato de “linchamento político e moral” de Lula, baseado em “denúncias sem provas”, é, claro, o juiz Sergio Moro.