A recente e decantada união do PMDB, agora com um cargo vistoso, a Vice-Presidência da República, que não lhe garantiu mais poder do que tinha mas lhe deu uma segurança inédita, remete o desavisado a uma mesa redonda em torno da fisiologia. Todos juntos por cargos e verbas. O partido, porém, é o fracionado de sempre. E com sua inesgotável capacidade de surpreender o eleitorado, tem inovações a apresentar nesse campo. Na atual temporada surge com uma novidade: o fortalecimento de dois movimentos com origem em suas bancadas parlamentares.
No Senado, nesta legislatura, o PMDB deu uma arejada. Não se livrou dos perfis mofados do seu portfólio, ao contrário, reelegeu ícones da espécie, mas o grupo de independentes - do jugo da cúpula partidária, não do governo - aumentou significativamente.
Ao lado dos senadores Jarbas Vasconcelos, ex-governador e senador por Pernambuco, último dos autênticos do partido, e Pedro Simon, senador pelo Rio Grande do Sul, combatentes antigos, estão agora o senador catarinense e ex-governador Luiz Henrique, um dos grandes amigos de Ulysses Guimarães, símbolo do MDB dos áureos tempos.
Os debates do grupo têm reunido ainda os senadores Casildo Maldaner (SC), Roberto Requião (PR), Waldemir Moka (MS); Eduardo Braga (AM), Vital do Rego (PB). É o G-8, como foi batizado o grupo, numa bancada de 19 senadores. "É um fato novo, precisávamos melhorar o PMDB, estava sufocante", define um dos mais atuantes.
Não são necessariamente dissidentes, nem mesmo todos independentes com relação ao governo. São raros os que se declaram em oposição e a imensa maioria é formada por aliados.
Os diferencia, entretanto, o fato de desejarem tirar o PMDB da sarjeta, da linha das denúncias e da prática do fisiologismo escancarado, das crises e das críticas. Querem ser independentes, sim, da pseudo liderança dos senadores José Sarney, Renan Calheiros, Romero Jucá, em quem a cultura do fisiologismo está impregnada. Os senadores perceberam que os três comandantes da bancada ficam com tudo, não só do governo como do próprio Senado. "Aqui tudo é Sarney, a Gráfica, a Polícia Legislativa, tudo é do tempo do Agaciel Maia", critica, enojado, um senador.
Quando existiam apenas Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon, o presidente da Casa e o líder do partido os ignoravam. Agora não são apenas os dois, mas oito, às vezes nove, nas reuniões de discussão sobre seus mandatos e seu partido. Se for necessário determinar sua tendência, esses senadores são mais governo que oposição. Mas pode-se dizer que em sua imensa maioria são de oposição ao Sarney, ao Renan, ao Romero Jucá, o líder do governo no Senado de cujos métodos e forma de atuação um bom número de senadores aliados da presidente Dilma discorda.
Esses senadores do PMDB que são independentes do fisiologismo concordam, por exemplo, com a reforma administrativa do Senado proposta pelo senador Ricardo Ferraço (ES). É uma boa reforma, moralizadora, e devem apoiá-la. A conferir se o presidente da Casa deixará as propostas irem adiante.
"Sarney, Renan e Jucá são donos do partido, limitam o acesso ao governo, falam como se fosse em nome de todos e restringem o PMDB à sua imagem. Isso tem que mudar", diz um dos que chegaram para dar novo alento à bancada.
Os integrantes do grupo têm um acordo tácito: nenhum pressiona o outro para votar contra ou a favor do governo. Não haverá cooptação nem amarras de espécie alguma. Também não haverá omissão.
A ideia contagiou e formou-se um grupo também na bancada do PMDB da Câmara. Com o mesmo espírito, o de se desvincular dos mal afamados, cujo representante mais condecorado é o deputado Eduardo Cunha (RJ), um grupo de deputados também se reune, discute o mandato, os projetos e sua postura diante do eleitorado.
No movimento que se desenvolve na Câmara participam, até o momento, 12 parlamentares. Um, de Pernambuco - Raul Henry; três do Rio Grande do Sul - Osmar Terra, Alceu Moreira e Darcisio Perondi; dois do Paraná - Reinhold Stephanes, Osmar Serraglio; de Santa Catarina têm frequentado as reuniões os deputados Ronaldo Benedet e Mauro Mariani; do Mato Grosso do Sul aparecem Fábio Trad e Geraldo Resende. Às vezes participam Lelo Coimbra, do Espírito Santo; Gastão Vieira, do Maranhão; Marcelo de Castro, do Piauí.
"Decidimos nos reunir no início da Legislatura, havia um conjunto de deputados muito incomodados com a pecha de fisiologismo do PMDB. O Eduardo Cunha mandando nas nomeações, a cúpula só tratando de cargos, decidimos não deixar que o partido fosse dominado por isso e mostrar que boa parte da bancada preferia aparecer defendendo ideias e projetos", diz um participante assíduo dos encontros políticos.
O que se discute, nessas ocasiões, é como evitar que o PMDB seja tomado pelas disputas para a conquista do "poder pelo poder", para ocupação dos cargos, para fazer negócios, para indicar diretor administrativo de estatal ou de fundos de pensão, todas questões que vêm à mente quando a sigla é mencionada.
Nesses encontros, têm discutido muito a Emenda 29. Há vários médicos no grupo e não se preocupam com o risco que esta regulamentação representa para a volta da CPMF. Sabem que o governo só aceitará mais encargos e perda de arrecadação se houver uma fonte nova de verbas, mas a discussão de conteúdo da emenda obscurece, para esses deputados, o ônus político do aumento de imposto para o contribuinte.
Na agenda de discussões já constaram a votação de uma legislação de responsabilidade educacional, a necessidade de apoio a qualquer política de melhoramento de qualidade do gasto público, e a definição de uma legislação que garanta o aumento da transparência e rigor na máquina pública.
Acreditam esses pemedebistas que estão tendo um mandato mais efetivo, não apenas do ponto de vista de conteúdo como da postura ética na relação com o eleitorado. Acreditam no caráter educativo da iniciativa: desindentificar o PMDB com a fisiologia e provar que há ali vida partidária.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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