Em conversas
reservadas, ministros do STF mostraram-se contrários à abertura de nova
investigação sobre o mensalão antes da conclusão da dosimetria das penas do julgamento.
O Estado revelou ontem que o empresário Marcos Valério, condenado a mais de 40
anos de prisão, deu novo depoimento e citou Lula, Antonio Palocci e Celso
Daniel. O líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto, chamou Valério de
"desqualificado" e disse que o partido já "pagou um alto
preço" por ter se envolvido com ele. A Executiva Nacional do PT adiou a
divulgação de manifesto em defesa dos réus.
Ministros do STF
dizem ser contra nova investigação antes de fim do julgamento
Operador. Integrantes do Supremo afirmam que abrir neste momento uma
apuração a partir do novo depoimento de Marcos Valério, dado em setembro à
Procuradoria-Geral da República, poderia tumultuar a conclusão do cálculo de
penas dos condenados no mensalão
Mariângela Gallucci, Felipe Recondo, Ricardo Brito
BRASÍLIA - Ministros do Supremo Tribunal Federal afirmaram ontem em
conversas reservadas serem contrários à abertura de nova investigação sobre o
esquema do mensalão antes que a dosimetria das penas dos condenados no caso
seja concluída, sob o risco de haver "tumulto" no fim do julgamento.
O Estado revelou ontem que o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza,
condenado a mais de 40 anos de prisão por operar o esquema de pagamentos de
parlamentares no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
prestou novo depoimento à Procuradoria-Geral da República.
Valério foi espontaneamente a Brasília em setembro acompanhado de seu
advogado Marcelo Leonardo. No novo relato, citou os nomes de Lula e do ex-ministro
Antonio Palocci, falou sobre movimentações de dinheiro no exterior e afirmou
ter dados sobre o assassinato do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel.
O empresário disse que poderá dar mais detalhes caso seja incluído no
programa de proteção à testemunha, o que o livraria da cadeia. O
procurador-geral da República, Roberto Gurgel, ainda não decidiu se abrirá ou
não uma nova investigação para apurar os relatos feitos por Valério.
"Seria até uma ingenuidade misturar as duas coisas", afirmou um
ministro que pediu para não ser identificado. "E se for uma manobra dele?
Não podemos ser ingênuos", afirmou o magistrado. Na própria
Procuradoria-Geral, o novo depoimento de Valério foi recebido com ressalvas, já
que o empresário é conhecido como "jogador" - já havia prometido
depoimentos bombásticos em situações anteriores mas acabou não fazendo novas
revelações.
Outro integrante do STF lembrou que "se o relato foi puramente oral, o
préstimo é quase zero". Na opinião desse ministro, para que o depoimento
seja levado a sério Valério precisa ter juntado documentos ou fornecido
informações objetivas "com coincidência de dados de outros fatos apurados
pelo Ministério Público". "É necessário verificar se as datas
fecham", afirmou o magistrado.
Sem efeito. Marco Aurélio Mello, único ministro que falou abertamente ontem
sobre o caso, ironizou o fato de Valério ter prestado depoimento em setembro,
quando o julgamento já estava em curso e o empresário recebia suas primeiras
condenações. "A ficha pode ter caído um pouco tarde", afirmou Mello.
"Essa postura de Marcos Valério é neutra, não repercute", disse o
ministro.
No novo depoimento, Valério afirmou ainda que recebeu ameaças de morte. Por
isso, encaminhou ao Supremo no dia 22 de setembro um fax, pedindo proteção a
ele e à sua família.
Ministros do tribunal afirmaram que Gurgel deve adotar todas as medidas
necessárias para resguardar a vida de Valério.
Sabe tudo. Um subprocurador-geral da República, com experiência de atuação
na área criminal, disse não ver "nenhum problema de uma pessoa condenada
prestar depoimento e abrir o jogo", como seria a promessa de Valério.
Segundo esse integrante do Ministério Público Federal, é preciso avaliar a
extensão do depoimento. Ainda de acordo com o subprocurador, Valério "está
pagando sozinho, com pena alta".
Outro subprocurador disse que Gurgel adotará a postura certa caso deixe para
avaliar o depoimento somente após o fim do processo do mensalão. "Depois
que o processo já tem até condenação, seria o caso de abrir outro sobre o mesmo
fato? Dá a impressão de que não se apurou direito." Ele disse que Valério
pode ser beneficiado com reduções de penas em outras ações contra ele, se
colaborar com as investigações.
O empresário de Belo Horizonte responde a dezenas de processos, entre eles o
de participação no chamado mensalão mineiro.
Fonte: O Estado de S. Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário