Dez anos de propina ao PT
• Delator diz que, de 2003 a 2013, partido recebeu até us$ 200 milhões desviados de contratos
Cleide Carvalho*, Renato Onofre e Andressa Maltaca** - O Globo
CURITIBA e SÃO PAULO - Às vésperas de completar 35 anos, o PT foi acusado de ter recebido entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões (entre R$ 400 milhões e R$ 540 milhões) em propinas derivadas de 87 contratos da Petrobras e viu o tesoureiro da legenda, João Vaccari Neto, ser levado ontem por policiais para depor na sede da Polícia Federal, em São Paulo. A acusação contra o PT faz parte da delação premiada de Pedro Barusco Filho, ex-gerente executivo da Petrobras e principal auxiliar do ex-diretor de Serviços Renato Duque, apontado como um dos arrecadadores de propina junto às empreiteiras que fechavam negócios com a estatal.
Do dinheiro desviado para o PT, entre 2003 e 2013, segundo Barusco, pelo menos US$ 50 milhões (cerca de R$ 135 milhões) passaram pelas mãos de Vaccari. Pelo menos quatro diretorias da estatal (Abastecimento, Serviços, Internacional e Gás e Energia) faziam parte do esquema. Foi com base no depoimento do ex-gerente, que a Polícia Federa realizou ontem a nona etapa da Operação Lava-Jato, apelidada de My Way - como Barusco chamava Duque.
A delação detalhou a repartição da propina. Barusco disse que, nos contratos da Diretoria de Abastecimento, a propina era de 2%, sendo que o ex-diretor da área Paulo Roberto Costa ficava com 1% e o PT, com 1%. Na parcela que cabia ao partido, Vaccari controlava 0,5% e a "casa", representada por Duque, com o restante. Em um dos depoimentos, em 24 de novembro, Barusco disse que os ex-diretores da Petrobras Jorge Luiz Zelada e Roberto Gonçalves chegaram a receber propina.
Barusco devolverá US$ 67,5 milhões
O depoimento de Barusco envolveu a Diretoria de Gás e Energia, onde, segundo ele, também havia um esquema de pagamento de propina. A diretoria já foi ocupada por Ildo Sauer e Graça Foster, que hoje deixa a presidência da estatal. Barusco, no entanto, disse que Graça e Sauer não sabiam das fraudes.
- Não tinha espaço para conversar essas coisas com Ildo Sauer e com Graça Foster - afirmou: - Se sabiam, conservaram isso para si.
Pelo acordo de delação, Barusco terá de devolver US$ 67,5 milhões (R$ 490 milhões). Desse montante, US$ 6 milhões estão depositados em uma offshore em nome de sua mulher, Luciana Adriano Franco. Ele terá ainda de pagar uma multa de R$ 3,25 milhões. Barusco não cumprirá prisão em regime fechado. Segundo a Justiça, qualquer pena restritiva será revertida em dois anos de regime aberto diferenciado: ele não poderá ficar na rua de 20h às 6h, nem durante os fins de semana.
Na nova fase da Lava-Jato, a Justiça expediu 62 mandados, incluindo três prisões temporárias e uma preventiva, 40 de busca e apreensão e 18 conduções coercitivas. O foco da nova investigação é a BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, onde o esquema criminoso também ocorria. Na BR, porém, 11 operadores teriam sido responsáveis pela negociação de propinas, enquanto na Petrobras o esquema tinha um protagonista: o doleiro Alberto Youssef.
Propina na construção de navios
O procurador federal Carlos Fernando Lima disse que os investigadores querem que Vaccari fale sobre as denúncias e pedidos de doação, legais e ilegais, feitos a fornecedores da Petrobras.
Segundo Barusco, Vaccari participava de acertos entre funcionários da estatal e de estaleiros nacionais e internacionais relativos a 21 contratos para construção de navios equipados com sondas. Essas contratações envolveram cerca de US$ 22 bilhões (R$ 59 bilhões).
"Essa combinação envolveu o tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, João Vaccari Neto, o declarante (Barusco) e os agentes de cada um dos estaleiros, que deveria ser distribuído o percentual de 1%, posteriormente para 0,9%, conta Barusco na delação premiada".
Na negociação com os estaleiros, disse Barusco, o tesoureiro do PT já havia recebido US$ 4,52 milhões só de um deles. Segundo o delator, Vaccari era identificado numa tabela de pagamento de valores pela sigla "Moch", abreviatura de "mochila", porque "o declarante quase sempre presenciava João Vaccari Neto usando uma mochila".
Encontros em hotéis do Rio e de SP
Barusco disse que Vaccari era próximo de Duque e que os dois se reuniam em hotéis do Rio e de São Paulo para discutir o andamento dos contratos e cobrança de propinas. E contou que Vaccari ainda negociava com empresas.
Outro que também cobraria propina era Jorge Zelada, que foi gerente da área de Serviços e, depois, diretor da área Internacional. Barusco disse que, eventualmente, ele recebia parte do dinheiro pago a Duque e, em contratos de menor monta, cobrava a propina da empresa contratada. Barusco detalhou a divisão do dinheiro na área de Serviços: Duque ficava com 60% e Barusco, com 40%. Quando o negócio era intermediado por um operador o percentual mudava: 40% para Duque, 30% para Barusco e 30% para o operador. Cada empreiteira do cartel tinha um Operador . (*Enviada especial;*Especial para O GLOBO)
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