De exagero em exagero, de provocação em provocação, de rompante em rompante, assume contornos lamentáveis a contenda que opõe o presidente Michel Temer (PMDB) e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Por certo, não esteve sempre isento de reparos o comportamento de Janot na sua desassombrada —e necessária— atuação para levar a julgamento altas autoridades políticas suspeitas de corrupção.
Tem sido exagerado, por exemplo, o entendimento corrente na Procuradoria-Geral da República quanto ao conceito de obstrução de Justiça. Tendem a ser consideradas criminosas as tratativas entre membros do Legislativo para modificações —corretas ou não, pouco importa— no Código Penal.
Também o acordo de delação em benefício do dono da JBS, Joesley Batista, foi de molde a suscitar estranhamento, com tão generosa compensação prestada a quem se dispôs a incriminar, de modo persuasivo, mas não cabal, o presidente da República.
Por vezes, o procurador-geral excede-se ao acompanhar de formulações indevidamente belicosas sua disposição para cumprir as funções do cargo. Foi o que aconteceu em sua célebre promessa segundo a qual "enquanto houver bambu, lá vai flecha".
Nada disso justifica, entretanto, as destemperadas manifestações que Gilmar Mendes tem prodigalizado nos últimos tempos.
"O procurador mais desqualificado" da história, sem "preparo jurídico nem emocional" para ocupar o cargo: assim Gilmar Mendes caracterizou Janot, não sem antes ter dado repetidos sinais de alinhamento com os pontos de vista do Palácio do Planalto.
Talvez estimulada por esse clima, em que a caça às bruxas parece agora se dar com papéis invertidos, a defesa do presidente Temer toma a iniciativa de pedir a suspeição de Janot ao Supremo Tribunal Federal, por alegada "obsessiva conduta persecutória".
Impressiona que os protagonistas dessa ofensiva não se tenham dado conta de que com isso reproduziam —o que no mínimo constitui equívoco sob o prisma político— as ineficazes providências intentadas contra o juiz Sergio Moro pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Enquanto isso, noticiam-se encontros entre Temer e Gilmar Mendes, ou entre o presidente da República e a futura procuradora-geral, Raquel Dodge. A discrição de tais conversas se alia aos excessos públicos para produzir um mesmo efeito: o sentimento de que, mais uma vez, pretende-se "estancar a sangria" iniciada com a Lava Jato.
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