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Polícia politizada: Editorial / Folha de S. Paulo
Forças de segurança dão mostras de truculência contra atos de tom oposicionista
Não é novidade que setores das polícias ignoram em certas ocasiões as regras do Estado de Direito e cometem arbitrariedades.
Embora não seja, obviamente, o único país do mundo a enfrentar esse tipo de desvio, sabe-se que o Brasil convive com preocupante histórico de excessos das forças de segurança, não raro voltados contra populações vulneráveis.
Mais recentemente, tem se notado a extensão inquietante de atitudes abusivas a situações relacionadas à liberdade de expressão e manifestação política.
O caso mais rumoroso, ocorrido no domingo (4), foi a retirada de um torcedor de futebol da arquibancada da arena do Corinthians, em Itaquera, por gritar termos chulos ao presidente Jair Bolsonaro (PSL), presente à partida.
A alegação da PM, de que a atitude poderia gerar reações de partidários do presidente e causar tumulto, é excêntrica. Não se discute que torcedores muitas vezes incentivam conflitos, mas é impensável que todo tipo de diatribe emitida por um indivíduo num estádio se converta em caso de polícia.
O episódio revelou-se ainda mais grave pelo fato de o torcedor ter relatado maus tratos por parte dos agentes, que só o liberaram dez minutos antes do final do espetáculo.
Acertou o clube ao divulgar nota na qual “reitera seu compromisso com a democracia e a defesa do direito constitucional de livre manifestação” —e lembra que presidentes da agremiação foram alvos de manifestações de torcedores, aceitáveis se não forem violentas.
Um dia antes, no sábado (3), também em São Paulo, dois policiais militares abordaram militantes do PSOL, partido de oposição ao presidente Bolsonaro e ao governador João Doria (PSDB), num encontro de mulheres da sigla, na sede do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal.
Sem nenhum amparo legal, um homem e uma mulher da PM entraram no local e pediram documentos e nomes dos presentes. Ao ser contestada, a policial respondeu que já possuía todas as informações sobre o evento —um encontro banal e legítimo de militantes.
No dia 23 de julho, três agentes da Polícia Rodoviária Federaladentraram a sede do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado do Amazonas (Sinteam), em Manaus, para, ao que parece, intimidar ativistas que organizavam um protesto contra Bolsonaro, então prestes a visitar a cidade.
Tais exibições de truculência apontam, sobretudo, uma inadmissível politização em decisões de agentes públicos que deveriam zelar pela impessoalidade e pelas garantias constitucionais.
Não há como ignorar a correlação entre esses desvios e a retórica beligerante e irresponsável de autoridades como governadores e, claro, o presidente da República.
Capricho infantil: Editorial / O Estado de S. Paulo
O presidente Jair Bolsonaro não poderia ter sido mais claro ao revelar o sentimento que o animou a assinar a Medida Provisória (MP) 892/2019, publicada no Diário Oficial da União no dia 5 passado. A medida, que dispensa as empresas de capital aberto de publicarem suas demonstrações financeiras em jornais de grande circulação – bastando a publicação dos balanços no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) –, foi a “retribuição” do presidente ao tratamento supostamente hostil que ele diz receber da imprensa desde a campanha eleitoral.
“(Fui eleito) sem televisão, sem tempo de partido, sem recursos, com quase toda a mídia o tempo todo esculachando a gente. (Chamavam-me de) Racista, fascista e seja lá o que for. No dia de ontem, retribuí parte daquilo (com) que grande parte da mídia me atacou”, disse Bolsonaro durante a cerimônia de inauguração de uma fábrica de medicamentos em Itapira (SP).
É importante que se diga de pronto que nada há de errado na propositura de uma alteração do dispositivo da Lei 4.404/1976 – a Lei das Sociedades Anônimas – que determina que a publicação dos balanços das empresas de capital aberto seja feita “no órgão oficial da União ou do Estado ou do Distrito Federal, conforme o lugar onde esteja situada a sede da companhia, e em outro jornal de grande circulação”. Evidente que cabe discutir a pertinência desta exigência legal quase no fim da segunda década do século 21. Há alguns anos, aliás, as próprias empresas de comunicação têm pensado em soluções tecnológicas para continuar levando informação ao público por meios outros que não a impressão em papel.
Entretanto, a MP assinada pelo presidente Bolsonaro, tal como foi concebida, não é uma medida de natureza progressista e liberal. Longe disso. Trata-se de uma agressão frontal à liberdade e à independência da imprensa por meio da constrição abrupta de suas receitas, meta que os ex-presidentes Lula da Silva e Dilma Rousseff sempre ameaçaram alcançar, mas jamais tiveram a ousadia de levar a cabo.
Movido por um misto de ignorância do papel do jornalismo nas sociedades democráticas, inaptidão para o cargo e rancor pela legítima fiscalização do exercício do poder pela imprensa – tomada como um gesto de hostilidade pessoal –, Jair Bolsonaro mira nos grandes veículos de comunicação, como se pôde ver no regozijo irônico com que anunciou a medida, mas acabará por fechar jornais regionais que têm na receita advinda da publicação dos balanços empresariais uma de suas mais importantes fontes de financiamento.
Exatamente por esta razão, o Congresso Nacional teve o cuidado de prever na Lei 13.818/2019, aprovada em abril, um período de transição para o novo modelo de publicação das demonstrações financeiras por meio eletrônico. De acordo com o referido diploma legal, os jornais teriam até o dia 1.° de janeiro de 2022 para se preparar para a mudança. O tempo seria suficiente para que as empresas jornalísticas buscassem fontes alternativas de receita no mercado.
Ao editar a MP 892 apenas três meses após a aprovação de uma lei sancionada por ele, Jair Bolsonaro avilta a Constituição e o Congresso, posto que a medida provisória em questão não preenche os requisitos essenciais de urgência e relevância. O Congresso dará um exemplo de correção e de respeito às liberdades se devolver a MP 892 ao Planalto, impondo a seus signatários um período de reflexão sobre os alicerces e os limites do poder.
O presidente Jair Bolsonaro não tolera a imprensa independente porque não é capaz de controlá-la. Em sua história de 144 anos, não foram poucas as tentativas de calar O Estado de S. Paulo com ações semelhantes às dele. Porém, ao contrário do que pode pensar o presidente da República, os grandes veículos de comunicação não dependem da chamada publicidade oficial. Não irão falir pela ação da caneta presidencial e continuarão a publicar o que for de interesse público. As vítimas da retaliação ignóbil serão pequenos e médios jornais e as populações de suas cidades, que deixarão de ter poderosas fontes de informação e de fortalecimento dos laços comunitários.
Lei de recuperação judicial pode agora ser aperfeiçoada: Editorial / Valor Econômico
Até o fim do mês será apresentado ao Congresso uma nova proposta de alteração da Lei de Recuperação Judicial e Falência. Modernizar essa legislação é uma das medidas que o governo pretende implementar para que a atividade volte a deslanchar. Embora não influencie diretamente o crescimento, faz parte de um arcabouço que azeita as relações econômicas.
A Lei de Recuperação Judicial e Falência é relativamente recente, entrou em vigor em 2005 para substituir a antiga Lei da Concordata, que prevaleceu por mais de seis décadas. Mas já exige aperfeiçoamentos, apontados pela experiência. As mudanças interessam a mais de 6 mil empresas que pediram recuperação judicial nos últimos tempos, com dívidas estimadas em R$ 300 bilhões. O número cresceu vertiginosamente na segunda metade desta década, em consequência do desaquecimento econômico.
Os pedidos de recuperação judicial somaram 1.287 em 2015, de acordo com levantamento da Serasa Experien. Saltaram para 1.863 em 2016, e estabilizaram em níveis elevados de 1.420 em 2017 e em 1.408 em 2018, quando a economia ensaiava uma recuperação. No primeiro semestre deste ano, os pedidos de recuperação judicial somaram 618. Nos últimos meses, a lista foi engordada por empresas importantes e tradicionais, como a Odebrecht, Projeto Jari, Avianca Brasil, Saraiva e Bardella.
O governo de Michel Temer chegou a tentar reformular a Lei de Recuperação Judicial, com o Projeto de Lei 10.220, enviado ao Congresso em regime de urgência, em maio de 2018. O projeto não foi em frente. A saída de Henrique Meirelles do Ministério da Fazenda para disputar a Presidência da República foi um dos fatores que esvaziou a defesa da mudança de regras. A própria disputa eleitoral foi outro motivo. Mas o principal problema era o texto em si que despertou críticas do mercado. A versão final ficou muito diferente da proposta inicial e não teve apoio dos próprios advogados que participaram da sua formulação.
Uma das principais críticas era a autorização dada ao Fisco para pedir a falência de empresas que devem tributos. Geralmente as companhias em dificuldades procuram manter alguns compromissos em dia, como o pagamento dos salários dos funcionários e as dívidas com os fornecedores, para tentar seguir em funcionamento, deixando para depois os tributos. Atualmente, a Fazenda não participa do processo de recuperação judicial e, pela lei em vigor, também não pode pedir falência. O que pode fazer é ajuizar ações de execução e, consequentemente, penhorar bens do devedor. A proposta de Temer mudava esse quadro e acreditava-se que as empresas em recuperação judicial teriam mais chances de quebrar do que sobreviver se a proposta fosse aprovada.
A saída encontrada passa pelo envio ao Congresso de uma sugestão de alteração do PL 10.220, que será apresentada pelo deputado Hugo Leal (PSD-RJ) ainda neste mês. A intenção é que a proposta seja mais enxuta, menos ambiciosa e agilize o processo antecedendo o encaminhamento por um amplo debate para remover focos de resistência.
De acordo com a minuta obtida pelo Valor (2/8), um dos principais pontos do novo texto é estabelecer condições especiais para quitar os compromissos com a Fazenda . Assim, as empresas em recuperação poderão parcelar os pagamentos em até 120 meses e ainda usar créditos tributários para abater parte do débito, além de negociar os valores inscritos na dívida ativa com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Um pleito antigo é atendido ao regular o financiamento da empresa em recuperação, viabilizando o mecanismo conhecido no mercado como "dip financing", que dá ao credor garantias extras, como o direito a ser o primeiro a receber em caso de falência.
Há ainda a intenção de incluir na legislação a previsão da falência transnacional, seguindo o modelo da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional, que vai permitir a cooperação entre juízes brasileiros e estrangeiros, tendo como efeito prático alcançar o patrimônio que a empresa em recuperação ou falência tem fora do país. O projeto prevê acelerar os processos de falência, que hoje podem levar décadas. Mas um ponto muito questionado não é contemplado - o fim da alienação fiduciária de bens, geralmente em favor de bancos, até o pagamento total da dívida.
Seja qual for a configuração final do projeto, é elogiável a busca de um consenso para a efetiva recuperação da empresa, no menor tempo possível, para que volte a produzir, criar empregos, gerar riqueza e recolher impostos.
Segundo turno da reforma é fato inédito: Editorial / O Globo
Nunca mudanças tão profundas na Previdência conseguiram tramitar com algum êxito no Congresso
A aprovação em segundo turno pela Câmara do textobase da reforma da Previdência é inédita. Pois jamais alterações de alguma profundidade no sistema previdenciário foram aceitas pelo Congresso.
Nas tentativas feitas — com graus diferentes de abrangência —, nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), de Lula e de Dilma Rousseff (os dois do PT) , não havia na classe política tanta consciência dos efeitos deletérios de uma grave crise fiscal como a que o país vive, de forma mais visível, desde 2013/14. Nas gestões petistas, acrescentava-se a rejeição ideológica a qualquer corte de gastos.
Ainda havia espaço de trânsito fácil na classe política da ideia de que bastaria aumentar gastos públicos para se gerar crescimento. Algo derivado de teses de Keynes mal digeridas.
Infelizmente, foi necessária amais profunda e longa crise de que se tem notícia—agravada com a política do “pé no acelerador” executada pela dupla
Lula-Dilma — para políticos pelos menos intuírem que não há saída fácil para um desequilíbrio tão grave e extenso como o que o país vive.
Déficits primários (excluindo o pagamento de juros) começaram a ser acumula dosem 2014, e isso continuará por pelo menos mais dois anos. Assim, a dívida pública disparou de 50% para quase 80% do PIB, marca que deve ser ultrapassada até que esta e outras reformas surtam efeito, a economia volte a se mover e consequentemente a arrecadação tributária suba.
Também teve papel pedagógico o fato de uma inflação quase sempre de um dígito não poder mascarar as perdas fiscais, oque obriga a Federação ase ajustar. Mesmo contra os pendores dos políticos populistas, de esquerda e de direita.
Na segunda votação do texto da reforma na Câmara, o projeto teve 370 votos a favor, nove amenos que o placard o primeiro turno, mas ainda muito acimado mínimo necessário à aprovação na Câmara de uma emenda constitucional, 308 votos.
A Câmara iniciou ontem à tarde a votação dos destaques feitos pela oposição, na tentativa de desidratara reforma. Um dos mais importantes, apresentado pelo PCdoB, visava a derrubar do projeto as novas regras da concessão de pensão por morte.
Como todo o sistema previdenciário, este benefício tem regras irreais, distantes da realidade brasileira. Esta pensão representa um gasto de 3% do PIB, enquanto no conjunto dos países mais ricos, com representação na OCDE, é de 1%. O ajuste nas regras foi mantido por 339 votos contra 153. Outro indicador de maturidade de políticos.
No Senado, para onde o projeto irá, a ser submetido também a dois turnos de votação, será importante a formulação de uma proposta de emenda constitucional, a “PEC paralela”, a fim de estendera reforma a estados e municípios, o que foi impossível na Câmara. A fórmula garante que o que já for aprovado seja sancionado.
Sema ampliação da reforma aos estados e municípios, a crise fiscal persistirá.
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