- Folha de S. Paulo
Apesar da clareza do que está na Constituição, a censura nunca deixou de dar as caras
"A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição". Reconheceu? É o caput do artigo 220 da Constituição. Difícil até imaginar texto mais vigoroso e claro do que esse.
Apesar da veemência do constituinte, a censura nunca deixou de dar as caras. O caso mais recente é o da presidente da Câmara de Porto Alegre, Mônica Leal, que mandou recolher uma exposição de charges críticas a Jair Bolsonaro que acontecia nas dependências da Casa. O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, também tentou banir um gibi da Bienal esta semana, mas foi felizmente ignorado.
Se ainda houver juízes em Porto Alegre, a decisão da vereadora será revertida, dirá o leitor esperançoso. Talvez não. A cadeira de magistrado não é garantia de comportamento iluminista. Em abril, Alexandre de Moraes, do STF, determinou que dois sites retirassem do ar textos com menções ao presidente da corte, Dias Toffoli. Como as notas só reproduziam o que está nos autos da Lava Jato, Moraes conseguiu a façanha de censurar a própria Justiça.
Precisamos é dar força a instituições que pugnem pela liberdade de expressão, dirá o indignado leitor. Não discordo, mas receio que o buraco seja mais fundo. Alguns anos atrás, a OAB-SP, que deveria estar na linha de frente da defesa do Estado de Direito, pediu que obras do artista plástico Gil Vicente, que simulavam o assassinato de autoridades, fossem excluídas da 29ª Bienal.
Se nem aqueles que deveriam saber o que fazem resistem a uma censurazinha que seja de seu agrado, não surpreende que as atitudes da população também se revelem esquisitas. Como mostrou o Datafolha, nada menos do que 45% dos brasileiros acham que cabe ao presidente aprovar pessoalmente filmes e espetáculos feitos com apoio de leis de incentivo. Um derrotista diria que cada povo tem o governante que merece.
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