Folha de S. Paulo
Três explicações sobre o impacto da
pandemia sobre os governos
Há três explicações rivais sobre o impacto
da pandemia sobre a política. Na primeira, a expectativa é que os governantes
se beneficiem; na segunda, que tenham perdas; na terceira, o resultado seria
condicional.
A primeira das explicações é corolário da
tese de que situações excepcionais —guerras, terremotos— produzem incentivos à
cooperação, com os governantes visando um bem coletivo maior. Esse resultado,
conhecido na literatura como "rally round the flag" (todos em volta
da bandeira), no entanto, apresenta pouco poder explicativo para a longa pandemia da
Covid. O efeito previsto tende a ser de curto prazo, o que já foi
detectado em várias
pesquisas. Bolsonaro foi um dos poucos que não se beneficiaram
no curto prazo.
A segunda explicação é que calamidades impactam negativamente a avaliação de governantes mesmo quando não seja razoável lhes atribuir responsabilidades por elas. A análise clássica da literatura é o efeito dos ataques de tubarões nas eleições presidenciais de 2016 em Nova Jersey, nos EUA. O eleitorado parecia punir os seus representantes em um movimento de "responsabilização cega".
Há aqui dois mecanismos: após eventos
negativos, as pessoas podem atribuir suas emoções negativas ao incumbentes e/ou
tendem a se lembrar de ações positivas (negativas) apenas quando experimentam emoções
positivas (negativas). Nessa perspectiva, a popularidade declinante de
Bolsonaro seria esperada. No entanto, durante a pandemia ela oscilou (caiu,
subiu e declinou).
A terceira explicação é que, após eventos
negativos, o eleitorado tende a punir governantes com mais frequência porque
tais eventos abrem uma janela de atenção em relação a seu desempenho. A punição
tem assim base racional e não aleatória (cega). O eleitor médio tipicamente não
presta atenção à política e por isso deixa de puni-lo(a)s ou premiá-lo(a)s
pelo desempenho.
A pandemia joga luz sobre as ações dos
governantes, que revelam quem na verdade são. Os governantes/representantes que
tiverem bom (mau) desempenho serão premiados (punidos) com mais intensidade do
que em situações normais.
A nossa experiência é consistente com esta
explicação: a resposta inicial patética de Bolsonaro ("gripezinha")
levou à inesperada queda de sua popularidade (a expectativa era de união em
torno da bandeira). A nação descobriu perplexa o mandatário insensível e
irresponsável. O auxílio emergencial fez com que fosse descoberto pela
população de baixa renda, alavancando sua popularidade. Mas a gestão da vacina
no auge da segunda onda mostrou-se desastrosa: o país vê-se em guerra sem
general, revertendo a tendência anterior. O desempenho move o eleitorado.
*Professor da Universidade Federal de
Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA)
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