O Estado de S. Paulo
Decisões monocráticas, como as de Toffoli,
geram desencantamento político e desconfiança nas instituições
O mal-estar social e a desconfiança gerados pela atuação individual de ministros podem pavimentar o terreno para emergência de novas saídas populistas de perfil extremista
O Ministro do STF, Dias Toffoli, decidiu, de forma
monocrática, pela “nulidade absoluta” de todos os atos
processuais praticados contra Marcelo Odebrecht no âmbito da
Operação Lava Jato.
Se baseou em gravações hackeadas de conversas do então juiz Sérgio Moro com os procuradores da Lava Jato que, segundo Toffoli, atuaram em conluio ignorando o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa do acusado, ao misturar a função de acusação com a de julgar.
Não cabe aqui fazer julgamentos normativos
sobre o mérito da decisão do Ministro, mas questionar suas potenciais
consequências políticas.
A Suprema Corte, por ser independente, não
teria que tomar suas decisões levando em consideração as preferências e humores
da opinião pública. Mas, como Marcelo Odebrecht era réu confesso, que não
apenas reconheceu seus inúmeros crimes, mas concordou em devolver cerca de 2,7
bilhões em acordo de delação premiada homologado pelo próprio Supremo, o que
fica no imaginário popular é que a decisão individual de um Ministro foi uma reação à luta contra a corrupção. Mesmo o mais ferrenho
dos “anti-lavajatistas” deve achar essa decisão no mínimo inusitada.
Decisões controversas desta magnitude e, mais
ainda, fruto de mudanças sucessivas de entendimento da Corte, muitas vezes a
partir de decisões monocráticas de seus ministros sobre o mesmo tema, podem ter
um efeito político devastador.
Por mais que possam existir ressalvas e que
se considere que houve excesso aqui ou acolá de ações coordenadas entre agentes
de Justiça da Lava Jato, essa decisão tenderá a ser percebida pela população
como uma negação pelo Supremo de que existiu um “cartel de empreiteiras” que
implementava há anos esquemas bilionários de corrupção.
É como se o Supremo estivesse cavando a perda
de sua própria legitimidade perante os cidadãos. É reforçar preconceitos que a
população já tem contra a política e suas instituições. É estimular uma espécie
de cinismo cívico, em que o “vale-tudo” interpretativo é possível.
E o pior, o mal-estar social e o pessimismo
generalizado gerados por decisões monocráticas, como a de Toffoli, podem
pavimentar o terreno para emergência de novas saídas populistas de perfil
extremista. A desesperança na política faz com que as pessoas confiem mais em
saídas individuais e não institucionais.
É importante lembrar, que o Brasil acaba de se livrar de forte ameaça populista à sua
democracia. O risco é que mudanças frequentes de entendimento do STF via
atuação individual de seus ministros possam nos recolocar na rota do populismo.
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