O Globo
Com a autonomia garantida por lei aprovada no Congresso, de nada adianta Lula apertar paternalmente as mãos de Galipolo e garantir-lhe liberdade de ação. Não é uma concessão de Lula essa liberdade, mas uma conquista do Banco Central brasileiro que garante sua independência
O novo presidente do Banco Central, Gabriel
Galipolo, está cercado pela tentativa do PT de fazê-lo parte integrante do
governo, enquanto afirmam que ele terá garantida sua autonomia. Só essa
garantia, partida de ninguém menos do que o presidente Lula, já mostra como
veem o papel do BC na economia brasileira. Com a autonomia garantida por lei
aprovada no Congresso, de nada adianta Lula apertar paternalmente as mãos de
Galipolo e garantir-lhe liberdade de ação. Não é uma concessão de Lula essa
liberdade, mas uma conquista do Banco Central brasileiro que garante sua
independência.
Justamente para que o governo do momento não tenha condições de tentar manipular a taxa de juros. Os recentes aumentos da taxa foram decididos por unanimidade pela diretoria do Banco Central, que tem diretores já nomeados por Lula, inclusive Galipolo, que trabalhava com Fernando Haddad antes de ser nomeado. Esses fatos indicam que forçar uma queda de juros sem que existam condições técnicas para tal não terá respaldo nessa diretoria.
Tampouco Lula terá a ajuda de um presidente
como foi Tombini na época da então presidente Dilma. A queda dos juros não
chegará tão cedo, pois a subida de mais 2 pontos percentuais nas próximas duas
primeiras reuniões da diretoria do BC no ano que vem foi reafirmada pelo novo
presidente - interino até janeiro, e permanente por quatro anos em 2025. Caberá
ao governo tomar atitudes que convençam o mercado financeiro, daqui e do
exterior, de que está empenhado em cortar os gastos para equilibrar financeiramente
o governo.
Atitudes titubeantes como as que vêm sendo
assumidas não farão com que os juros possam cair, nem o dólar. Os elogios dos
petistas são constrangedores, pois pressupõem que Galipolo está na presidência
do Banco Central para ajudar o governo, ou então soam como recados de
governistas, o que indica que nenhum dos elogiadores acredita que o ex-assessor
de Haddad pretenda ser independente. O futuro líder do governo, deputado
Lindbergh Farias, chegou a dizer que acredita que Galipolo terá todas as
condições de baixar os juros, como se sua função no BC não fosse controlar a
inflação.
O novo presidente do BC já mostrou a que veio
ao desmentir a versão governista de que houve um ataque especulativo ao dólar
com base em uma ação política para enfraquecer o governo. Até a Advocacia-Geral
da União (AGU) foi mobilizada para investigar a suposta ação dos especuladores
que, além do mais, se existem nesse caso, fazem parte do jogo do capitalismo. O
governo que trate de reforçar suas ações, e uniformizar seu comportamento, para
mostrar que está no rumo de cumprir o compromisso de equilibrar as finanças
públicas.
O momento econômico é sem dúvida bom, embora
a inflação esteja sob controle, mas, em viés de alta. Seria aliás um ótimo
momento para o governo promover reformas fortes, que teriam repercussão antes
mesmo do ano eleitoral de 2026. Ao adiar as medidas mais radicais de corte de
gastos, o governo submeteu ao Congresso um pacote fiscal insuficiente, o que
deu margem a que os parlamentares também se sentissem à vontade para defender
seus interesses, desidratando as propostas.
O corte aprovado já chega com a previsão de
que será necessário aprofundá-lo mais adiante, o que dá a sensação de que as
medidas necessárias serão retardadas até quando der. Não há, desse jeito, como
acalmar o mercado financeiro, que teme uma debacle no futuro próximo. A
diferença entre o Lula atual e o que assumiu o governo em 2003 é que hoje o
presidente, em seu terceiro mandato, não parece disposto a encarar uma reforma
econômica que implantou com sucesso no primeiro governo. O mercado financeiro
continua desconfiando de Lula, como desconfiou quando venceu sua primeira
eleição presidencial. Nesse terceiro mandato, Lula teve a confiança do mercado
até recentemente, com a lembrança da postura em 2003. Mas parece que Lula não
lembra mais.
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