quinta-feira, 1 de março de 2018

*Marco Aurélio Nogueira: O “golpe” como disciplina universitária

Muito barulho nas redes e nos corredores universitários por causa da manifestação do ministro da Educação, Mendonça Filho, contestando o oferecimento, na Universidade de Brasília, de uma disciplina escolar sobre o impeachment de Dilma Rousseff.

Em solidariedade, professores de outras instituições acadêmicas (Unicamp e Federal da Bahia) propuseram-se a seguir o exemplo da UnB.

Surpreende que tanto alvoroço esteja sendo criado em torno de um fato corriqueiro.

Não é de hoje que as faculdades de Humanas vivem às voltas com a questão de definir que conteúdo programático oferecer aos estudantes. Sempre há controvérsias. As disciplinas das diferentes áreas de conhecimento estão mergulhadas nos embates políticos e ideológicos da época e nas pulsões a ela correspondentes, cabendo aos professores zelar tanto pela liberdade de cátedra quanto pelo rigor teórico e conceitual. Uma sala de aula não pode ser tribuna para a apresentação categórica das preferências ou idiossincrasias filosóficas do professor, nem muito menos espaço para a defesa militante de interesses políticos ou partidários.

A questão é tão complicada que sempre se recorre àquilo que o sociólogo alemão Max Weber chamava de “liberdade em relação aos valores”, procedimento também chamado de “neutralidade axiológica”. Com isso, Weber pretendia demonstrar que não há como excluir os valores do trabalho científico ou docente mas, por isso mesmo, é preciso manter certo controle sobre eles, para que o conhecimento não seja indevidamente invadido por considerações de ordem política ou moral. Tudo depende sempre de escolhas valorativas e opções subjetivas, que precisam ser adequadamente integradas ao processo científico. Não há “imparcialidade” absoluta e tudo passa por uma relação dinâmica com os diferentes pontos de vista que coexistem na sociedade e na época. Não se trata de encontrar um “compromisso” entre tais pontos de vista antagônicos, que lutam entre si, mas de centrar o foco na descoberta da verdade, fim último da ciência.

É uma discussão complexa, difícil.

Diferentemente do que ocorre no ensino fundamental e médio, na universidade o risco de “doutrinação” é pequeno, pois os alunos já têm ideias próprias e sabem se proteger. Mas o proselitismo corre solto. É parte do jogo, gostemos ou não.

O professor não pode agir como porta-voz de grupos, partidos ou movimentos, ainda que deva se apresentar por inteiro, desde logo e com suas convicções. Não tem o direito de fazer de sua cátedra uma correia de transmissão de “verdades discutíveis” ou uma caixa de ressonância daquilo que considera serem as “injustiças do mundo” ou o “clamor popular”. Sua obrigação é oferecer análises criteriosas que mostrem as implicações fundamentais, as determinações e os conceitos com que podem ser examinados os temas. Precisa saber equilibrar convicção e responsabilidade. Sua missão é disseminar serenidade e ponderação, não conclamar os estudantes ao “engajamento político”. Ele não é um prosélito, nem um agitador.

Cristovam Buarque: Liberdade acadêmica plena

- Correio Braziliense

Ao manifestar preocupação com a disciplina “O Golpe de 2016 e o futuro da Democracia no Brasil”, prevista para a Universidade de Brasília (UnB), o ministro da Educação comete graves erros. Primeiro, porque seu papel é zelar pela liberdade acadêmica e sua intervenção não consideraria isso. Cabe aos órgãos colegiados alertar para os casos em que algum curso seja usado para a promoção de crime ou preconceitos. No caso dessa disciplina, trata-se de uma interpretação que o professor tem direito de oferecer ao definir os impeachments como golpe.

Errou também ao não perceber que, de fato, é possível essa categorização. Apesar de todo o rigoroso rito jurídico que foi seguido ao longo de 180 dias de julgamento dentro das normas constitucionais, há possibilidade acadêmica de dar essa interpretação. No caso do impeachment contra o Collor, a denominação de golpe é ainda mais plausível, porque ele não foi acusado de crime contra a Constituição.

Já Dilma foi acusada de ferir o artigo 85 da Carta Magna que define o crime de responsabilidade. Além disso, no caso do Collor, ele teve seus direitos políticos cassados por oito anos, enquanto a ex-presidente manteve seus direitos integrais e pode ser candidata para voltar ao cargo de presidente ou a qualquer outro, em 2018, com o eleitor tendo na memória que ela teria sido vítima de golpe.

Mesmo assim, a expressão golpe pode ser usada nos casos de 2016 e de 1992. Muitos consideram que a Proclamação da República foi um golpe, porque dissolveu o Parlamento, rasgou a Constituição imperial e destituiu o imperador, acabando com a dinastia. A própria Lei Aurea, embora tenha seguido rigorosamente o processo legislativo, foi considerada como golpe por diversos parlamentares escravocratas, porque Joaquim Nabuco teria usado mecanismos para apressar o debate.

Da mesma forma, qualquer professor deve ter o direito de chamar de golpe a manifestação do processo eleitoral de 2014, que caracterizou um verdadeiro estelionato ao manipular preço de combustível, taxa de juros, subsídios para empresários. O mensalão do governo Lula ou do Temer também podem ser chamados de golpes. A corrupção é um golpe, sobretudo, no nível antipatriótico como foi feito com a Petrobras, a Eletrobras; os roubos de dinheiro dos fundos de pensão podem ser chamados de golpes contra a democracia e contra o povo e a nação.

Hubert Alquéres: A contemporaneidade de FHC

- Blog do Noblat

Fernando Henrique Cardoso é um dos poucos políticos brasileiros capaz de enxergar além do nevoeiro que turva nossos olhos

Odiado pelos extremos regressistas – e nem sempre compreendido por seus companheiros de partido – o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é um dos poucos políticos brasileiros capaz de enxergar além do nevoeiro que turva nossos olhos. Intelectual e político atento, é figura obrigatória a ser ouvida por quem quiser entender as intensas transformações que varrem o mundo.

Com esse propósito, na semana passada o movimento suprapartidário Roda Democrática promoveu um encontro com o ex-presidente. Fernando Henrique esbanjou vitalidade com analises precisas. Vejamos algumas.

A revolução tecnológica, com o advento da robótica e da inteligência artificial alterou as relações sociais no trabalho e o próprio modo de acumulação do capital. De um lado, “vem criando uma enorme massa de não empregáveis” e de outro, a acumulação do capital se desloca para as áreas que envolvem criatividade e para as das novas tecnologias, “de onde advém os novos milionários”.

Como dar dignidade às pessoas num quadro onde a “produtividade aumenta de forma cavalar e a tecnologia é concentradora de capital”? Mais: “como manter os não empregáveis e o que fazer com a hora desnecessária do trabalho?”

Segundo ele, esse processo levará ao aumento da desigualdade. No caso do Brasil diz, à desigualdade tradicional acrescenta-se a “desigualdade futura”, produto da Revolução 4.0. Tudo isso em um país que não cuidou da área da educação como deveria e também não acompanhou as mudanças na economia global. Resultado: perdeu protagonismo até mesmo na América do Sul.

Ao mesmo tempo, a sociedade fragmentou-se. “Em vez da velha divisão de classes de um mundo onde os partidos representavam determinados interesses, temos hoje uma sociedade dividida em questões identitárias”.

A partir daí faz uma pergunta inquietante: “como fazer política entre identidades diferentes” e que muitas vezes se fecham ao redor de si mesmas formando verdadeiros guetos?

Isto será possível por meio do diálogo e de ideias comuns que, transversalmente, permeiem toda a sociedade. Quais seriam elas? Do ponto de vista dos valores, além da “liberdade e igualdade, a dignidade, o respeito aos direitos humanos”.

Para além dos valores, FHC entende que é preciso reencantar a política, com ideias e pessoas concretas. Este seria o grande desafio de um “polo popular democrático e progressista” alternativo aos extremos.

Este polo, avalia, estará fadado ao fracasso se seu programa estiver voltado apenas para atender ao mercado. “É preciso olhar para o mercado, mas também para o estado e a sociedade. Se não olhar para a base, vai perder a eleição. Não é Lula que é forte no Nordeste. É a pobreza que é forte.” Este olhar se traduziria no tripé emprego-segurança-princípios éticos.

Aos 86 anos, Fernando Henrique chama atenção não apenas pela contemporaneidade de seu pensamento, mas também pelo seu realismo político: “temos de fulanizar as ideias e trabalhar com o que temos”. O recado está dado.
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Hubert Alquéres é professor e membro do Conselho Estadual de Educação (SP). Lecionou na Escola Politécnica da USP e no Colégio Bandeirantes e foi secretário-adjunto de Educação do Governo do Estado de São Paulo

Michel Temer: Ordem é progresso

- Folha de S. Paulo

A recessão será encerrada definitivamente nesta quinta, quando o IBGE divulgar o número do crescimento da economia

Estamos colocando o Brasil em ordem. Nos últimos 20 meses, enfrentamos sem medo os graves problemas que afligem nosso país.

A recuperação econômica, fruto de nossas medidas, está enfim se espraiando pelas várias atividades e ramos de negócio em todo o país.

Depois de controlarmos a inflação e os juros, que fecharam 2017 em queda recorde, colecionamos, já neste segundo mês de 2018, indicadores e sinais inequívocos de que a prosperidade se acelera.

O crescimento torna-se visível em todas as áreas, sobretudo na indústria, extrapolando em muito a cadeia do setor automotivo, que ostentou no ano passado um aumento de produção de mais de 25%. Os resultados positivos já atingem, de acordo com dados do IBGE, a maioria dos 93 segmentos industriais.

Segundo estimativa do mercado, com o PIB aumentando em 2,8%, serão criados neste ano 3 milhões de empregos, entre formais e informais. Irão se somar ao 1,8 milhão de novas vagas contabilizadas pelo IBGE no último trimestre de 2017. É um número expressivo e que tende a se acelerar com a nova lei trabalhista, em vigor há três meses.

Merval Pereira: Estruturando a Segurança

- O Globo

O ministro Raul Jungman vê a criação do ministério da Segurança Pública como um fato irreversível para o governo que venha a ser eleito em outubro, e, por isso, pretende dedicar-se a defender mudanças estruturais que, a seu ver, são necessárias para que a questão, que se tornou incontornável para o Estado brasileiro, seja enfrentada devidamente.

Ele lembra que os três centros de custo do Estado são justamente Saúde, Educação e Segurança, e apenas os dois primeiros, pelo menos, têm um piso constitucional de financiamento, enquanto a segurança, quando vem a crise financeira do Estado, não tendo essa proteção e nem mesmo uma definição de tarefas a nível nacional, acaba sendo afetada irremediavelmente.

Na sua análise, com a universalização pelo menos formal dos direitos do cidadão, “ou você tem segurança para todos ou não tem segurança”. Ele vê a necessidade de organizar um aparato público que possa de fato prover segurança a todos.

Quando o constituinte de 1988 separou a segurança nacional da segurança pública, alterando a visão que estava implantada pelo regime militar anterior, jogou nas costas dos estados a responsabilidade pela segurança pública, e nem mesmo os municípios, as capitais, os grandes centros urbanos, estão abrangidos nessa cobertura, quando é nelas que o crime se instala e se desenvolve.

Míriam Leitão: Encurralados

- O Globo

A entrevista do general Braga Netto é coisa de ditadura. Pedir pergunta antecipada e por escrito, limitá-las, não é a forma de comunicação democrática. Desse jeito não funciona, general. A intervenção federal é uma possibilidade de encontrar uma saída, mas os primeiros sinais são preocupantes. Não enfrentar a crise de segurança do Rio seria um erro porque a pressão da ditadura do tráfico piorou.

Tudo é mais complicado do que parece no Rio e no quadro da segurança do Brasil. Os protestos contra a intervenção têm razão em grande parte, principalmente porque alertam para a necessidade de precaução contra excessos. Há riscos e precedentes, mas as críticas pecam quando ignoram a atual realidade de quem vive encurralado entre o medo da tirania dos traficantes e o risco diário de violência na circulação pelo Rio de Janeiro. O general Braga Netto diz que é exagero da mídia, mas, num sinal de que não está à vontade no papel que exerce, se cerca dos seus colegas de farda, se fecha no mundo que entende e ao qual pertence. A cena dos três militares dando entrevista fardados parecia familiar aos mais velhos, como eu, mas podia ser apenas impressão. Afinal, as Forças Armadas têm um papel a exercer no Estado de Direito. A forma autoritária da entrevista, contudo, lembrava demais os velhos tempos.

O biombo de todos os presidentes anteriores na questão da Segurança Pública tem sido a Constituição. Ela entrega essa obrigação aos estados, exime os prefeitos, e os presidentes sempre atuaram nas crises se dizendo auxiliares dos governadores. Nada mais absurdo, principalmente agora que os principais crimes que se combate são federais. O presidente Michel Temer quer mostrar que mudou essa atitude, mas seu Plano Nacional de Segurança não saiu do papel, por que com o Ministério da Segurança seria diferente? Afinal, o nome completo do Ministério da Justiça incorporava esse assunto e tinha na sua alçada todos os órgãos que agora trocaram de ministro e de lugar na Esplanada. A torcida é para que o ministro Raul Jungmann encontre uma forma de coordenação com os estados e não use a “bomba atômica”.

Maria Cristina Fernandes: A intervenção da PF

- Valor Econômico

Ameaça de obstrução de justiça não esgota substituição

Está nas mãos da Associação Comercial do Rio um plano simples e barato para conter o crime organizado na cidade. O documento é uma contribuição voluntária de policiais federais aposentados. A corporação acumula desavenças históricas com as Forças Armadas no tema, mas coube a um ex-delegado da PF, José Mariano Beltrame, a condução daquele que foi, até aqui, o plano mais bem sucedido do Rio nesta área. Protagonista no combate à corrupção, a PF foi preterida por um governo que está no olho do furacão.

O documento converge com a tropa do general Braga Neto na percepção de que sem integração entre as forças policiais e de segurança não se vai a lugar algum, mas faz propostas ainda não contempladas naquilo que foi tornado público da intervenção militar.

A começar do efetivo policial. A ONU recomenda uma média de um policial militar para cada 450 habitantes. O Rio tem um para cada 355. Parece suficiente. Só que não. O interventor anunciou que já está em curso a volta de policiais cedidos a outros órgãos da administração. Mas a medida terá pouca eficácia se os policiais continuarem a cumprir dupla jornada.

O plano apresentado pelos ex-policiais federais prevê um regime de dedicação exclusiva para policiais civis e militares. Do jeito que está hoje, o emprego de policial no Rio virou um bico. Na melhor das hipóteses, os policiais trabalham em empresas de segurança privada ou delas são proprietários. São contratados por muitos dos sócios das associações comerciais. Na pior, são empregados e empresários do crime. Não é uma norma estadual que coibirá a segunda hipótese mas a existência de policiais que dormem na viatura ou largam missões mais longas para bater o ponto em outro serviço não é um bom começo.

*Roberto Macedo: Auxílio-moradia é aético e não democrático

- O Estado de S.Paulo

Quem deveria receber as ditas indenizações é a sociedade, que arca com o prejuízo

Os termos moral e ética costumam ser intercambiáveis em discussões sobre o “bem e o mal” ou o “certo e o errado”. Mas certa vez ouvi de um filósofo uma importante diferença entre os dois, a de que a moral é um filtro individual e, como tal, sujeita a crenças pessoais, influenciadas de várias formas, como a religiosa, a familiar ou mesmo as casuísticas e, acrescento, as interesseiras. Já a ética tem como parâmetro o bem comum, avaliado num contexto social.

No portal da Enciclopédia Britânica é dito que (tradução) “muitas pessoas pensam que a moralidade é algo pessoal e normativo, enquanto que a ética diz respeito a padrões do ‘bem ou mal’ realçados por uma comunidade ou contexto social”. Esse é o meu enfoque. Não me deterei na moralidade do auxílio-moradia, nem de outros penduricalhos da remuneração de membros do Judiciário e do Ministério Público.

A remuneração deles e de outros servidores públicos está sujeita ao teto da Constituição (artigo 37, XI): “a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (...).”

Bruno Boghossian: O peso do cofre

- Folha de S. Paulo

Planalto pretende explorar distribuição de verba para ampliar influência do presidente

Michel Temer pode até estar em dúvida sobre a aventura de se atirar numa campanha à reeleição com míseros 6% de aprovação no eleitorado, mas as engrenagens da máquina do governo já começaram a girar para favorecê-lo e ampliar sua influência no jogo da sucessão presidencial.

O Palácio do Planalto inaugurou a distribuição dos R$ 14,8 milhões em emendas parlamentares a que cada deputado e senador tem direito este ano —uma fortuna às vésperas de uma campanha marcada pela escassez de financiamento, em que políticos vendem seus passes em troca de R$ 2,5 milhões do fundo eleitoral.

Auxiliares do presidente pretendem explorar o repasse desse dinheiro como a principal ferramenta para atrair aliados e construir uma base política vinculada diretamente a Temer, em que serão recompensados aqueles que estiverem alinhados com o projeto de seu grupo político na disputa de outubro.

O governo é obrigado a liberar as emendas mesmo aos parlamentares de oposição, mas o Planalto quer antecipar a transferência do dinheiro para seus amigos e atender aos demais políticos só depois da eleição.

O peso do cofre federal pode ser um trunfo de Temer para conquistar a fidelidade dos políticos porque a maioria dos partidos ainda não escolheu um candidato a presidente, e boa parte dos parlamentares permanece “solteira” nessa disputa. Preocupados com suas próprias reeleições, eles podem se sentir seduzidos.

O dinheiro das emendas é crucial para deputados e senadores porque é repassado às prefeituras de seus redutos e se traduzem em obras que chamam a atenção dos eleitores.

A impopularidade de Temer cristalizou a impressão de que ele está inelegível na prática e de que seu apoio será tóxico para qualquer candidato. O presidente está disposto a usar o peso da máquina federal para recuperar força política —seja para se lançar à reeleição, seja para vender seu poder a outro postulante.

Ricardo Noblat: Pode isso, Arnaldo?

- Blog do Noblat

Cariocas pagarão mais um imposto para viver sob Estado de Exceção

Primeiro foi o tráfico de drogas que começou a cobrar uma espécie de imposto sobre o preço dos principais produtos vendidos aos moradores das zonas de risco do Rio de Janeiro – botijões de gás, ligações de luz, transportes e até cigarros.

Depois, a mesma maneira de se autofinanciar foi adotada pelas milícias que oferecem aos moradores proteção contra os traficantes.

Finalmente, chegou a vez de uma empresa estatal. O Correios anunciou que cobrará uma taxa extra de R$ 3 para entrega de encomendas no Rio.

Segundo a direção da empresa, ficou mais cara e muito mais perigosa a entrega de encomendas nas áreas sujeitas à violência do tráfico e das milícias. E como essa conta precisará ser paga por alguém, que seja pela população mais pobre dos morros que cercam a cidade.

Ou seja: além de não oferecer segurança como a lei o obriga, o Estado passará a cobrar por sua própria deficiência.

O Correios ganhará nas duas pontas. Quem manda encomendas para o Rio paga por mandar. Quem deveria receber, pagará para receber. Outros concessionários de serviços públicos poderão desejar fazer a mesma coisa.

Hoje, no Rio, há cerca de 850 áreas de risco onde moram um milhão e meio de pessoas sob Estado de Exceção. Ali, não vigoram as leis que regularam a vida dos demais cidadãos. Vigoram as leis do tráfico e das milícias.

Luiz Carlos Azedo: O medo de Lula

– Correio Braziliense

A quinta turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adiou de hoje para terça-feira o julgamento do habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pleiteia que o tribunal impeça a prisão do petista. O recurso é contra a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre, que condenou o ex-presidente a 12 anos e 1 mês de prisão em regime fechado. Uma liminar já havia sido negada pelo vice-presidente do STJ, Humberto Martins, em 30 de janeiro, mas agora será julgado o mérito da ação.

Desta vez, a defesa de Lula, sob comando do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence, que pediu o adiamento por motivos de saúde, opera como é da tradição das bancas de advocacia: no terreno do direito e no corpo e corpo com os ministros que vão decidir a questão. Não há ameaças da CUT no sentido de parar o Brasil, o MST não promete invadir a capital do país, o PT não organizou caravanas de militantes nem atos de protestos com artistas. Não se faz campanha para desmoralizar os ministros do STJ que vão julgar os recursos. Agora, Lula trabalha nos bastidores de um tribunal onde muitos foram nomeados pela sua caneta. Mas está com medo de ser preso. “É possível a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, mesmo que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não havendo se falar em violação do princípio constitucional da presunção de inocência”, essa foi a afirmação de Martins ao negar a liminar que tirou o sono do ex-presidente da República.

Lula sabe que a condenação pelo TRF-4 já inviabilizou a candidatura à Presidência da República, o PT insiste em mantê-la apenas para ganhar tempo. A Operação Cartão Vermelho, da Polícia Federal, que investiga a suspeita de envolvimento do ex-governador da Bahia Jaques Wagner na Lava-Jato, liquidou o plano B da legenda para disputar o palácio do Planalto. O ex-presidente solto, porém, pode fazer campanha para o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que foi o seu ministro da Educação, outro nome cogitado. Na cadeia, Lula perde muita capacidade de transferência de votos na disputa eleitoral, seu poder de mobilização popular ficará praticamente anulado. Daí a mudança de tática de sua defesa, que trocou a agitação política pela advocacia verdadeira. Hoje, veremos se vai funcionar. Mas, mesmo que a Quinta Turma do STJ decida favoravelmente a Lula, o assunto acabará mesmo na alçada do Supremo, porque haverá recurso do Ministério Público Federal.

Vinicius Torres Freire: Brasil aos pedaços na eleição

- Folha de S. Paulo

Economia não deve melhorar para metade dos eleitores; conversa política é fragmentada e pobre

Fala-se muito da multiplicação de presidenciáveis e da decorrente fragmentação do voto. Nessa situação, que nem sabemos se vai perdurar até maio, a eleição em tese se torna mais imprevisível. Torna-se também mais provável a vitória de um programa ou candidato com menos respaldo nas urnas ou de maioria menos enfática, ao menos.

Discute-se menos um problema que, por tentativa e talvez erro, vai se chamar aqui de fragmentação pobre da conversa ou dos chamarizes eleitorais que partidos e candidatos vão oferecer na campanha.

A economia vai melhorar, sim, mas talvez apenas a metade mais rica da população sinta o refresco na pele e no ânimo até o fim do ano (leia-se mais sobre isso mais abaixo). O programa econômico de quase toda elite social e política, um plano liberal, até agora causa repulsa a uns dois terços do eleitorado, ao menos nos termos e nos limites em que foi proposto.

Um sucesso temporário ou publicitário do remendão da violência no Rio e a "agenda da segurança" podem encantar parte dos eleitores. É o programa direitista do governismo e da extrema direita. Talvez um sexto do eleitorado tenha sido hipnotizado de vez pela propaganda do ódio, da violência e do autoritarismo de capitães do mato.

Por volta de um quinto parece órfão e perdido quando Lula sai da urna, quase todos na metade mais pobre do país, para os quais quase todos os demais candidatos não parecem ter planos ou conversas convincentes.

Zeina Latif *: A sociedade amadurece

- O Estado de S.Paulo

Estamos diante do desafio inédito de desafiar o Estado patrimonialista

Em meio ao ceticismo em relação ao futuro do Brasil, como se o País estivesse fadado a dar errado, vale lembrar que as crenças e os valores de uma sociedade são mutantes. Crises profundas podem ser gatilhos para mudanças, como defendem Marcus Melo e Carlos Pereira.

Um exemplo é o valor que hoje a sociedade dá à inflação controlada, depois de mais de uma década de inflação fora de controle. Nossos jovens, que não testemunharam o pré-Plano Real, foram às ruas em 2013 protestar contra o aumento da tarifa de ônibus em São Paulo e, sem saber, protestavam contra a inflação elevada. Não é coincidência que, naquele junho, a inflação de alimentos atingiu 15% na variação anual. A ex-presidente Dilma não durou muito produzindo inflação elevada. Sinal de um país que amadureceu.

Nessa linha, será que a crise fiscal que o País vive, possivelmente a mais séria da história, será capaz de transformar a sociedade brasileira, no sentido de passar a dar a devida importância para o equilíbrio fiscal? Quanto precisa piorar para melhorar?

Resistência não falta. Muitos grupos, geralmente de esquerda, ainda insistem que o governo deveria flexibilizar a política fiscal para estimular a economia. Parecem não compreender que quando um país caminha para uma situação de insolvência, como o Brasil, o espaço para estímulo fiscal é mínimo, sendo necessário, na verdade, cortar gastos. Insistir na estratégia expansionista seria contraproducente, produzindo menos e não mais crescimento. Há evidências de que este era o quadro no fim do governo Dilma, como apontado por Tatiana Pinheiro. Também não compreendem que o orçamento é muito engessado, com despesas obrigatórias consumindo quase todo o Orçamento federal. Um aumento de gastos geraria aumento do déficit público, pois, sem reformas, não haveria espaço para compensar com cortes em outras áreas.

Ribamar Oliveira: Dois orçamentos para o próximo ano

- Valor Econômico

Decisão é de não usar operação de crédito para fechar as contas

Não foi apenas a reforma da Previdência Social que foi adiada com a intervenção do governo federal na área de segurança do Rio de Janeiro. Uma mudança na chamada "regra de ouro" das finanças públicas, definida no texto constitucional, também não poderá ser feita. Com isso, o grande desafio do governo, neste momento, é encontrar uma maneira de elaborar a proposta orçamentária para 2019 sem ferir a Constituição.

A "regra de ouro" prevê que o governo só pode se endividar para pagar investimentos, inversões financeiras e amortização da dívida pública. O endividamento não pode aumentar para pagar gastos correntes, como aposentadorias, salários de servidores, despesas com água e energia, entre outros.

A União registra déficit primário em suas contas desde 2014. Esta situação foi provocada, principalmente, pelo aumento contínuo das despesas correntes obrigatórias, como os benefícios previdenciários. Isto significa dizer que parte do gasto corrente está sendo financiada pelo aumento do endividamento. Neste contexto, a "regra de ouro" só está sendo cumprida com o uso de artifícios contábeis. No passado recente, a conta foi fechada com a ajuda do lucro contábil do Banco Central transferido ao Tesouro. Agora, com o pagamento antecipado pelo BNDES de empréstimos feitos pela União.

Everardo Maciel *: A Constituição como fator de instabilidade fiscal

- O Estado de S.Paulo

Estamos diante do desafio inédito de desafiar o Estado patrimonialista

A reverência à Constituição, pedra basilar do Estado Democrático de Direito, não pode servir de pretexto para desconhecer os problemas associados à Constituição de 1988. A Assembleia Constituinte, instituída por força de emenda constitucional, pretendeu assumir competências próprias de uma constituinte exclusiva e originária. Assim, por exemplo, proclamou cláusulas pétreas, insusceptíveis de alteração por emenda constitucional, como se fosse uma assembleia pentecostal guiada pelo Espírito Santo.

Sua concepção exibe um curioso contraste: de um lado, há uma prodigalidade de princípios carentes de regras, muitas vezes em razão de uma recorrente mora legislativa; de outro, especificamente na matéria tributária, um furor analítico que torna o texto constitucional assemelhado a uma instrução normativa.

Desta contrastante combinação decorrem ativismo judicial e propensão ao litígio, que subsidiam uma perturbadora insegurança jurídica, minando a capacidade de administrar o Estado e o ânimo privado para investir. Destaquei alguns exemplos, no campo fiscal, de impropriedades na Constituição de 1988.

O pensador italiano Michelangelo Bovero, em entrevista ao jornal Valor (12.9.2014), assinalou, apropriadamente, que direitos sociais com repercussão orçamentária são apenas benefícios, cuja concretude demanda a existência de recursos.

Novo Código Comercial induz à burocracia: Editorial | O Globo

Texto em vigor é de 1850, mas sua atualização, em tramitação no Congresso há sete anos, poderá aumentar o custo das empresas e os conflitos judiciais

Não é exagero chamar o Brasil de país da burocracia. Não por acaso, o problema, que atrapalha a vida de todos — pessoas físicas e jurídicas, ricas e pobres, grandes e pequenas — justificou, no final da ditadura militar, no governo do general João Baptista Figueiredo, a criação do Ministério da Desburocratização, conduzido por Hélio Beltrão.

O ministro fez um bom trabalho, mas, com a extinção da pasta, a burocracia voltou, por inércia, como é característico dos usos e costumes cultivados na gigantesca máquina do Estado brasileiro. Se nada for feito, esta máquina cria regras e normas, para subjugar a sociedade, torná-la dependente de seus desígnios. Burocracia, afinal, é fonte de poder.

Tudo isso é sabido, não se desconhece o pendor pela criação incessante de regras, normas, leis. E esta cultura está tão entranhada em instituições e pessoas que continuam a ser gerados monstrengos, como é a revisão do Código Comercial, há sete anos em tramitação no Congresso.

Distribuir para crescer: Editorial | O Estado de S. Paulo

Qualquer programa sério de crescimento deve incluir o combate à corrupção e à desigualdade, segundo o novo estudo sobre a economia brasileira apresentado em Brasília pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Não se trata apenas de acrescentar duas preocupações moralmente louváveis à política econômica. O Brasil poderá crescer mais e com maior segurança – esta é a mensagem – se desperdiçar menos dinheiro com políticas e programas desenhados para beneficiar grupos privilegiados, à custa da maior parte da sociedade, e pouco eficientes para criar e distribuir prosperidade. Isso inclui isenções fiscais e benefícios financeiros mal planejados, protecionismo comercial e favores distribuídos a empresas e setores selecionados, num sistema frequentemente movido e azeitado por propinas.

A parte mais importante do novo relatório da OCDE a respeito do Brasil está na crítica das políticas adotadas e na lista de recomendações. As projeções de crescimento são conservadoras, quando comparadas com as do mercado e do governo: 2,2% neste ano e 2,4% no próximo. O documento também traz estimativas de expansão do investimento, de 2,5% em 2018 e 2,7% em 2019, e do consumo privado em cada um dos dois anos, de 3% e 2,5%. O desemprego deve cair da média de 12,7% no ano passado para 11,2% e 9,4% neste e no ano seguinte. Mais interessantes, politicamente, são os comentários sobre as possibilidades de crescimento sustentável no médio e no longo prazos.

OCDE alerta para importância de ampla abertura comercial: Editorial | Valor Econômico

O relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre a economia brasileira é uma avaliação sóbria sobre os desafios futuros do país. Um de seus pontos de partida é que a longa recessão trouxe para o primeiro plano desequilíbrios estruturais importantes, que as políticas aplicadas ao longo dos últimos anos contribuíram para agravá-los. A maior parte do diagnóstico, assim como os feitos pelo Banco Mundial e pelo FMI, é conhecida dos economistas brasileiros. Mas seus principais pontos estarão presentes, de uma forma ou de outra, na campanha eleitoral - ou deveriam estar.

Para a organização, o desafio fiscal é premente e, se o teto de gastos não for cumprido à risca, o Brasil poderá entrar novamente em recessão, entre outras consequências funestas. O país gasta mais do que quase todos os outros em juros (6,1% do PIB) e com seu funcionalismo público (13,1% do PIB). Seu endividamento público deu um salto de 20 pontos percentuais do PIB em três anos, para 74% do PIB. As soluções propostas são a reforma da previdência em primeiro lugar e uma revisão radical dos gastos obrigatórios no orçamento, além do fim da indexação de benefícios sociais ao salário mínimo.

Parte da ruína fiscal é também atribuída aos subsídios específicos a setores industriais, que consumiram 4,5% do PIB, e que necessitam ser revistos em profundidade. Tanto os programas para indústria como os empréstimos subsidiados do BNDES não trouxeram avanços importantes ou contínuos de produtividade, muito menos sustentaram uma taxa robusta de investimentos. O Brasil é um dos países que menos investe dentre os analisados pela OCDE e sua produtividade esteve estagnada nos últimos 15 anos.

Passos incertos: Editorial | Folha de S. Paulo

Pasta da Segurança Pública estreia sem apresentar novas diretrizes ou recursos

A guinada da agenda governista rumo à segurança pública se dá, por enquanto, mais à base de notícias de impacto do que de uma estratégia compreensível.

Primeiro, a bombástica intervenção federal no Rio de Janeiro; depois, a criação de um novo ministério para o setor, ocupado por Raul Jungmann, que deixou a Defesa. Agora, a substituição do diretor-geral da Polícia Federal —a segunda em menos de quatro meses.

Neste último caso, é evidente que trocas de comando em intervalos de tempo tão diminutos resultam em consideráveis transtornos administrativos, tratando-se de repartição que abarca 14 mil servidores e 27 superintendências nos estados e no Distrito Federal.

Mas, ao que tudo indica, aproveitou-se a oportunidade para a correção de um erro. Fernando Segovia, que chefiava a PF desde novembro, comprometeu sua credibilidade com declarações desastradas —todasno sentido de desmerecer investigações envolvendo o presidente Michel Temer (MDB).

Freire sobre Jungmann: O Brasil ganha um homem com espírito público e republicano

- Portal do PPS

"O momento é de colaboração de todos para que a tarefa de combater o crime seja exitosa"

O presidente do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), disse que o partido se sentiu honrado com a escolha de Raul Jungmann para comandar o recém-criado Ministério da Segurança Pública (veja o vídeo abaixo). “Entretanto, no momento em que aceitou o convite, ele abdicou daquilo que imaginávamos ser, até pela sua dimensão política, uma cadeira de senador por Pernambuco. É uma pena, mas sabemos que estamos perdendo momentaneamente um quadro político e o Brasil está ganhando alguém que tem espírito público, espírito republicano”, afirmou Freire.

Para o presidente do PPS, o momento agora é de colaboração “para que essa tarefa seja exitosa não apenas para Raul Jungmann e para o governo para o qual ele presta seus serviços, mas para o Brasil”.

Na avaliação de Freire, o Brasil enfrenta de forma muito correta a crise da segurança pública, “com a União tomando a frente e combater, junto com os estados, uma das grandes chagas do nosso País. Daí a criação do Ministério da Segurança Pública”.

Governo busca candidato ideal

Temer exige compromisso eleitoral de novos ministros e procura nome da base para outubro

Paulo Celso Pereira | O Globo

BRASÍLIA - O presidente Michel Temer deu início esta semana às negociações pela construção de uma candidatura presidencial da base aliada que defenda seu legado. Na segunda-feira, o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, começou a chamar para conversas individuais os ministros que devem deixar a Esplanada com a intenção de se candidatar nas eleições de outubro. O conteúdo básico dos encontros, que devem se estender até o fim da próxima semana, é o mesmo: Padilha está informando aos demissionários que a pré-condição para os ministros e seus partidos indicarem sucessores é se comprometerem com a defesa do governo durante as eleições. E a ideia do Planalto é costurar com essas legendas uma grande aliança em torno de um só candidato presidencial, que venha da base aliada.

A decisão de Temer de colocar na disputa um nome para defender sua gestão veio de reiteradas conversas com o ex-presidente José Sarney, que disse se arrepender de não tê-lo feito em 1989. O ministro Moreira Franco, da Secretaria-Geral da Presidência, é didático sobre a estratégia:

— No regime presidencialista é a Presidência que organiza as forças políticas. O fato de o governo Sarney não ter tido candidato levou as forças de situação a se dividirem. O governo vai ter candidato. Vamos procurar dentre os candidatos da base quem tem melhores condições eleitorais, além de liderança pessoal e popular para unir os partidos. E esse candidato pode ser qualquer um. Pode ser o Rodrigo Maia, pode ser o Henrique Meirelles, pode até surgir outro candidato — pontua o ministro, um dos mais próximos interlocutores de Temer.

Indagado se o próprio presidente poderia ser o nome da base, o principal conselheiro político de Temer tergiversa:

— Não sei. Nem o governo, nem o presidente Temer vão trabalhar para que seja ele. O que vai pautar a ação política do governo não vai ser aquela obstinação em torno de uma única alternativa. O que importa é nós unirmos essa base, que precisa de um nome que tenha trânsito e viabilidade eleitoral. O governo não vai ter preferência, pode ser qualquer um.

OBJETIVO DE TER NOME EM JUNHO
O objetivo do Planalto é definir o candidato até o início de junho. Para justificar a impopularidade de Temer, o discurso que eleitoral já começa a ser desenhado: Temer teria tido a coragem de realizar reformas que precisavam ser feitas — como a trabalhista, a do ensino médio e a criação do limite dos gastos públicos —, evitando medidas populistas. Outro argumento eleitoral em defesa do eventual candidato único da base seria de que apenas esse nome teria condições de governar a partir de 2019 com uma maioria parlamentar clara.

Alckmin tenta evitar que Temer assuma sozinho a bandeira da segurança

Presidenciável tucano lança ofensiva contra o crime em São Paulo

Sérgio Roxo e Silvia Amorim | O Globo

-SÃO PAULO- Numa tentativa de evitar que o presidente Michel Temer se aproprie da bandeira da segurança pública, o governador de São Paulo e pré-candidato do PSDB à Presidência da República, Geraldo Alckmin, anunciou ontem uma operação especial da polícia na região do estado mais próxima ao Rio, o Vale do Paraíba.

A segurança pública e o equilíbrio das contas públicas são os principais cartões de visita que Alckmin apresentará na campanha ao Planalto para tentar se vender ao eleitor que vive fora de São Paulo como gestor eficiente. Desde que Temer determinou a intervenção no Rio, no último dia 16, o tucano tem propagado a queda nas taxas de homicídio em São Paulo. O estado possui o mais baixo índice de assassinato por grupo de 100 mil habitantes do país.

— O principal crime, o homicídio, o crime contra a vida, nós temos o menor número da série histórica — disse o governador, ontem, na cidade de Taubaté.

Alckmin anunciou o início de uma operação policial com intensificação de blitzes justamente na divisa com o Rio, além de ações ostensivas no litoral norte paulista, ao longo da Rodovia Rio-Santos. Foram mobilizados ontem 950 policiais, batalhões de choque e helicópteros. Não há data para a ação terminar, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública do estado.

O tucano se considera o único presidenciável com resultados para mostrar no combate à violência, apesar de o estado ser o berço da facção crimininosa PCC, hoje com atuação em todo o país. Aliados do governador avaliam que, se a intervenção no Rio não der certo ou não for capaz de expor resultados até a eleição, Alckmin continuará tendo a “melhor vitrine eleitoral” no debate sobre segurança pública. Se a intervenção for eficaz, o tucano ganhará um novo adversário nas urnas: Temer ou seu escolhido.

Temer promete que Meirelles fará sucessor

Presidente também deu aval para que ministro se filie a MDB

Marina Dias | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente Michel Temer prometeu que Henrique Meirelles poderá influenciar na escolha de seu sucessor no Ministério da Fazenda caso decida disputar o Planalto.

Em conversa com o ministro no sábado (24), Temer disse que ambos articularão juntos sua eventual substituição em abril e deu aval para que Meirelles se filie ao MDB, fazendo-o avançar algumas casas no tabuleiro que pode levá-lo a ser o candidato do partido nas eleições de outubro.

A promessa deixou mais claro o futuro do Ministério da Fazenda caso Meirelles seja candidato, mas Temer fez ponderações que mostraram um caminho difícil até que os planos do chefe de sua equipe econômica se concretizem.

Os favoritos de Meirelles para sucedê-lo na Fazenda são os seus secretários Eduardo Guardia (Executivo) e Mansueto Almeida (Acompanhamento Fiscal). As expectativas, porém, esbarram no projeto do presidente do MDB, Romero Jucá (RR), que tem estimulado a filiação de Meirelles à sigla, mas quer emplacar Dyogo Oliveira (Planejamento) na Fazenda.

Apesar de ter de arbitrar essa disputa, Temer acredita que ganhará tempo ao dar sinal verde para a filiação de Meirelles, colocando condicionantes para que seu nome seja chancelado pelo MDB como candidato da sigla.

Em discurso de despedida, General Mourão chama Brilhante Ustra de 'herói'

Folhapress | Valor Econômico

BRASÍLIA - No seu discurso de despedida do Exército, o general do Exército Antonio Hamilton Mourão, chamou de "herói" o coronel Carlos Brilhante Ustra (1932-2015), ex-chefe do DOI-Codi do II Exército, um dos principais órgãos da repressão durante a ditadura militar e acusado de inúmeros crimes pela Comissão Nacional da Verdade.

O general Mourão deixou ontem a Secretaria de Economia e Finanças do Comando do Exército e passou à reserva, após ter dado declarações públicas com sugestão de uma intervenção militar e críticas ao presidente Michel Temer.

Após a solenidade, indagado pela reportagem sobre a menção a Ustra, Mourão disse que ele foi seu comandante, "combateu o terrorismo e a guerrilha, por isso ele é um herói".

Na entrevista, Mourão atacou a intervenção determinada pelo governo no Rio e disse que o interventor, o general Braga Netto, é "um cachorro acuado" porque a intervenção deveria ter também afastado o governador Luiz Pezão (MDB).

"A intervenção no Rio de Janeiro é uma intervenção meia-sola. Vamos lembrar do século 19, houve várias intervenções nas províncias. O interventor era o 'Caxias'. Assumia o quê? O poder político e o poder militar. O [general interventor] Braga Netto não tem poder político. O Braga Netto é um cachorro acuado, no final das contas. Não vai conseguir resolver o problema dessa forma. E nós só vamos apanhar", disse Mourão.

O general afirmou que, agora que deixou o Exército, será candidato a presidente do Clube Militar, no Rio, e vai trabalhar na candidatura do presidenciável Jair Bolsonaro. Disse que, "se preciso", "subirá no palanque" em prol do candidato.

Boulos lança pré-candidatura à Presidência no sábado

Por Cristiane Agostine | Valor Econômico

SÃO PAULO - Ao lado de ex-apoiadores da senadora Marina Silva e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o líder do MTST, Guilherme Boulos, deve anunciar neste sábado sua filiação ao Psol e lançar sua pré-candidatura à Presidência pelo partido. A chapa de Boulos deve ter como vice a líder indígena Sonia Guajajara, que já foi do PT e está filiada ao Psol.

O ato para o lançamento da pré-candidatura, chamado de Conferência Cidadã, deve ter a presença do cantor Caetano Veloso e da produtora Paula Lavigne, que têm ajudado Boulos a se aproximar de artistas e intelectuais. No ano passado, Boulos participou de um encontro na casa de Paula com artistas que integram o movimento 342, organizado pela produtora. Paula e Caetano articularam também um show em apoio à ocupação com centenas de sem-tetos do MTST em São Bernardo do Campo (SP), liderada por Boulos.

No evento, divulgado pelo Psol, foram anunciadas também as presenças do escritor Frei Betto, um dos fundadores da CUT e ex-assessor especial da Presidência no início do governo Lula; da ex-prefeita petista e deputada federal eleita pelo Psol Luiza Erundina (SP); do antropólogo Luiz Eduardo Soares, que ajudou a fundar o Rede, mas deixou o partido sob fortes críticas a Marina Silva; do ex-vereador Nabil Bonduki, ex-secretário da gestão Fernando Haddad (PT), além de outros políticos, artistas, intelectuais e integrantes de movimentos sociais. Deve ser exibido um vídeo do ator Wagner Moura, que já pediu voto para Marina.

À frente do MTST, Boulos comanda um dos maiores movimentos de luta pela moradia do país. Em São Paulo, o líder dos sem-teto sempre teve boa interlocução com políticos de diferentes partidos, como o ex-prefeito Haddad, o governador e pré-candidato à Presidência pelo PSDB, Geraldo Alckmin, e o ex-secretário de Habitação Rodrigo Garcia (DEM). O dirigente conversa com frequência com Lula e mantém diálogo com o PT.

PSB pode descartar coligação nacional para priorizar Estados

Presidente do partido, Carlos Siqueira diz que legenda tem 10 nomes ‘competitivos’ para as disputas a governador

Pedro Venceslau e Ricardo Galhardo | O Estado de S. Paulo.

O PSB vai abrir seu 14.º Congresso Nacional, hoje, em Brasília, com um evento formatado para marcar o “reencontro” do partido com a sua origem de centro-esquerda. Os pessebistas, que apoiaram o impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff (PT) e romperam com o presidente Michel Temer no ano passado, já não descartam uma aliança com o PT ou com o presidenciável do PDT, o ex-governador e ex-ministro Ciro Gomes, nas eleições deste ano.

Outra possibilidade avaliada pela legenda é não entrar em nenhuma coligação nacional para dar mais autonomia às costuras estaduais, que são consideradas prioritárias para a sigla.

“O nosso objetivo central será eleger nossos governadores, temos dez nomes competitivos, e fazer uma bancada com 35 a 45 deputados. Podemos não entrar em nenhuma aliança nacional”, afirmou o presidente do partido, Carlos Siqueira, que deve ser reconduzido ao cargo.

Em conversas reservadas, os dirigentes do PSB consideram remota a possibilidade de apoiar a candidatura do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), ao Palácio do Planalto.

De acordo com Siqueira, as conversas para filiar o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa continuam, mas uma eventual candidatura do ex-ministro teria de ser submetida a prévias. “Há muita simpatia pela tese da candidatura do Barbosa, mas, se ele decidir entrar no partido, nós vamos fazer o debate. A candidatura dele não será automática”, afirmou o presidente do PSB.

Gal Costa: A Felicidade

Carlos Drummond de Andrade: Canto ao homem do Povo - Charles Chaplin

(Trecho / parte III)
III

Cheio de sugestões alimentícias, matas a fome
dos que não foram chamados à ceia celeste
ou industrial. Há ossos, há pudins
de gelatina e cereja e chocolate e nuvens
nas dobras do teu casaco. Estão guardados
para uma criança ou um cão. Pois bem conheces
a importância da comida, o gosto da carne,
o cheiro da sopa, a maciez amarela da batata,
e sabes a arte sutil de transformar em macarrão
o humilde cordão de teus sapatos.

Mais uma vez jantaste: a vida é boa.
Cabe um cigarro: e o tiras
da lata de sardinhas.
Não há muitos jantares no mundo, já sabias,
e os mais belos frangos
são protegidos em pratos chineses por vidros espessos.

Há sempre o vidro, e não se quebra,
há o aço, o amianto, a lei,
há milícias inteiras protegendo o frango,
e há uma fome que vem do Canadá, um vento,
uma voz glacial, um sopro de inverno, uma folha
baila indecisa e pousa em teu ombro: mensagem pálida
que mal decifras
o cristal infrangível. Entre a mão e a fome,
os valos da lei, as léguas. Então te transformas
tu mesmo no grande frango assado que flutua
sobre todas as fomes, no ar; frango de ouro
e chama, comida geral, que tarda.