Era um telhado com goteiras, e o dono da casa tentava pegar a água com baldinhos. Ontem caiu parte do telhado: a queda de 17,2% da produção industrial em janeiro, em comparação com janeiro de 2008 - o pior resultado desde 1991 -, fez cair a ficha de que o país pode ter recessão em 2009. Há fatos preocupantes. Quem acreditou na tese da "marolinha" tomou decisões que aprofundam a crise agora.
A Usiminas, meses atrás, achou que faltaria aço e importou. O produto chegou agora, quando há excesso de estoque na cadeia, e o dólar está mais caro.
O presidente do Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço, Cristiano Freire, disse que outras usinas demoraram muito a perceber que a onda estava chegando ao Brasil. O país continua superestocado de aço na cadeia. Então, o consumo da indústria final apenas reduz esse nível de estoque, mas não chega a novas encomendas. Pelos dados do IBGE, os bens intermediários sentiram mais.
- Os distribuidores estavam com um estoque de 930 mil toneladas de aço na virada do ano, que cobria três meses de 310 mil toneladas de consumo mensal. O consumo caiu para 250 mil toneladas, portanto o estoque ideal é de 700 mil toneladas. O preço, que havia começado a subir no mercado internacional, está em queda de novo - explicou Cristiano.
O coordenador de indústria do IBGE, Sílvio Sales, disse que 75% dos 755 produtos acompanhados pela pesquisa tiveram queda. Um percentual inédito. Nos segmentos, 15 tiveram alta, mas com concentração em carros; os 12 que tiveram queda foram puxados para baixo pela siderurgia, que depende da construção civil, máquinas e equipamentos e bens de consumo duráveis. Para fevereiro há duas complicações: um dia útil a menos e o carnaval no fim do mês, que acaba adiando as decisões.
Dentro da cadeia produtiva siderúrgica, os estoques ainda estão sendo reduzidos.
- As usinas produziram 134 mil toneladas, mas chegaram, de importações, 156 mil toneladas em fevereiro. As siderúrgicas pedem medidas protecionistas, mas foram elas mesmas que superdimensionaram o consumo - diz o empresário.
A reação do governo é pontual, sem visão estratégica, e ditada pela força de cada lobby. A redução do IPI dos carros permitiu, de fato, a recuperação da venda, mas há outros setores importantes que não têm atenção do governo por não terem sindicatos fortes, de trabalhadores e empresários.
O pacote da construção foi politizado. A reunião convocada pelo governo não era para decidir sobre o pacote, mas apenas para fazer uma foto preciosa: a candidata Dilma posa de chefe com alguns governadores, entre eles os dois que disputam a candidatura do PSDB. A propósito: a construção teve queda de 9,7%.
Enquanto isso, as informações que a equipe desta coluna e do blog encontram junto aos empresários assustam. Leonardo Zanelli soube na Abimaq que oito mil pessoas já foram demitidas no setor em dois meses. No primeiro bimestre, o faturamento caiu 35%. E o grande tombo foi em relação ao mercado interno - 46%, por cancelamento de encomendas. Segundo José Veloso, vice-presidente da Abimaq, o cancelamento de encomendas vem do setor automobilístico e das usinas de açúcar e álcool.
As consultorias tinham, todas, feito previsões melhores do que os números divulgados ontem pelo IBGE. Erraram feio, por otimismo. Ontem, elas revisaram seus números, e ouvidas por Alvaro Gribel, do blog, deram mensagens parecidas: primeiro, há mais risco de recessão este ano do que julgavam anteriormente; segundo, o corte dos juros na próxima reunião do Copom pode ser maior, de 1,5% ou mais. A MB Associados disse que "a luz do fim do túnel foi para mais longe" e prevê queda para a indústria em 2009.
A crise externa chegou ao Brasil na parada brusca do último trimestre de 2008. Na semana que vem, o IBGE divulgará o PIB do trimestre e se saberá o número do tombo. E o fato de ter sido uma parada brusca ainda está produzindo efeitos desencontrados. Há empresas pequenas na ponta do varejo que ainda nada sentiram. E há empresas nos setores de matérias-primas ou de produção de bens de capital que sentiram o baque de frente, e empresas de bens de consumo duráveis que estão com pouco estoque para oferecer ao varejo, mas com medo de aumentar a produção. O cenário desencontrado piora tudo.
O Executivo e o Judiciário Trabalhista se mobilizaram nos últimos dias para tentar salvar os 4.000 empregos da Embraer. O presidente da empresa, Frederico Curado, me disse que a decisão da Embraer foi tomada diante dos sinais inequívocos da crise.
- Mais de 90% do que produzimos são para exportação, e as encomendas estão sendo canceladas pela recessão dos Estados Unidos, nosso maior mercado, e pela desaceleração da China, para onde estávamos diversificando. Estavam programados 200 aviões de grande porte e agora só faremos 130. Caiu pouco o número de aviões pequenos, mas um grande custa US$30 milhões e um pequeno, US$3 milhões.
O governo Lula continua perdido. Para ele, o que há é uma crise do "neoliberalismo". O que há é uma crise econômica, senhores e senhora. Ela é grande e nos atingiu há meses.
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