- Brasil Econômico
Um dos mais famosos filmes do diretor japonês Akira Kurosawa é "Kagemusha, a sombra do samurai". Senhor feudal dos mais temidos, Shingen Takeda ou Kagemusha adotava uma tática imbatível: sempre esperava os adversários atacarem. "A montanha não se move", ensinava ele a seus oficiais. Curiosamente, essa tem sido a atitude da diretoria do Banco Central do Brasil, nestes dias de acalorado debate político. Entre os temas que mais provocam polêmica está exatamente a autonomia do BC, prevista na plataforma de governo da candidata do PSB, Marina Silva. Apesar de todo o barulho, pouco ou quase nada se ouviu da equipe presidida por Alexandre Tombini.
No meio do tiroteio, o BC continua estritamente apegado às suas atribuições constitucionais. Ou seja, zela pela estabilidade da moeda e pela higidez (boa saúde) do sistema financeiro. No prédio mais imponente do setor de autarquias de Brasília, tem prevalecido até agora a recomendação de Kagemusha. O BC permanece impassível, quase alheio às discussões. Sabe-se, porém, que, nos bastidores do órgão responsável pela política monetária, o corpo técnico não esconde a inquietação com os rumos do debate. Se há reações contra os comentários da oposição de que o BC se tornou uma marionete nas mãos da presidente Dilma Rousseff, também se considera um equívoco afirmar, como faz a campanha do PT, que dar autonomia ao BC seria o mesmo que submeter a política monetária aos caprichos dos bancos privados.
Para os executivos do BC, as duas visões são igualmente injustas e extremadas. Ambas desmerecem o empenho e a eficiência da instituição pública que exerce o papel de "guardião da moeda." Aos desarmados de preconceitos explica-se que, na prática, o Banco Central tem autonomia há tempos. As decisões sobre a taxa básica de juros e as intervenções no câmbio (por meio dos leilões de swap) são de livre arbítrio do BC com o objetivo de evitar flutuação excessiva do real e de manter a inflação dentro da meta. Não há autonomia de direito (prevista em lei), mas existe autonomia de fato. Assim, acredita-se que faria pouca diferença a adoção de mandatos fixos para a diretoria, como acontece no Federal Reserve dos EUA e em outros países.
Mesmo sem essa garantia, os executivos do BC brasileiro decidem com base em seu dever. Um pequeno ajuste, talvez, pudesse mudar a responsabilidade pela fixação da meta de inflação. Hoje, cabe ao Conselho Monetário Nacional fixar o centro da meta. Já que se trata de uma decisão de Estado, ela poderia ser transferida para a órbita do Congresso Nacional. Ao contrário do Ministério da Fazenda, o BC tem demonstrado alta dose de realismo em relação ao desempenho da economia. Nega-se, por exemplo, a reduzir a taxa básica de juros, hoje em 11% ao ano, embora isso contribua para o baixo crescimento da economia.
A área técnica do BC concluiu que o motivo da desaceleração econômica é menos a alta dos juros e mais a quebra de confiança dos empresários e dos consumidores. Pesam também os maus ventos que sopram na Europa, que corre o risco de deflação, no Japão e até mesmo na China. Nos EUA, há incerteza em relação à política do Fed. Nesse cenário, o BC deverá rever nos próximos dias sua previsão para o PIB deste ano. Anunciará algo abaixo de 1%. Mesmo que atrapalhe a campanha de reeleição de Dilma Rousseff.
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