sábado, 14 de fevereiro de 2015

Boicote começa na base aliada – Editorial / O Estado de S. Paulo

Se até o líder da bancada do PT - o partido da presidente Dilma Rousseff e, supostamente, o mais fiel ao governo entre todos os que compõem sua base no Congresso -, deputado Sibá Machado (AC), já dá como certo que a mudança em benefícios trabalhistas e previdenciários proposta pelo Palácio do Planalto "não será aprovada em sua origem", pode-se imaginar qual será o resultado final. 

A acachapante derrota do candidato do PT e da presidente da República na eleição para a presidência da Câmara - foi eleito o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que Dilma tem como adversário - deixou o partido sem lugar na mesa diretora da Casa e mostrou a incompetência dos articuladores políticos do governo e a fragilidade de sua base parlamentar. As resistências às mudanças previdenciárias e trabalhistas indicam que o apoio parlamentar ao governo é ainda mais precário, pois em grande parte elas nascem no PT.

É amplo e irrestrito o boicote às mudanças nas regras de benefícios sociais propostas pelo governo como parte do indispensável ajuste fiscal destinado a corrigir os erros cometidos nos quatro anos do primeiro mandato de Dilma Rousseff. É um prenúncio de dificuldades para a aprovação de outras medidas que comporão esse ajuste, nos casos em que elas dependerem de aprovação do Congresso.

Até o Diretório Nacional do PT cobra do governo o diálogo com o movimento sindical e o popular, para "impedir que medidas necessárias de ajuste incidam sobre direitos conquistados". O texto não deixa dúvidas de que o partido é contra a proposta e se tornou parte essencial do movimento de resistência ao ajuste fiscal.

Já foram apresentadas 750 emendas alterando as duas medidas provisórias (MPs) que restringem o acesso aos benefícios. Delas, 450, ou 60%, têm como autores parlamentares da base governista. Petistas respondem por mais de 100.

A senadora Gleisi Hoffmann (PR), ex-chefe da Casa Civil e considerada uma das congressistas mais fiéis ao Palácio do Planalto, está entre os petistas que querem mudar a proposta. Ela propõe a exclusão do pacote do item que reformula o cálculo das pensões. O deputado federal Vicentinho (SP), que liderou a bancada do partido, quer manter as regras para pagamento de pensões por morte em acidente ou por doença profissional. Já o PC do B, partido da base e com representante na equipe ministerial de Dilma, é contra todas as mudanças.

Desde o anúncio de seu nome para o cargo, no fim do ano passado, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem inspirado confiança. Sua escolha foi considerada adequada para executar a tarefa de ajustar as finanças do governo federal, fortemente desarranjadas nos primeiros quatro anos do governo Dilma.

O que o governo preserva de credibilidade neste início do segundo mandato de Dilma se deve à escolha de Levy e à postura firme do ministro no rumo do ajuste das contas públicas. Seu compromisso com a obtenção, neste ano, de um superávit primário equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) reforçou as expectativas de que o ajuste será forte e para valer.

As mudanças na área social são essenciais para o cumprimento da meta. Seu impacto financeiro foi estimado em R$ 18 bilhões, parte expressiva do superávit prometido, que deve alcançar R$ 66,3 bilhões, dos quais R$ 55,3 bilhões do governo federal (o restante caberá aos Estados e municípios).

Outra parte do ajuste que caberá ao governo federal virá da transferência, para os consumidores, do custo adicional imposto às empresas do setor elétrico pela crise do setor. A crise decorre do uso das usinas termoelétricas para suprir a perda de capacidade das hidrelétricas provocada pela falta de chuvas e do fracasso do desastroso plano do governo Dilma de redução das tarifas. Também haverá aumento de impostos, como os incidentes sobre combustíveis, o crédito às pessoas físicas, bens importados e cosméticos.

São medidas impopulares. O desafio da equipe chefiada por Levy é preservá-las num ambiente já hostil ao governo - por causa do escândalo da Petrobrás e de problemas de articulação política - e que pode piorar, como sugere a resistência da base governista ao ajuste.

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