- O Globo
A denúncia, a ser apresentada proximamente, do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) de que a presidente Dilma continuou cometendo crime de responsabilidade já no mandato iniciado este ano, ao assinar seis decretos de créditos suplementares ao Orçamento sem autorização do Congresso, vai colocar por terra o argumento utilizado pelos defensores do governo de que um presidente não pode ser impedido por crimes cometidos fora do seu mandato presidencial.
Nessa interpretação, o novo mandato obtido na eleição de 2014 não pode ser contaminado pelos acontecimentos do mandato anterior. A discussão certamente terminaria no Supremo Tribunal Federal se não aparecessem os crimes cometidos contra a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a própria Constituição neste novo mandato.
Aos que alegam que um presidente não pode ser condenado por crimes cometidos fora do mandato, há não apenas o bom senso — pois com a reeleição essa interpretação seria um cheque em branco para o presidente cometer irregularidades para se reeleger sem perigo de ser punido —, como também a tese jurídica da “continuidade administrativa”, que considera que a reeleição nada mais é do que a continuação do primeiro mandato.
Além disso, a interpretação da Constituição permite uma compreensão melhor do tema. A reeleição foi introduzida pela Emenda Constitucional nº 16, de 4 de junho de 1997. A lei 1.079, que cuida do processo de impeachment, sofreu 11 modificações impostas pela lei nº 10.028, de 19 de outubro de 2000, posterior, portanto, àquela emenda.
Em nenhuma delas, o legislador diferenciou os mandatos. Acresce-se a clareza do artigo 15 da lei 1.079: “A denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo”. A contrario sensu, pode ser recebida enquanto o denunciado permanecer no cargo.
Por derradeiro, a lei deve ser interpretada conforme a Constituição, e um dos princípios basilares da administração é o da moralidade. No entendimento de juristas, melhor atende àquele princípio a não distinção entre os mandatos.
Essa discussão será levada necessariamente ao Supremo, mas a oposição pretende usar a denúncia do MP junto ao TCU sobre a reincidência da burla à legislação como base para reforçar o pedido de impeachment, que pode ter seu curso acelerado já na próxima semana pela disposição do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, de apressar a análise dos pedidos já apresentados.
A oposição, no entanto, está dividida entre tentar iniciar o processo ainda sob a presidência de Cunha, ou agir para apressar sua retirada da presidência da Câmara, oferecendo apoio político para que permaneça no exercício do mandato enquanto está sendo processado, como acontece com cerca de cem parlamentares.
A direção do PSDB continua considerando que a melhor saída é aquela que leva a uma nova eleição, caso o Tribunal Superior Eleitoral ( TSE) termine condenando à impugnação a chapa presidencial vitoriosa, por abuso de poder econômico e político, nos dois primeiros anos do mandato.
Nesse caso, o presidente da Câmara assume o governo por 90 dias e convoca as eleições diretas para presidente, que, no calendário da oposição, ocorreriam em outubro de 2016, juntamente com as eleições municipais.
Esse calendário, porém, exige que a situação do deputado Eduardo Cunha tenha sido resolvida antes, pois não é aceitável, na definição de um líder tucano, que ele assuma a Presidência da República nem por 9 horas, quanto mais por 90 dias.
Todas essas situações estarão sendo discutidas nos próximos dias e meses, até que se chegue a uma definição, que será adiada pelos inúmeros recursos que o Palácio do Planalto usará para postergar ao máximo o momento final. ( Amanhã, o calendário do impeachment)
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