Sem experiência nem formação, os jovens são atingidos em cheio pela crise econômica. O número de pessoas de até 24 anos que desistiram de procurar emprego triplicou desde 2014 – eram mais de 1,76 milhão nessa situação no fim de 2018. O desalento, como é chamado o fenômeno, é reflexo direto do alto desemprego registrado nessa faixa etária, que chegou a 27,2% no ano passado – enquanto a dos trabalhadores em geral ficou em 11,6% no mesmo período.
Também o número de vagas formais abertas para quem nunca trabalhou antes caiu 41%, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Além disso, a renda dos que têm até 24 anos caiu 8% nos últimos quatro anos, perda maior do que a registrada nas demais faixas. Em 2014, antes da recessão e quando a taxa de desocupação entre os jovens era quase a metade da atual, eles ganhavam, em média, R$ 110 mais do que hoje.
Desalento triplica entre os mais jovens
Faixa de até 24 anos sofre com desemprego acima de 27%, vagas formais fechadas e renda em queda; com isso, desistem de procurar uma colocação
Douglas Gavras / O Estado de S. Paulo
O mercado de trabalho após a crise atingiu em cheio os jovens brasileiros. Além de o desemprego dessa faixa etária ter batido em 27,2% no fim do ano passado, o número de desalentados, os que desistiram de buscar emprego, triplicou desde 2014, entre os que têm até 24 anos. No fim de 2018, mais de 1,76 milhão de jovens estavam nessa condição.
Os números, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-Contínua), do IBGE, e compilados pela consultoria LCA, apontam que o desalento atingia 600 mil pessoas nessa faixa etária até setembro de 2015. A partir daí, quando a recessão já tinha se agravado e minado os empregos, os jovens desalentados subiram para a casa do milhão.
Para o economista Cosmo Donato, da LCA, o aumento expressivo do desalento entre os brasileiros mais jovens é um sinal preocupante, porque o trabalhador que está entrando no mercado seria um dos últimos a desistir de procurar emprego, se a economia estivesse em uma situação melhor. “Há um número crescente de pessoas que não acredita que irá encontrar um emprego, por isso desiste até mesmo de procurar.”
Ele lembra que as condições para os mais jovens no mercado acaba sendo mais difícil. Se no ano passado, a desocupação para todos os trabalhadores ficou em 11,6%, a dos jovens era de 27,2%, mesmo resultado de 2017. Até quando a taxa de desocupação, antes da crise, estava em 6%, a dos mais jovens não ficou abaixo de 14%.
A paulistana Thaiane Giovanini, de 18 anos, só queria começar a faculdade. Mas, para cursar Biomedicina, ela precisa de um emprego. “Fiquei um ano e meio em uma loja, como menor aprendiz, que era o único tipo de vaga que eles tinham para oferecer. Depois de completar 18 anos e o contrato acabar, fiquei sem rumo”, conta.
Ela diz que até tem conseguido ser chamada para entrevistas de emprego nos últimos meses, mas sempre esbarra na falta de experiência e de formação. “Parece que estou andando em círculos. Não me contratam, por não ter continuado estudando, e não consigo fazer faculdade, por não ter emprego.”
“O que aconteceu é que a crise fragilizou ainda mais esse grupo. A crise atingiu chefes de família, corroeu a renda das famílias e jogou para o mercado diversas pessoas que antes poderiam se dar ao luxo de só estudar”, diz Donato. Pela falta de experiência, eles acabam formando a faixa em que o desemprego mais vai demorar a cair.
O desalentado gostaria de trabalhar, mas acha que não vai conseguir um emprego por diversos motivos: pela idade, pela baixa experiência, pela impressão de que o mercado de trabalho ainda está muito ruim.
“E tem a questão do custo de procurar emprego. O jovem tem de gastar com transporte, estar disponível para bater perna e fazer entrevistas. É uma atividade que demanda tempo e dinheiro e , se ele não acredita que vai encontrar, acaba nem procurando”, lembra Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
Salário menor. Além do impacto no desalento, a renda dos trabalhadores com até 24 anos caiu quase 8% nos últimos quatro anos – uma perda maior do que a das demais faixas, já considera a inflação, pelo Índice de Preços ao Consumidor - Amplo (IPCA). Em 2014, antes da recessão e quando a taxa de desemprego para os jovens era quase a metade do nível atual, esses trabalhadores ganhavam, em média, R$ 110 a mais do que hoje.
Com a crise, os trabalhadores mais experientes se viram obrigados a buscar vagas com remuneração que antes era paga para os iniciantes. Para os mais jovens, quando a oportunidade aparecia, o salário era ainda menor do que antes, diz Duque.
“Eu nem espero mais conseguir um emprego do mesmo nível de quem entrou antes no mercado”, diz Bruno Santos, de 19 anos. Ele, que trabalhou por dois anos e meio como empregado informal em um depósito de material de construção. Agora, que terminou o ensino médio, busca uma oportunidade com a carteira assinada. “Não desisto, mas desanimo a cada dia.”
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) ajudam a entender a situação difícil de quem busca o primeiro emprego. Eles apontam que houve uma queda de 41% no número de vagas formais abertas para quem nunca tinha trabalhado antes.
Duque lembra que os jovens que tentam entrar no mercado de trabalho desde 2015 terão mais dificuldade de se equiparar a quem começou a trabalhar em períodos de economia aquecida. “É como largar em uma maratona no último pelotão.”
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