- Folha de S. Paulo
Convocação com fotos de generais da cúpula está vista como um sintoma do golpismo
Se é Cavalão, escoiceia. É da sua natureza, identificada e batizada pelos colegas. Mas as duas afirmações mais recentes da peculiaridade natural causaram danos severos.
Ao próprio Jair Bolsonaro, com seus ataques à repórter Patrícia Campos Mello e depreciação anatômica de todas as mulheres; e danos vários com seu chamado a uma manifestação contra o Congresso e o Supremo.
Essa convocação, com fotos de generais da cúpula do governo, está vista como um sintoma do golpismo não mais latente, já em pregação ostensiva. A gravidade maior e mais sugestiva nesse passo de Bolsonaro não está, porém, na convocação em si. E nem mesmo nas fotos dos generais. É esta: se o uso não foi autorizado, generais indicaram aceitá-lo, à falta de providência, qualquer uma, para mostrar-se contrários à convocação e ao pretendido ataque a dois dos Poderes.
Ex-integrante da caserna presidencial, de demissão mal esclarecida, o general Santos Cruz propôs-se a desanuviar o ônus, para o Exército, das fotos e daquele silêncio comprometedores. “Militares não são políticos”, “militares são profissionais”, “são guardiães da Constituição”. Sim, militar que é militar é isso mesmo. Mas não é assim, aqui, do Império à convocação feita por Bolsonaro com as fotos de generais que o acompanham no governo. E isso é História, é um correr de fatos documentados, não é opinião.
Coube a paisanos-políticos —acúmulo de condições condenadas pelo bolsonarismo civil e militar— lembrar as noções de responsabilidade governamental e de lealdade cívica que se esvaem por aí.
Passadas décadas de complacência ou covardia diante de desacatos à Constituição, ao Supremo e aos governos, por reivindicações salariais, afinal a Polícia Militar encontra quem tenha desprendimento para enfrentá-la. Foi no Ceará. O governador Camilo Santana propôs em emenda à Constituição estadual e 34 deputados aprovaram, contra votos e fugas de 12: fica proibida a anistia a policiais militares envolvidos em paralisação ilegal. O que também significa processo e julgamento. Já para os recentes amotinados, Camilo Santana não admitira a inclusão de anistia na negociação de PMs e governo.
Foram três paralisações por mês de serviços de segurança, em média no país de 1997 a 2017, como se deduz do total apurado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Todos os serviços de segurança têm o que reivindicar, é certo, seja em salários, em compensações como seguro e em condições da sua atividade. Mas por negociação, por conquista de apoio social. A Constituição proíbe greve de militares, o que inclui Polícia Militar, e o Supremo definiu que a proibição se aplica também a todos os outros serviços de segurança, por ser a sua ação indispensável à ordem pública.
A falta de compostura de Sergio Moro não deveria surpreender mais, ao menos desde que recebeu um ministério como retribuição do seu beneficiado Bolsonaro. Mas o cinismo inescrupuloso é sempre chocante. Ministro da Justiça e da Segurança Pública, Moro não viu excesso na greve armada, na ocupação à força de prédio público, nos danos a equipamentos para impedir a atividade de não grevistas, nem, ele sequer mencionou, nas 241 pessoas assassinadas no estado em nove dias de greve amotinada.
A falta de atitude de Moro e o apoio pouco velado de Bolsonaro aos grevistas são indissociáveis da convocação do protesto contra o Congresso e Supremo. Têm a mesma finalidade.
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