- Folha de S. Paulo
Doris Monteiro se aproxima dos 70 anos de carreira —qual outra cantora chegou lá?
Uma cantora brasileira se prepara para comemorar, em 2021, 70 anos de carreira: Doris Monteiro.
A data está nos anais: 7 de agosto de 1951. Foi quando Doris, ainda a três meses de fazer 17 anos, gravou seu primeiro disco: um 78 r.p.m., no estúdio da pequena Todamérica, com "Se Você Se Importasse", de Peterpan, de um lado, e "Fecho Meus Olhos... Vejo Você", de José Maria de Abreu, do outro. Dois sólidos sambas-canção cujas letras a jovem Doris, com sua trança unilateral e mãe portuguesa a tiracolo, não tinha vivência para entender. Mas ela aprendeu rápido.
Um atrás do outro, Doris ajudou a deslanchar compositores como Tom Jobim e Dolores Duran ("Se É Por Falta de Adeus"), o hoje injustamente esquecido Fernando Cesar ("Dó-Ré-Mi", "Graças a Deus" e "Joga a Rede no Mar"), Billy Blanco ("Mocinho Bonito), Silvio Cesar ("O Que Eu Gosto em Você"), Sidney Miller ("Alô Fevereiro"), Mauricio Tapajós e Herminio Bello de Carvalho ("Mudando de Conversa"). Sua gravação de "O Pato", de 1981, rivaliza com a de João Gilberto. Teve uma curta, mas impressionante carreira no cinema, fez duplas definitivas com Miltinho, Lucio Alves e Tito Madi e foi um dos rostos mais bonitos da música brasileira.
Setenta anos de microfone são de dar inveja a qualquer cantora, e não sei de outra no Brasil que tenha atingido tal marca. Doris chega a ela incólume, com a voz e a bossa com que atravessou o tempo e com o mesmo estilo adulto e sem vibrato que a tornou a cantora mais moderna do país em sua época. Seus shows hoje se limitam a um ou dois por mês, mas não por sua escolha. Aos 85 anos, ela está firme e sempre pronta, em seu apartamento art déco em Copacabana —o mercado é que encolheu para os artistas do passado.
Há pouco, Doris decidiu regravar "Fecho Meus Olhos... Vejo Você", o lado B de seu disco de estreia, de 1951. E quer saber? Melhor do que a gravação original.
*Ruy Castro, jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.
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