Ex-presidente da Câmara, hoje sem partido, será secretário de Projetos e Ações Estratégicas na gestão paulista
Carolina Linhares / Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - Em uma cerimônia
que exaltou a candidatura de João
Doria (PSDB) à Presidência da República em 2022, o governador
de São Paulo assinou a nomeação do
ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (sem
partido-RJ), nesta sexta-feira (20), como secretário de Projetos e Ações
Estratégicas.
Em sua fala, no Palácio dos Bandeirantes,
Maia deixou claro que será um articulador pela candidatura de Doria no campo da
terceira via. O governador ainda
precisa vencer as prévias presidenciais tucanas marcadas para novembro.
"Nada mais importante na política do
que aquilo que é natural. E o natural, nesse momento, é o fortalecimento não
apenas do seu nome [Doria], mas daquilo que São Paulo representa para o
Brasil", disse.
"Daqui nós vamos construir um projeto
de país, unindo aqueles democratas que respeitam a economia de mercado e o
setor privado", completou.
Mais do que coordenar projetos de governo, algo que será a função oficial de Maia, a ida do deputado para o Governo de São Paulo tem peso político e objetivo eleitoral —o que ficou claro na cerimônia, que tratou mais de perspectivas para 2022 e da oposição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) do que de ações ou metas específicas da gestão Doria.
O novo secretário deixou claro que, entre a
fragmentação da chamada terceira via para 2022, vai trabalhar
para construir unidade em torno de Doria. Aliados de longa data, Maia e Doria
costumam não ser econômicos em críticas a Bolsonaro —embora o primeiro seja
lembrado por não ter dado
seguimento a pedidos de impeachment do presidente quando
comandava a Câmara.
"Todo homem público precisa ter
responsabilidade e sinalizar para a sociedade o que acredita. [...] Está na
hora de todos aqueles que falam em independência ao governo federal, da
necessidade de mudar, todos tenham a responsabilidade de deixar claro que
precisamos construir um caminho. Não teremos cinco caminhos, teremos um
caminho. As nossas vaidades pessoais não podem estar acima do interesse da
sociedade", disse Maia.
"Com cinco
projetos, nós correremos o risco de reeleger um projeto
autoritário", completou, pregando a união da centro-direita. "Talvez
eu tenha sido o primeiro a alertar e enfrentar o extremismo autoritarismo do
presidente da República."
Maia ainda deu um recado ao seu ex-partido,
o DEM, que tem
tendências internas bolsonaristas. Ele e Doria estão rompidos com o
presidente da sigla, ACM Neto.
Após sair derrotado da eleição para a
presidência da Câmara, que teve Arthur
Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, como vencedor —e não Baleia
Rossi (MDB-SP), candidato de Maia— o deputado deixou o partido, de onde
acabou expulso. Maia reclamou de ter sido abandonado pela própria
legenda na eleição.
Já o rompimento entre Doria e ACM,
com duras
críticas do dirigente ao tucano, se deu por ocasião da filiação do
vice-governador Rodrigo Garcia, antes no DEM, ao PSDB para que,
seguindo o plano do governador, ele fosse o nome do partido na disputa pelo
Palácio dos Bandeirantes em 2022 —o que inviabilizou a candidatura de Geraldo
Alckmin (PSDB).
Segundo Maia, aceitar o convite de Doria
foi um gesto político, uma "sinalização para aqueles que se falam de
centro, que falam que serão contra o governo Bolsonaro, mas que estão em
Brasília, infelizmente, compondo a base do governo".
Além das traições de membros de partidos de
centro que votaram em
Lira ainda em 2019, recentemente deputados do DEM, PSDB,
MDB e PSD voltaram a contrariar a orientação de seus partidos ao votarem a
favor do voto impresso, pauta de Bolsonaro.
Assim como Maia criticou o adesismo em seu
partido, Doria também tem, dentro do PSDB, adversários
ligados a Aécio Neves (PSDB-MG) e que são considerados próximos
do governo Bolsonaro.
Maia mencionou ainda simpatia pela candidatura
de Ciro Gomes (PDT), que também considera natural, mas reforçou a
opção por Doria. Ele pregou contra a polarização e não mencionou Lula (PT),
embora já tenha se encontrado com o ex-presidente.
"O que é natural hoje é uma
candidatura do PSDB e a outra do PDT", disse.
"O natural é fortalecer um projeto no
nosso campo. Temos outro projeto que eu também respeito e tenho admiração no
campo da centro-esquerda, que é o do Ciro Gomes. Mas, no nosso campo, nós temos
um nome que tem condições de liderar esse processo, que é o nome do governador
João Doria. E a minha sinalização política está dada."
Maia passa a integrar o Governo de São
Paulo após acumular seguidas derrotas políticas. Ainda antes de perder a
sucessão na Câmara, tentou viabilizar mais uma reeleição para o comando da
Casa, mas acabou vendo a possibilidade ser derrotada pelo STF (Supremo Tribunal
Federal), que rejeitou
a tentativa de atropelo à Constituição.
Ele afirmou que vai levar a experiência do
diálogo para São Paulo e que está aprendendo no novo cargo. Ao lembrar sua
passagem à frente da Câmara, falou da aprovação de projetos na área econômica.
"Não é apenas a vontade de atropelar, de executar qualquer coisa, foi a
vontade de ouvir aqueles que de fato entendem de cada uma das áreas",
disse.
A presença do presidente do
PSDB, Bruno Araújo, na mesa de autoridades, ao lado de Doria,
Maia, Garcia e outros secretários do governo, também deu tom político à
cerimônia. O governador justificou: "Embora seja uma ação de ordem
administrativa, o Bruno se deslocou de Pernambuco para estar aqui ao lado de
seu amigo Rodrigo Maia".
Maia sinalizou ainda estar próximo do PSDB,
mas, ao ser questionado sobre eventual filiação ao tucanato, afirmou que seu
projeto político e sua escolha partidária estão vinculados ao seu aliado e
prefeito do Rio, Eduardo Paes, que
recentemente ingressou no PSD e de quem Doria também é próximo.
"Claro que a tendência é essa. Meu
projeto é com o prefeito do Rio, seja no PSD ou numa outra construção que ele
entenda relevante", disse Maia a respeito de se filiar ao PSD.
Ao ser questionado sobre a possibilidade de
ser vice na chapa
presidencial de Doria, Maia respondeu que sequer tem um partido.
"Fui expulso dos Democratas democráticos", ironizou, antes de dizer
que irá concorrer à reeleição como deputado federal no Rio.
Doria afirmou que não houve conversa com
Maia que vinculasse a
aceitação do cargo de secretário a uma filiação ao PSDB. A
cerimônia foi acompanhada por secretários de Doria e por deputados federais e
estaduais, a maioria tucanos.
A respeito de Maia ter atuação e domicílio
político no Rio de Janeiro, Doria lembrou que muitos dos seus secretários não
são paulistas.
"A política não deve ter nem fronteiras
e nem muros. Quem gosta de muros são os extremistas. [...] Rio e São Paulo são
complementares. [...] A política é brasileira, é dos brasileiros. São Paulo
crescendo, o Brasil todo se beneficia. [...] Somos contra os extremos",
afirmou Maia sobre ser carioca.
"O que vale é o currículo e o
comprometimento. [...] Aqui nós não fazemos seleção nem por domicílio, nem por
oportunismo e muito menos por valores eleitorais. [...] A composição
desse governo sempre foi pela eficiência e capacidade de
entrega à população", disse Doria.
Para acomodar Maia, Doria criou a 27ª
secretaria de seu governo. O tucano lembrou que sua gestão tem
envergadura de ministério por abrigar sete ex-ministros de
Michel Temer (MDB), estratégia adotada desde o início do governo para
projetá-lo nacionalmente.
Como mostrou
a Folha, o
tucano, nos últimos meses, abriu mão de nomes técnicos para
incorporar políticos em seu secretariado e, assim, melhorar a relação com
parlamentares, prefeitos e líderes partidários.
Maia é o reforço político de maior
relevância no governo até agora. Em março, Cauê Macris
(PSDB), ex-presidente da Assembleia de São Paulo, assumiu a Casa Civil com
a missão de reconstruir pontes entre Doria e a classe política, após uma série de
escorregões do tucano. Já em maio, o ex-deputado
estadual Itamar Borges (MDB) foi nomeado secretário da Agricultura como
uma forma de contemplar o partido aliado.
Doria, afirmou, no entanto, que a motivação
para nomear Maia "é a formação de um secretariado focado na gestão".
E ressaltou a interlocução de Maia com empresários, bancos e o que chamou de
"economia liberal".
"Ele não é secretário de assuntos
políticos, é o secretário de ações estratégicas. Mas obviamente que eu
reconheço que ele traz o
peso político de seis mandatos como deputado federal", disse o
tucano. "A boa política se faz somando. A causa aqui não é exclusiva de
São Paulo, é do Brasil."
Repondendo a pergunta sobre sua prioridade
na gestão, Maia disse estar começando a estudar a pasta, mas citou a
Sabesp e afirmou que prepará-la para a privatização será seu
objetivo.
"E aqui o compromisso é gestão. Com
gestão se faz a boa política. Com transparência se faz à obediência à verdade e
o respeito ao dinheiro público", afirmou Doria.
A Folha revelou, no entanto, em uma série
de reportagens, que o governador não dá transparência a repasses de
verbas políticas para irrigar a base de parlamentares aliados. Os valores alcançam R$
1,05 bilhão em 2021.
Toda a fala do governador foi voltada ao
aspecto nacional, ecoando o
discurso de um candidato a presidente, como costuma fazer.
Ele concorre nas prévias tucanas com o
governador gaúcho Eduardo Leite, o senador Tasso Jereissati (CE) e o
ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio. O ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso (PSDB) declarou
apoio a Doria nesta semana.
Doria também afirmou que São Paulo segue a
ciência e exaltou a vacinação. "Aqui é o estado da vacina no braço e da
comida no prato", disse.
Rodrigo Garcia, vice de Doria e que deve assumir
o governo em abril de 2022 e depois disputar a reeleição, exaltou a
experiência de Maia "não só legislativa, mas de articulação
política".
"Muito feliz de receber esse grande
reforço pro nosso time. Acho que a nossa sensação aqui, governador, é que nós
já estamos ganhando esse jogo, e a entrada do deputado Rodrigo Maia vai fazer
com que a gente ganhe de goleada", disse.
Maia foi designado para atuar com projetos
de parcerias, privatizações e concessões, área sob influência de Garcia, que,
por sua vez, tem dedicado
mais sua agenda à candidatura estadual, com viagens e inaugurações.
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