O Globo
Augusto Aras nem disfarça: é cúmplice das
investidas de Jair Bolsonaro contra a saúde pública e a democracia. O
procurador-geral da República fez vista grossa a todos os crimes do presidente
na pandemia. Em outra frente, finge não ver seus ataques e ameaças à Justiça
Eleitoral.
Nos últimos dias, Aras prestou mais dois
serviços ao Planalto. Na quinta-feira, pediu arquivamento do inquérito em que
Bolsonaro é investigado por violação de sigilo funcional. Na sexta, livrou o
presidente das suspeitas de prevaricação no escândalo da Covaxin.
A Polícia Federal concluiu que Bolsonaro cometeu crime ao vazar uma investigação sobre suposto ataque aos servidores do TSE. O capitão distorceu o teor dos papéis para propagar uma tese conspiratória. Sem provas, disse que a oposição teria contratado hackers para “desviar” 12 milhões de votos em 2018.
O ministro Alexandre de Moraes descreveu o
objetivo da lorota: “expandir a narrativa fraudulenta que se estabelece contra
o processo eleitoral brasileiro, com objetivo de tumultuá-lo, dificultá-lo,
frustrá-lo ou impedi-lo”. A delegada Denisse Ribeiro examinou as provas e
anotou que Bolsonaro atuou de forma “direta, voluntária e consciente” para
cometer crime. Só faltou convencer Aras a fazer seu trabalho.
Seis meses depois do vazamento, o
procurador opinou que não há nada a ser investigado. O inquérito divulgado pelo
capitão tinha uma tarja de “segredo de Justiça”. Sem corar, Aras escreveu que
“a simples aposição de carimbos” não tornava o documento sigiloso.
O caso da Covaxin é ainda mais espantoso.
Bolsonaro recebeu o deputado Luis Miranda e seu irmão, testemunha de uma
tramoia no Ministério da Saúde para superfaturar a compra da vacina indiana.
Pressionado pela CPI da Covid, o presidente confessou o encontro: “Conversou,
sim. Não vou negar isso daí”.
Em parecer enviado ao Supremo, Aras
sustentou que Bolsonaro não teria o dever de comunicar as suspeitas aos órgãos
de fiscalização. “O arquivamento deste inquérito é medida que se impõe”,
sentenciou.
Não foi a primeira vez que o procurador
manifestou desinteresse pelas descobertas da CPI. A comissão pediu o
indiciamento de Bolsonaro pela prática de nove crimes. Aras recebeu o relatório
há quatro meses, mas ainda não tomou nenhuma providência concreta.
Na sexta-feira, 13 senadores acusaram o
procurador de “ludibriar os brasileiros” para “ofuscar sua inércia” e
“acobertar criminosos”. Randolfe Rodrigues definiu Aras como um “pizzaiolo”.
Simone Tebet disse que ele é “covarde”, “desonesto” e “servo” do presidente. Os
parlamentares ameaçaram pedir o impeachment do engavetador. O problema é que o
Senado já premiou sua subserviência. Ele foi reconduzido ao segundo mandato há
menos de seis meses, com apenas dez votos contrários.
Nesta semana, o procurador mostrou que
ainda dispõe de muitos aliados na Casa. Os senadores Flávio Bolsonaro e
Fernando Bezerra Coelho saíram em sua defesa. O presidente Rodrigo Pacheco
enalteceu a “qualidade técnica, funcional, profissional e humana do doutor
Augusto Aras”. O cúmplice do capitão também tem os seus cúmplices.
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