Coisas da Política :: Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL
É claro que a sugestão é absolutamente inviável, mas, se para os grandes males, grandes remédios, o Congresso deveria mergulhar em recesso de um a dois meses, para reabrir inaugurando a cura da crise ética que contaminou, em doses menores, o Executivo e o Judiciário com a praga da mudança da capital do Rio para Brasília, em 21 de abril de 1960, na precipitação do presidente Juscelino Kubitschek de emplacar o slogan para o sonho do JK-65. Esta história, com os seus muitos atalhos, ainda está sendo escrita com os depoimentos dos sobreviventes dos tempos de euforia, de descontração da bossa-nova, do sorridente mineiro de Diamantina.
Não é preciso recuar muito para puxar o fio da meada na dupla traição do Jan-Jan que aprofundou a cova da candidatura inviável do marechal Teixeira Lott, mais pesada do que um vagão de minério, e varreu o cisco para a eleição do embirutado Jânio Quadros. Deponho como testemunha de episódios laterais. A desleal jogada do Jan-Jan nasceu na casa do então deputado Castilho Cabral, ex-ademarista que aderiu ao novo astro, de esquisitos costumes e cacoetes, com a fala empolada e o favoritismo reafirmado na carreira fulminante. Foi na residência do deputado Castilho Cabral, decorada com as faixas do Jan-Jan, que conversei a portas fechadas com o candidato que invadia a UDN com a oratória avassaladora do deputado Carlos Lacerda – mais tarde, personagem destacado na farsa da renúncia que não deu certo.
O anfitrião atendia ao interesse de Jânio de atrair a simpatia do repórter político de O Estado de S. Paulo, em plena manobra para conquistar o apoio da família Mesquita. Mas, o Jan-Jan embrulhou no papel pardo da traição o candidato à Presidência e o candidato à reeleição a vice.
Os dividendos da jogada marota, pisando na ética, garantiram a eleição de Jânio e selaram a derrota do governador Milton Campos, de compostura impecável, das maiores figuras que conheci em 60 anos de repórter político. E, na mesma rasteira, Jango apenas ampliou a derrota do marechal Teixeira Lott. Uma sequência de deslealdade que puniria os autores e desembocaria nos 21 anos de ditadura militar. Jânio talvez elegesse Milton Campos com a votação consagradora da sua vitória. E, com Milton Campos na Vice-Presidência, nem Jânio renunciaria e Jango não seria alçado à Presidência.
O erro da mudança da capital para Brasília inacabada, uma cidade em obras, é responsável direto pelo seu inchaço doentio, como da decadência ética do Congresso, do Executivo e do Judiciário. Moléstia endêmica que se espalhou pelos estados e municípios, e pelo visto incurável.
A resistência dos condenados a morar num canteiro de obras, no ermo do cerrado, foi contornada por JK com a distribuição de vantagens a granel. Nascia a mordomia com a bênção oficial. Ministros ganharam granjas no Lago Paranoá, parlamentares descobriram o mapa da mina com a penca de vantagens, passagens para o fim de semana nas bases eleitorais com a indecorosa verba indenizatória para ressarcir as despesas, assessores, gabinetes individuais de pouco uso.
A cada governo, a sua cota para a desfiguração de Brasília, um monstrengo cercado de favelas, de violência, com a população acima dos 2 milhões, o tráfego infernal e a maldição que envolve os três poderes na crise ética. O tumor que lateja no Senado e na Câmara é o fim da linha de uma longa história. Mas, com a carga para explodir o mais democrático dos poderes. A roubalheira, os assaltos ao cofre da Viúva viraram rotina. Passaram da conta. A denúncia da espantosa patifaria das 181 diretorias no Senado – com salários que, com horas extras e outras trampas, podem chegar a R$ 30 mil para atender aos 81 senadores nos três dias úteis da semana – repica na Câmara com 104 diretores, o que entornou o caldo.
DEU NO JORNAL DO BRASIL
É claro que a sugestão é absolutamente inviável, mas, se para os grandes males, grandes remédios, o Congresso deveria mergulhar em recesso de um a dois meses, para reabrir inaugurando a cura da crise ética que contaminou, em doses menores, o Executivo e o Judiciário com a praga da mudança da capital do Rio para Brasília, em 21 de abril de 1960, na precipitação do presidente Juscelino Kubitschek de emplacar o slogan para o sonho do JK-65. Esta história, com os seus muitos atalhos, ainda está sendo escrita com os depoimentos dos sobreviventes dos tempos de euforia, de descontração da bossa-nova, do sorridente mineiro de Diamantina.
Não é preciso recuar muito para puxar o fio da meada na dupla traição do Jan-Jan que aprofundou a cova da candidatura inviável do marechal Teixeira Lott, mais pesada do que um vagão de minério, e varreu o cisco para a eleição do embirutado Jânio Quadros. Deponho como testemunha de episódios laterais. A desleal jogada do Jan-Jan nasceu na casa do então deputado Castilho Cabral, ex-ademarista que aderiu ao novo astro, de esquisitos costumes e cacoetes, com a fala empolada e o favoritismo reafirmado na carreira fulminante. Foi na residência do deputado Castilho Cabral, decorada com as faixas do Jan-Jan, que conversei a portas fechadas com o candidato que invadia a UDN com a oratória avassaladora do deputado Carlos Lacerda – mais tarde, personagem destacado na farsa da renúncia que não deu certo.
O anfitrião atendia ao interesse de Jânio de atrair a simpatia do repórter político de O Estado de S. Paulo, em plena manobra para conquistar o apoio da família Mesquita. Mas, o Jan-Jan embrulhou no papel pardo da traição o candidato à Presidência e o candidato à reeleição a vice.
Os dividendos da jogada marota, pisando na ética, garantiram a eleição de Jânio e selaram a derrota do governador Milton Campos, de compostura impecável, das maiores figuras que conheci em 60 anos de repórter político. E, na mesma rasteira, Jango apenas ampliou a derrota do marechal Teixeira Lott. Uma sequência de deslealdade que puniria os autores e desembocaria nos 21 anos de ditadura militar. Jânio talvez elegesse Milton Campos com a votação consagradora da sua vitória. E, com Milton Campos na Vice-Presidência, nem Jânio renunciaria e Jango não seria alçado à Presidência.
O erro da mudança da capital para Brasília inacabada, uma cidade em obras, é responsável direto pelo seu inchaço doentio, como da decadência ética do Congresso, do Executivo e do Judiciário. Moléstia endêmica que se espalhou pelos estados e municípios, e pelo visto incurável.
A resistência dos condenados a morar num canteiro de obras, no ermo do cerrado, foi contornada por JK com a distribuição de vantagens a granel. Nascia a mordomia com a bênção oficial. Ministros ganharam granjas no Lago Paranoá, parlamentares descobriram o mapa da mina com a penca de vantagens, passagens para o fim de semana nas bases eleitorais com a indecorosa verba indenizatória para ressarcir as despesas, assessores, gabinetes individuais de pouco uso.
A cada governo, a sua cota para a desfiguração de Brasília, um monstrengo cercado de favelas, de violência, com a população acima dos 2 milhões, o tráfego infernal e a maldição que envolve os três poderes na crise ética. O tumor que lateja no Senado e na Câmara é o fim da linha de uma longa história. Mas, com a carga para explodir o mais democrático dos poderes. A roubalheira, os assaltos ao cofre da Viúva viraram rotina. Passaram da conta. A denúncia da espantosa patifaria das 181 diretorias no Senado – com salários que, com horas extras e outras trampas, podem chegar a R$ 30 mil para atender aos 81 senadores nos três dias úteis da semana – repica na Câmara com 104 diretores, o que entornou o caldo.
O senador José Sarney (PMDB-AP) reuniu a Mesa Diretora e anunciou que a Fundação Getúlio Vargas fará uma auditoria para examinar todos os contratos e propor uma reestruturação administrativa do Senado. A Câmara deve seguir o exemplo. Mas, e até lá, como o Senado e a Câmara expostos ao severo julgamento popular, com altos índices de rejeição nas pesquisas, podem continuar a levar a boa vida da rotina como se nada tivesse acontecido? Uma situação excepcional exige medidas extremas. Nada que o Congresso aprove terá legitimidade. Talvez a saída pela porta dos fundos seja um recesso para a faxina até que o lixo do vexame seja lançado no monturo do cerrado.
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