sexta-feira, 9 de abril de 2010

'Não se pode brincar com a Justiça'

DEU EM O GLOBO

Gilmar Mendes critica as ironias de Lula em relação às multas
Carolina Brígido

BRASÍLIA. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, criticou ontem as ironias do presidente Lula em relação a punições impostas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para Gilmar, que falou com O GLOBO antes dos ataques de Lula ao Judiciário, "não se pode brincar com a Justiça". Neste ano, Lula já foi punido com o pagamento de multas duas vezes por fazer campanha antes do prazo permitido por lei para a ex-ministra Dilma Rousseff. Após a primeira punição, com sarcasmo, o presidente perguntou a pessoas que ouviam seu discurso em um evento público quem pagaria a multa se ele falasse novamente o nome de Dilma, conforme reivindicava a plateia.

- Eu tenho a impressão que não se deve fazer brincadeiras com a Justiça. Não se pode brincar com a Justiça. Na verdade, independentemente de qualquer sanção, uma multa de R$5 mil ou R$10 mil, que pouco significa para muitas pessoas, há um dever muito maior de lealdade constitucional - disse o presidente do Supremo. - O presidente da República cumprir decisões judiciais é para dar exemplo, para mostrar que de fato observa a Constituição. Violar a Constituição é crime de responsabilidade.

Gilmar não chegou a defender literalmente uma punição maior para Lula, mas ressaltou que governadores já tiveram o mandato cassado pelo TSE por propaganda eleitoral antecipada e uso da máquina nas eleições. O ministro defendeu parâmetros uniformes para o julgamento de prefeitos, governadores e o presidente da República.

- Não podemos adotar um critério para um candidato a prefeito ou candidato a governador e um outro para o presidente da República. O presidente tem até que ser mais cuidadoso do que o governador e o prefeito, porque sua visibilidade institucional é muito maior. A gente já viu o TSE cassar governadores porque se valeram de abusos pré-eleitorais. É preciso que haja aplicação de parâmetros únicos. Que a Justiça oriente todos os candidatos no sentido de atuação equilibrada e lícita - disse Gilmar, que deixa a presidência do Supremo no dia 23.

Ministro alerta para riscos de disputas judiciais após eleição

O ministro alertou para o perigo de haver disputas judiciais após as eleições se a Justiça Eleitoral não fixar parâmetros únicos para julgar os candidatos. Caso o ministro Celso de Mello recuse a vaga de ministro substituto no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes assumirá a vaga.

- É preciso que esses critérios sejam uniformes. Até porque ninguém pode desejar que, depois de uma campanha eleitoral, nós tenhamos a judicialização da eleição por abuso na fase de campanha ou pré-campanha.

Em 29 de maio de 2009, na inauguração de um obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em Manguinhos (RJ), Lula teve o discurso interrompido por gritos de apoio à então ministra pré-candidata - "Dilma, Dilma". Na sequência, o presidente disse torcer para que o apoio fosse uma "profecia". No mês passado, o TSE multou Lula em R$5 mil pelo episódio - o que foi confirmado esta semana pelo plenário do Tribunal.

Dias depois da aplicação inicial da multa, o presidente foi novamente multado, desta vez em R$10 mil, também por discursar em prol de Dilma. A infração foi cometida em janeiro deste ano, em um evento no Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados de São Paulo (SINDPD-SP).

- A cara do Brasil vai mudar muito, e quem vier depois de mim vai encontrar um programa pronto, com dinheiro no Orçamento. Por questões legais não posso dizer quem é, espero que vocês adivinhem, espero - disse o presidente, acompanhado novamente de Dilma.

Entre uma decisão e outra do TSE, em 25 de março, Lula foi a uma inauguração de um conjunto habitacional construído pelo PAC em Osasco (SP). A plateia novamente gritou o nome de Dilma. Foi quando o presidente fez a primeira brincadeira sobre a multa da Justiça Eleitoral:

- Se for multado, vou trazer a conta para vocês. Quem é que vai pagar a minha multa?

Levanta a mão aí, para saber se vocês vão pagar a multa. Eu vou cobrar, viu Emídio? Eu vou cobrar - disse Lula, dirigindo-se ao prefeito de Osasco, Emídio de Souza.

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