Há realmente um movimento, incipiente ainda, entre os ministros do STF, para
reduzir as penas de Marcos Valério e Roberto Jefferson pelo papel que tiveram
no processo da Ação Penal 470. Ao dar informações que ajudaram nas
investigações, os dois teriam direito a uma benevolência da Corte, embora em
nenhum momento do julgamento essa hipótese tenha sido aventada em relação a
Valério. Há dúvidas sobre se a lista de receptores do dinheiro desviado dada
por Valério foi relevante ou se ele a entregou porque já estava tudo
desvendado.
Quanto a Jefferson, o ministro Luiz Fux chegou a defender redução da pena
por ter sido ele o denunciante do esquema, sem o qual não teria sido possível o
processo. Seu caso é mais fácil, pois suas penas ainda não foram definidas e,
condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, deve ser punido com menos
anos que Valério. Embora seu advogado o considere um "réu
colaborador", ainda não há formalização dessa situação, e em nenhum
momento o relator Joaquim Barbosa se referiu a essa condição quando definiu as
penas para o principal operador do mensalão. Ao contrário, pediu penas duras
para Valério, e os ministros o seguiram. Soa estranho que agora decidam reduzir
a pena por uma colaboração que não foi levada em conta na sua definição.
A questão mais importante é haver, na Corte, quem queira organizar movimento
nesse sentido, pois qualquer ministro pode levantar a hipótese enquanto a
dosimetria não chegar ao fim. Embora não tenha nada a ver com as novas versões
que Valério teria dado em depoimento ao procurador-geral da República, Roberto
Gurgel, em setembro, a eventual redução de sua pena total, que hoje chega a 40
anos, pode indicar boa vontade do STF em relação a novos julgamentos em que ele
será réu.
Outro aspecto que terá que ser avaliado cuidadosamente pelos ministros é a
segurança de Valério, que se consideraria ameaçado. Gurgel ontem disse que,
pelas informações que tem, não há motivo para dar segurança a ele por enquanto,
mas já há ministros que estão entendendo seu pleito de entrar no programa de
proteção a testemunhas como "pedido de socorro". Há outros, no
entanto, que consideram que tudo não passaria de um golpe do publicitário para
se livrar da cadeia, e há indicações de que até o momento não deu garantias de
que o que já disse, ou tem a dizer, pode ser apoiado por provas. Na verdade, há
uma espécie de queda de braço entre o Ministério Público e a defesa de Valério,
cada um tentando saber até onde o outro pode ir.
A questão mais delicada politicamente é a que envolve o ex-presidente Lula,
não incluso na Ação Penal 470, mas que é acusado em representação do procurador
regional da República Manoel do Socorro Tavares Pastana de crime de
responsabilidade por suposta atuação beneficiando o banco BMG no crédito
consignado a aposentados e pensionistas do INSS. O juiz Paulo Cezar Lopes, da
13ª Vara Federal, ainda não decidiu se recebe a denúncia. Não há provas que
atestem "categoricamente" vínculo entre o suposto auxílio ao BMG e o
mensalão, mas a ação tem indícios claros de que o BMG foi beneficiado pela
burocracia federal, o que pode indicar favorecimento em troca dos empréstimos,
considerados fictícios pelo STF, dados pelo banco ao PT e a Valério.
Relatório do TCU de 29 de setembro de 2005, por exemplo, acusa o BMG de ter
sido a instituição financeira cujo processo no INSS ocorreu de forma mais
célere. Teriam sido cinco dias entre a publicação do decreto que abria a
exploração do crédito consignado para todas as instituições financeiras e a sua
manifestação de interesse, e outros oito dias para a celebração do convênio,
quando um processo desses leva em média dois meses. Essa agilidade teria
permitido, segundo a denúncia, que o BMG fosse a única instituição não pagadora
de benefício previdenciário a atuar só no mercado de empréstimos consignados a
aposentados e pensionistas por quase dois meses, de agosto a outubro de 2004.
As informações que eventualmente Valério tiver sobre essa questão e outras
podem favorecê-lo em processos abertos ou futuros, agora já com a figura da
delação premiada, que não pode ser usada para a redução da pena no processo do
mensalão.
Fonte: O Globo
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