- Folha de S. Paulo
"Tio Bel, você consegue me fazer chegar mais 50 acarajés na quarta-feira à noite, no escritório?". "Ok, programado, seus acarajés chegaram [sic] quentinhos."
A conversa por e-mail não envolvia sobrinhos gulosos ou produtoras do saboroso quitute baiano. Eram executivos da Odebrecht combinando a entrega de dinheiro vivo, segundo investigadores da PF.
O acarajé saiu do tabuleiro para batizar a 23ª fase da Lava Jato, que prendeu o marqueteiro João Santana. Como o Brasil é o país da piada pronta, já surgiram protestos contra o uso do nome da iguaria.
A Associação Nacional dos Produtores de Acarajé reclamou de prejuízos ao setor. É perda de tempo, porque ninguém mudou o jantar de domingo depois de ler que um escândalo terminou em pizza.
Em Brasília, a prisão de Santana animou quem vive à espera de qualquer fato novo para tentar derrubar o governo. O PSDB se antecipou à Justiça Eleitoral e decretou o fim do mandato de Dilma Rousseff. O PMDB voltou a sonhar com o impeachment, que levaria Michel Temer e sua turma ao Planalto.
O ministro Gilmar Mendes, sempre ele, deu declarações em tom grave. "Se isso estiver associado à campanha, é de seriedade inexcedível", disse, na terça-feira. Três dias depois, o juiz voltaria a fabricar manchetes contra o governo.
Os efeitos da operação na política ainda são incertos, mas os marqueteiros já acusaram o golpe. Até outro dia, eles reclamavam do veto ao financiamento empresarial de campanhas. Agora isso parece ter se tornado um problema menor.
Chocados com a prisão de Santana, alguns publicitários já falam em abandonar o negócio milionário das eleições. Quem ficar terá que se adaptar a uma nova era, de menos dinheiro e mais fiscalização sobre as contas. É uma boa hora para ouvir a canção de Caymmi: "Todo mundo gosta de acarajé / O trabalho que dá pra fazer é que é."
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