É inaceitável pressionar-se a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, para colocar em pauta a questão do início da pena com Lula condenado
A mudança no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2016, para que sentença possa começar a ser cumprida antes do “trânsito em julgado” — ou seja, esgotados todos os recursos — foi um reforço considerável no enfrentamento da corrupção.
A possibilidade de o réu ser preso depois da confirmação da pena em segunda instância, conjugada com a entrada em vigor em 2014 de uma legislação sobre organizações criminosas, reformatando o mecanismo da “colaboração premiada”, aumentou bastante a eficácia da ação do Ministério Público, da Polícia Federal e da Justiça no combate aos crimes de colarinho branco.
Até 2009, o Supremo entendia, com base em duas súmulas (716 e 717), que era possível iniciar-se o cumprimento da pena antes do dito transitado em julgado. Em 2016, no julgamento de um habeas corpus, firmou-se mais vez esta possibilidade, porém em estágio liminar.
Pelo fato de o peso deste entendimento e mais a delação premiada serem vitais para o sucesso da Lava-Jato, a questão da segunda instância também passou a fazer parte de debates em Cortes superiores e no Congresso. Antes, a delação premiada já se transformara em alvo de grupos.
Ministros mudaram de posição — como Gilmar Mendes —, e o placar que havia sido de 6 a 5 foi invertido. Morto Teori Zavascki em acidente aéreo em Paraty, seu substituto, Alexandre de Moares, estaria inclinado a apoiar uma espécie de fórmula conciliadora proposta por Dias Toffoli, de passar do segundo grau para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) o estágio de definição do início do cumprimento de sentença pelo réu.
Dentro deste quadro, o ex-presidente Lula é condenado por unanimidade, pelos três desembargadores do TRF-4, confirmando e até agravando sentença de Sergio Moro, juiz da Lava-Jato, com base em Curitiba. Com isso, o debate sobre a segunda instância ganhou outra dimensão.
Senhora da pauta da Corte, a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, dissera há algum tempo que não colocaria o assunto novamente em julgamento. Por todas as implicações do tema. Afinal, a Lava-Jato e outras operações evoluem, e aproximavam-se as eleições.
Mas crescem as pressões sobre a ministra, o que é inaceitável, devido mesmo a este pano de fundo. Está em jogo a imagem do Supremo. Pode-se debater se subir o sarrafo da segunda instância para o STJ, a fim de ampliar o direito de defesa, não seria o mais indicado. Mas não agora, por óbvias razões.
Se o Supremo cometer esta reciclagem no entendimento anterior, será acusado de fazer um julgamento sob encomenda para ajudar Lula e bombardear a Lava-Jato, a fim também de proteger gente importante que se encontra sob a mira da operação, num dos mais flagrantes casuísmos dos últimos tempos.
Têm ocorrido outros casos, sempre com resultados desastrosos, porque uma decisão do Supremo, mesmo sem ser numa súmula, condiciona, de alguma forma, toda a Justiça.
Isto abala não apenas a imagem do Judiciário, em fase de reconstrução, mas também causa insegurança jurídica no país.
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