- Folha de S. Paulo
Agência de comércio, que nem é bem governo, vira objeto de disputa odienta
Pouca gente sabia o que era a Apex até que a instituição se tornasse campo de sangue das batalhas intestinas do governo de Jair Bolsonaro.
Nos últimos dias, a disputa pelo poder na agência foi o motivo da nova onda de fúria dos bolsonaristas puros contra os militares, em especial contra o general Santos Cruz, ministro da Secretaria de Governo.
O que é que a Apex tem?
1) Dinheiro;
2) poder para fazer amigos no mundo empresarial.
3) está em território dominado pela ala antiestablishment do governo: no Itamaraty, sob influência de seguidores do youtuber Olavo de Carvalho.
Dois diretores ligados a Eduardo Bolsonaro foram demitidos pelo contra-almirante Sergio Segovia, terceiro presidente da Apex deste governo. A queda da diretora Leticia Catelani, bolsonarista de primeira hora, causou especial revolta, com campanha no Twitter e tudo.
Os bolsonaristas “raiz” dizem que Catelani despetizava a agência; dava cabo de gastos suspeitos e do esquerdismo. Ela mesma contou que resistia a pressões para manter “contratos espúrios” (de quem? Convém chamar a polícia). Teria caído por intervenção militar; Segovia seria apadrinhado de Santos Cruz, há semanas na caldeirinha das milícias virtuais.
A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, a Apex, não é propriamente órgão de governo. Foi um filho temporão e bastardo do sistema “S” (Sesi, Sesc etc.), criado pelo governo de Lula da Silva em 2003.
É entidade de direito privado, bancada por contribuições obrigatórias de empresas, como no restante do sistema “S”. Mas, na Apex, a maioria dos votos no conselho deliberativo é do governo.
O ministério responsável, ora o Itamaraty, aprova seu orçamento. No ano passado, recebeu quase R$ 500 milhões em contribuições sobre a folha salarial. Não é pouco dinheiro, que de resto não está sujeito a corte pelo Ministério da Economia.
A agência promove exportações. Gasta a maior parte de sua verba em convênios com associações empresariais, além de financiar feiras, eventos, missões de divulgação e a publicidade na mídia lá fora. Na prática, a Apex é uma estatal a fundo perdido, por assim dizer.
É difícil de entender o motivo de o governo se meter nisso, em promoção comercial privada. Existem órgãos públicos responsáveis pela promoção dos interesses comerciais do país. Caso as empresas assim o desejem, podem se associar a esses esforços oficiais, pesando custos e benefícios da iniciativa —privada.
No entanto, a agência se tornou objeto de disputa política extremista. Para bolsonaristas antiestablishment, a nomeação do almirante Segovia faz parte de uma ofensiva militar que tem como objetivo derrubar os adeptos autênticos de Bolsonaro. O próximo alvo seria o ministro das Relações Exteriores.
Os militares seriam “traidores” do programa conservador nos costumes, nacionalista, antiesquerdista e liberal na economia.
Na melhor das hipóteses, os oficiais com postos no governo são “isentistas”, não se engajam na verdadeira causa presidencial.
No pior dos casos, são “positivistas”, “progressistas” em costumes, “cientificistas”, em última análise propensos a aceitar causas “globalistas” (do aborto ao ambientalismo), quando não instrumentos ou cúmplices da esquerda, que os manipula para dividir a direita.
A batalha da Apex seria mero pretexto. Os militares quereriam é acabar com a alma do bolsonarismo autêntico.
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