Gabriel Martins | O Globo
Na avaliação do diplomata e ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero, a imagem do Brasil no exterior nunca esteve tão abalada. Ricupero, que também já foi ministro do Meio Ambiente e secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), destaca que, dada a atual situação, há um perigo real de que o acordo entre o Mercosul e a União Europeia não vá adiante e até que países europeus invoquem legislações
do bloco para tomar medidas contra a soja e a carne produzidas no Brasil.
Segundo ele, em 50 anos, é a primeira vez que um assunto brasileiro mobiliza tanto a comunidade internacional. Na sua opinião, “só um milagre” recuperaria a imagem do país.
Em meio a um cenário de escalada nas tensões entre China e Estados Unidos, ele pontua que pode ser difícil a economia brasileira se recuperar a curto prazo:
—O Brasil saiu de três anos de recessão para três anos de crescimento anêmico —destacou Ricupero.
• Existe o risco de o acordo entre Mercosul e União Europeia não ser assinado?
Na verdade, agora existe a probabilidade de não ter acordo. Uma vez que há declarações oficiais de países posicionando-se contra o texto, afirmando que o presidente brasileiro mentiu, a situação muda.
• A União Europeia pode retaliar o Brasil, mesmo com a possibilidade de o país recorrer na OMC?
No caso da Europa, os países-membros podem invocar a legislação do bloco para tomar medidas contra o Brasil. Por exemplo, os países podem alegar que a carne e a soja produzidos no Brasil são oriundas de áreas de desmatamento. Isso pode impactar o comércio externo brasileiro.
• No atual cenário, é possível dizer que o Brasil vive uma crise diplomática?
Mais do que isso, o Brasil vive a mais grave crise de imagem dos últimos 50 anos. Nem no governo militar assistimos a um movimento em que todos os noticiários internacionais focalizam a Amazônia como primeira notícia, com declarações de presidentes, jogadores de futebol, atores e chefes da ONU. Muito deste cenário tem a ver com o posicionamento do governo em relação às críticas internacionais.
• É possível reverter a imagem ruim do país no exterior?
Depois das diversas declarações do governo, em tom de ataque a países e líderes que pediram soluções para a questão ambiental brasileira, a situação ficou complicada. Como o mandato do atual governo ainda tem mais três anos, a não ser por um milagre, não vejo possibilidade de recuperação da imagem do Brasil no exterior.
• Além da questão ambiental, o Brasil pode ser afetado pela guerra comercial entre China e Estados Unidos?
Guerra comercial já afeta o mercado global como um todo, uma vez que cria um clima que impulsiona o movimento de desaceleração global. No comércio, caso a atividade econômica desacelere, os países vão comprar menos. Como o Brasil é um dos mais importantes exportadores de commodities, o país pode ser afetado pelos desdobramentos e intensificação dos atritos comerciais entre China e Estados Unidos.
• O agronegócio brasileiro pode ser impactado negativamente diante do atual cenário?
A tendência existe. O cenário atual tem potencial para afetar muito o agronegócio, que representa o mais importante do comércio externo brasileiro. O agronegócio é a única parte das exportações brasileiras que mantinha o dinamismo. Agora, é esse o setor que está ameaçado de encontrar barreiras no exterior.
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