O
importante é retirar, agora que o susto passou, lições do caso André do Rap
Que
cada juiz tenha preferência por uma teoria de interpretação constitucional,
tudo bem. É normal. Faz parte. Marco Aurélio tem sua
preferência. O presidente Fux, a dele. Cada um, a
sua. Interpretar diferentemente é possível. Mas há limites. O Supremo não pode colocar a
sociedade em risco e perigo.
O
importante é retirar, agora que o susto passou, lições do caso André do Rap. Ficou claro para todos
que o processo decisório do Supremo está doente. Necessita de cura. As decisões
são caóticas. Não se sabe quem decide. Quando decide. Como decide. Se
decide.
Se decisões liminares têm de respeitar jurisprudência, quais? Nunca ninguém é impedido ou suspeito para julgar qualquer caso. Com parentes envolvidos ou não. Os ministros não avaliam as consequências reais de suas decisões. Como diz o ministro Alexandre de Moraes, o Supremo está com um grave problema de eficiência. Daqui a pouco, a máquina vai “grimpar”. Diante da inação do Supremo e de sua administração interna.
A
partir de 2013, por exemplo, os pedidos de habeas corpus têm subido
violentamente. Motivos? Vários. Entre outros, porque advogados dos réus têm uma
estratégia. Se o habeas corpus cai com um ministro mais rigoroso, o advogado
renuncia ao pedido e entra com outro igual, como analisa o professor Ivar
Hartmann. E vai entrando com habeas corpus substituíveis unilateralmente. Até
acertar. Acertar o quê? O ministro probabilisticamente mais favorável à
petição. Qualquer banco de dados com as decisões de cada ministro, como no
Supremo em Números, permite prever probabilisticamente o mais favorável, e o
menos, à causa.
Transforma-se
a distribuição dos processos numa loteria de cartas marcadas. E o Supremo é a
vítima. É o alvo do tiro. Aliás, dos tiros. Mas aceita. Silêncio. Ministros constrangidos.
Terá havido erro na distribuição? Quem decide se um ministro está impedido ou
não? Há dúvidas a esclarecer. Uma investigação e providências internas podem e
devem ser tomadas.
O
caso André do Rap mostra também o emaranhado processual em que o Supremo se
autoaprisionou. Como lembrou o ministro Barroso, somente houve este caso porque
o Supremo duvida de si mesmo. Vale ou não a prisão em segunda instância?
Mais
ainda. O presidente Fux defende que o Supremo tenha uma eficácia argumentativa
diante de todos, incluindo a opinião pública. Neste emaranhado de recursos,
esta eficácia é impossível. Os argumentos não têm nome. Não têm cara. Têm
números. A ação 333.59.892 é contra a ação 976540, que difere do agravo
11.90008. Misturam-se números com citações e reitera-se que o procedimento do
relator está errado. Difícil. Discussões processuais que mesmo quem entende não
compreende.
Um
exemplo foi a tentativa de transformar o julgamento de André do Rap numa
discussão processual sobre os superpoderes do presidente do Supremo. Como o
colegiado revogaria a decisão de Marco Aurélio sem dar muito poder ao novo
presidente, Luiz Fux
Enquanto
os ministros não se sentarem juntos, fizerem as pazes entre si, deixarem de
abusar das mídias, dos “offs”, resolver um caso não vai adiantar.
A
maior eficiência e confiança de todos no Supremo não depende do Executivo, nem
do Congresso, nem da opinião pública, nem de ninguém. Depende de si próprio.
Está na hora de colocar ordem na casa.
*Membro da ABL e professor titular de Direito Constitucional da FGV Direito do Rio
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