Banco
Central adverte: populismo faz mal para saúde fiscal
Jamais
terá sido por falta de aviso. Caso o governo brasileiro abandone o rigor fiscal
em troca de popularidade – possibilidade que mercados passaram a considerar
real –, ficará provado que, no Brasil, não só a História pouco serve de lição.
Ainda por cima se repete como farsa cada vez mais trágica.
Parece
até mesmo um ciclo maldito. Sarney se encantou com a
popularidade trazida pelo Cruzado e
prorrogou medidas “temporárias” até cair na hiperinflação. Lula abandonou
os superávits primários depois da vitória de 2006, derrotando as consequências
do mensalão. Na doce conversa das medidas contracíclicas para combater a crise
de 2008, e atrás de dividendos políticos, Dilma expandiu o intervencionismo
fiscal até cair nas pedaladas.
“A história se repete agora” foi uma frase muito usada entre agentes de mercado nos últimos dias, chegou aos andares de comando em grandes corporações e esfriou consideravelmente ânimos de investidores. Esse estado de espírito se consolidou no alerta feito na terça à noite pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que foi contundente (para os padrões convencionais de um “central banker”) ao admitir que a credibilidade da política econômica do governo está arranhada, que a fragilidade fiscal contribui para a desvalorização da moeda brasileira e que o País já perde fluxo de capitais por conta das políticas ambientais.
A
questão para quem toma decisões na economia, prosseguiu Campos Neto, não são
tanto os prazos de reformas e o calendário eleitoral, mas qual a trajetória que
se pretende seguir além do fim do ano. É um ponto de interrogação respondido
até aqui com a reiteração de um conjunto de intenções (“privatizar”,
“desburocratizar”, “avançar nas reformas”), no momento dependentes das eleições
municipais e da sucessão das duas Casas Legislativas. Ou seja, “mañana”.
Nos
círculos bem dentro do governo o aviso estridente do presidente do Banco Central foi entendido como
um recado ao próprio Bolsonaro. Teme-se no Ministério da Economia que o
presidente se sinta em prazo não muito distante na contingência de ter de ligar
para Campos Neto e pedir para ele não subir os juros. Pois é o “sentir” de
Bolsonaro em relação à política – nada fazer que arrisque perda de popularidade
– a principal causa da apenas aparente dificuldade de se aprovar matérias
relevantes: “até as eleições vamos para uma agenda de baixo custo político”,
resume um dos homens mais próximos ao presidente.
Custo
político é fácil de definir: qualquer decisão em qualquer das áreas que tem
impacto direto na questão fiscal (tributária, administrativa e do pacto
federativo) causará prejuízos a grupos organizados (econômicos, políticos,
corporativos), a entes como municípios e Estados e a agrupamentos como igrejas.
Não tomá-las também, com o agravante de que a conta fiscal não está esperando
que o peculiar mundo do poder em Brasília se mova em qualquer direção.
A
única direção clara é Bolsonaro ter subordinado tudo ao
projeto de reeleição. Alguns de seus ministros mais próximos admitem em
conversas particulares que as agendas de reformas e transformação poderiam ter
sido tocadas de forma mais rápida, que esperar pelas eleições municipais era
desnecessário para tratar de renda básica, que o presidente, ao “dar uma virada
na política” e conseguir “domar o establishment” (qualquer que seja o
significado disso), entregou a chave do cofre para o Centrão e que agora ele
precisa de mais um mandato para realizar o que prometeu antes de ser eleito em
2018.
Autoengano,
indicam episódios da nossa História, é coisa contagiante e, às vezes, vira
fenômeno coletivo.
*Jornalista
e apresentador do Jornal da CNN
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