quarta-feira, 15 de maio de 2019

Rosângela Bittar: Quanto mais erros, melhor

- Valor Econômico

A oposição agora quer só enfraquecer o adversário de 2022

As razões pelas quais não se torna efetiva a ação da oposição ao governo Jair Bolsonaro são especuladas no quotidiano da política. Vão desde a constatação de que se deve procurá-la no interior do próprio governo, onde funciona com eficiência, até conjecturas de uma oposição preocupada com agenda de conteúdo programático, o que não existe no quadro partidário. A complicar e piorar tudo, o comportamento do presidente.

Bolsonaro estaria piorando a tensão do seu governo por causa de um recorrente sentimento de inferioridade que nutre com relação aos generais e coronéis, o que leva o capitão a fermentar os problemas forjados de fora para dentro do Planalto. Na maioria das vezes contra os militares, e também na maioria das vezes crises originadas na ação da dupla Olavo de Carvalho e Carlos Bolsonaro, o segundo doutrinado pelo primeiro, cujas identidades não é preciso apresentar, já são agora conhecidas no Brasil por razões negativas.

É ao lado deles que está o presidente. Quer ver?

Dia 29 de abril, na abertura da maior feira agropecuária do Brasil, a Agrishow, em Ribeirão Preto, o presidente, antes de voltar a Brasilia, aceitou o convite de um grupo de ruralistas do baixo clero para uma conversa particular. Esses apoiadores, como tantos outros, apreciam a presença de um grande número de militares no governo Bolsonaro porque acreditam que são fiadores do presidente e símbolos de equilibrio. Na conversa, externaram sua indignação com os ataques aos militares vindos de Olavo. Disse-lhes Bolsonaro: "Olavo está certo, os militares estão contra mim".

Espanto e perplexidade foi a reação dos produtores rurais, que logo encerraram o assunto. Já não viam mais a unidade Bolsonaro-militares que acreditavam sustentar o governo.

Eleitores antipetistas que o acompanharam já estão se afastando, bem como alguns segmentos específicos, como o da feira rural, o que fatalmente desmobiliza sua base de apoio e engrossa a oposição. Uma coisa, é a turma bolsonarista atacar Lula, Frei Betto, Marilena Chauí, a esquerda, outra é centrar fogo no general Villas Bôas. Essa distinção Bolsonaro não está fazendo. As agressões criam uma unidade oposicionista interna.

Outra formulação sobre a ausência da oposição político-partidária é a reforma da Previdência, tema único tanto para o governo como para seus adversários. Ao eleger a reforma como alvo, a oposição teria se dado mal porque, agora, a sociedade compreendeu a necessidade da reforma e a estaria apoiando. Portanto, haveria um constrangimento latente dos partidos de esquerda de seguirem contra o eleitorado.

Não é bem isso o que mostram as pesquisas. Realmente aumentou a percepção da sociedade sobre a necessidade da reforma. Na última pesquisa XP, são 61% os que acham isso; na última Ibope, são 59%, praticamente igual número de brasileiros os reconhecem a sua necessidade. Contudo, quando se vai avaliar o projeto do governo e alguns pontos específicos, como a idade mínima, por exemplo, 6 em cada 10 brasileiros não conhecem o projeto e os que conhecem se mostram contrários a quase tudo o que é fundamental. Para se ter uma ideia, 80% dos brasileiros acham que a idade da aposentadoria deve ser alguma coisa abaixo dos 60 anos. Portanto, estão contra o fulcro da reforma. E não chega a ser um contrassenso, pois a percepção da necessidade da reforma se espalhou por causa da unanimidade da mídia em torno da mudança no sistema de aposentadorias, um bombardeio que inoculou a chama da necessidade de mudar.

Exatamente por essa razão constrange a oposição aumentar a ação contra a reforma.

Hoje será possível medir o tamanho da oposição política ao governo em outro tema em teste, a manifestação dos professores e estudantes contra os cortes de verbas da educação. Será a primeira greve contra medidas do governo Bolsonaro e será possível avaliar a presença da oposição e ver se ela traduz as angústias dos manifestantes, e se consegue puxar para si parte da liderança dessa onda.

Não se sabe, porém, é bem provável que não, se é atrás de tema, discurso, agenda que está a oposição. Os parlamentares do PT, do PCdoB, do PSB, do PDT e de outros partidos que, embora não caracterizados como oposição, não levam o carimbo do governo, como o MDB e o PSDB, têm razões outras para não assumir uma luta bem definida.

É a oposição que estaria fazendo o que é melhor para ela. E o que seria? Um analista menciona o princípio napoleônico: "Nunca interromper o inimigo quando ele estiver cometendo erros."

Se Jair Bolsonaro está errando, é melhor para a oposição deixá-lo continuar errando para que possa enfrentar um adversário mais fraco em 2022.
Não se cogita, nunca, tirar Bolsonaro, um presidente sem liderança, sem ponte com o Congresso, em luta interna e agressiva. A oposição não vê o impeachment como sua tarefa. Acha, até, em blague que percorre suas reuniões, que um substituto poderá acertar e, aí sim, a disputa próxima ficaria mais incerta ainda.

E há a razão mais forte, a determinar todas as outras: a oposição não tem, neste momento, candidato para 2022.

O PT segue com um movimento tímido em viagens a Curitiba, onde Lula está preso. Segue não acreditando em Fernando Haddad, e ainda não elaborou novos nomes que possam assumir a renovação da identidade do partido.

O PSB anda meio parecido com o MDB, uma federação de partidos regionais forte em dois ou três lugares (PE, ES, DF), volta a tentar atrair Joaquim Barbosa, a convidar o governador Flávio Dino a transferir-se do PCdoB para o PSB, mas não dá garantias políticas a nenhum deles. Provavelmente vai afunilar suas perspectivas com o nome de Joaquim Barbosa.

O PDT tem o Ciro Gomes, tão agressivo quanto os atiradores de Bolsonaro, embora com um palavreado menos chulo. Na última campanha, Ciro reabilitou-se bastante na reta final do primeiro turno, recebendo a adesão de muitos que não queriam nem Bolsonaro nem o PT, mas terá que percorrer longo caminho até deixar de ser o monotemático que é: O que fala do MDB, do PSDB e do PT o impede de juntar as peças.

Bolsonaro, que parece contido porque tem quem faça barulho por ele, começa a querer dar as cartas para 2022. E seus jogadores já estão no campo. Aliás, nunca saíram. E à falta de adversários no campo oposto, acabam atirando nos do seu próprio time.

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