Os mercados acompanham com interesse as primeiras ações do governo Dilma.
Pequenas decisões ou movimentos mais relevantes da nova equipe instalada no Palácio do Planalto têm grande repercussão no vaivém dos mercados.
Afinal, o Brasil é uma das economias emergentes com maior visibilidade entre os investidores internacionais. Em 2010 fez parte -pela primeira vez- do seleto grupo dos dez países que mais receberam investimentos diretos estrangeiros.
O maior foco da atenção dos analistas tem sido a decisão do Copom sobre juros, a questão do salário mínimo e o corte de despesas no Orçamento fiscal para 2011.
Não tenho visto, entretanto, uma análise mais estrutural de como será a gestão da economia nos próximos anos.
Talvez porque o sucesso do governo Lula tenha cristalizado a visão de que o governo do PT segue hoje o receituário econômico de Fernando Henrique Cardoso e ponto final.
Não é essa a minha impressão.
Embora aceite que os valores socialistas mais radicais, que dominaram o PT durante a fase fora do poder, estão hoje superados, entendo que sua visão da economia ainda é a de um grupo de esquerda democrática clássica.
O principal elemento do pensamento desse grupo é o de um voluntarismo da ação do governo na busca do crescimento acelerado.
Gosto da imagem sobre o comportamento do Exército francês na fase inicial da 1ª Guerra Mundial para descrever esse ativismo de grande parte dos governos de esquerda. Era o chamado ""élan", palavra francesa para descrever ""o ímpeto" como a força principal que movia os soldados franceses nas trincheiras da Europa.
No caso dos governos, como o da nossa presidente, a teoria do élan se aplica à busca do crescimento econômico. Nessa versão, as mortíferas metralhadoras alemãs são substituídas por limitações de natureza financeira e econômica que aparecem em uma economia de mercado nos momentos de boom.
Cito dois exemplos clássicos e que já ocorrem neste Brasil no início de 2011: o quase pleno emprego no mercado de trabalho e o deficit financeiro em nossas transações comerciais com o exterior.
O principal motivo dessas verdadeiras armadilhas, em que caem os governos mais tradicionais de esquerda -e é a história que nos mostra isso-, é a incapacidade de seus economistas em aceitar que movimentos importantes em uma economia de mercado acontecem em momentos diferentes. Os economistas chamam de "lags" esses espaços de tempo que ocorrem entre ações dos agentes econômicos -inclusive governos- e seus impactos nos vários mercados.
O exemplo da relação entre consumo e investimento em uma economia como a brasileira é um dos mais importantes para mim. Com o consumo das famílias e do governo em expansão vigorosa, já há alguns anos, começam a aparecer gargalos em vários setores da economia.
Como existe um grande otimismo em relação ao futuro, as empresas -e o governo- estão dispostas a investir na expansão de suas fábricas ou usinas hidrelétricas ou na exploração do petróleo do pré-sal.
Acontece que, durante um tempo, os gastos com investimentos produtivos se confundem com os de consumo, tornando ainda maior a pressão sobre fatores escassos como mão de obra, transportes e energia.
Somente após algum tempo - normalmente longo - esses gastos cessam e temos um aumento da oferta de bens e serviços. No caso do mercado de trabalho, essa armadilha é ainda mais delicada porque o tempo necessário para treinar e formar novos trabalhadores com alguma qualificação é muito elevado.
Vivemos essa situação no Brasil de hoje e, mesmo assim, o nosso ministro da Fazenda vem a público dizer que a meta do governo é crescer 5,5% nos próximos anos.
Isso não acontecerá sem que a inflação se acelere de forma perigosa e o deficit em conta-corrente atravesse a fronteira do bom senso econômico. É preciso reduzir a demanda agregada nos próximos anos para permitir que os gastos de investimento sejam realizados sem pressão sobre os preços.
Luiz Carlos Mendonça de Barros , 68, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
Pequenas decisões ou movimentos mais relevantes da nova equipe instalada no Palácio do Planalto têm grande repercussão no vaivém dos mercados.
Afinal, o Brasil é uma das economias emergentes com maior visibilidade entre os investidores internacionais. Em 2010 fez parte -pela primeira vez- do seleto grupo dos dez países que mais receberam investimentos diretos estrangeiros.
O maior foco da atenção dos analistas tem sido a decisão do Copom sobre juros, a questão do salário mínimo e o corte de despesas no Orçamento fiscal para 2011.
Não tenho visto, entretanto, uma análise mais estrutural de como será a gestão da economia nos próximos anos.
Talvez porque o sucesso do governo Lula tenha cristalizado a visão de que o governo do PT segue hoje o receituário econômico de Fernando Henrique Cardoso e ponto final.
Não é essa a minha impressão.
Embora aceite que os valores socialistas mais radicais, que dominaram o PT durante a fase fora do poder, estão hoje superados, entendo que sua visão da economia ainda é a de um grupo de esquerda democrática clássica.
O principal elemento do pensamento desse grupo é o de um voluntarismo da ação do governo na busca do crescimento acelerado.
Gosto da imagem sobre o comportamento do Exército francês na fase inicial da 1ª Guerra Mundial para descrever esse ativismo de grande parte dos governos de esquerda. Era o chamado ""élan", palavra francesa para descrever ""o ímpeto" como a força principal que movia os soldados franceses nas trincheiras da Europa.
No caso dos governos, como o da nossa presidente, a teoria do élan se aplica à busca do crescimento econômico. Nessa versão, as mortíferas metralhadoras alemãs são substituídas por limitações de natureza financeira e econômica que aparecem em uma economia de mercado nos momentos de boom.
Cito dois exemplos clássicos e que já ocorrem neste Brasil no início de 2011: o quase pleno emprego no mercado de trabalho e o deficit financeiro em nossas transações comerciais com o exterior.
O principal motivo dessas verdadeiras armadilhas, em que caem os governos mais tradicionais de esquerda -e é a história que nos mostra isso-, é a incapacidade de seus economistas em aceitar que movimentos importantes em uma economia de mercado acontecem em momentos diferentes. Os economistas chamam de "lags" esses espaços de tempo que ocorrem entre ações dos agentes econômicos -inclusive governos- e seus impactos nos vários mercados.
O exemplo da relação entre consumo e investimento em uma economia como a brasileira é um dos mais importantes para mim. Com o consumo das famílias e do governo em expansão vigorosa, já há alguns anos, começam a aparecer gargalos em vários setores da economia.
Como existe um grande otimismo em relação ao futuro, as empresas -e o governo- estão dispostas a investir na expansão de suas fábricas ou usinas hidrelétricas ou na exploração do petróleo do pré-sal.
Acontece que, durante um tempo, os gastos com investimentos produtivos se confundem com os de consumo, tornando ainda maior a pressão sobre fatores escassos como mão de obra, transportes e energia.
Somente após algum tempo - normalmente longo - esses gastos cessam e temos um aumento da oferta de bens e serviços. No caso do mercado de trabalho, essa armadilha é ainda mais delicada porque o tempo necessário para treinar e formar novos trabalhadores com alguma qualificação é muito elevado.
Vivemos essa situação no Brasil de hoje e, mesmo assim, o nosso ministro da Fazenda vem a público dizer que a meta do governo é crescer 5,5% nos próximos anos.
Isso não acontecerá sem que a inflação se acelere de forma perigosa e o deficit em conta-corrente atravesse a fronteira do bom senso econômico. É preciso reduzir a demanda agregada nos próximos anos para permitir que os gastos de investimento sejam realizados sem pressão sobre os preços.
Luiz Carlos Mendonça de Barros , 68, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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