"A Rio+20 terminou hoje (ontem) com um conjunto de resultados que, se realmente levado adiante nos próximos meses e anos, oferece a oportunidade para catalisar caminhos rumo a um século XXI mais sustentável." Assim Achim Steiner, diretor-executivo do Pnuma, definiu a Rio+20. É uma promessa, não um resultado palpável. "Vamos em passos incrementais", ele explicou. O problema desse passo a passo é que a crise ambiental e climática corre solta.
O resultado oficial modesto contrastou com o escopo desse megaevento, que teve numerosos eventos paralelos relevantes, promoveu impressionante mobilização de recursos intelectuais, políticos, sociais, técnicos e logísticos. Decidiu-se por um processo de negociações, sem garantias de que terá bons resultados. Ele tem prazo determinado para chegar aos resultados indicados, mas o mandado aos negociadores é amplo demais. Não garante que o produto final corresponderá às aspirações enunciadas nos discursos.
Os diplomatas brasileiros dizem que a frustração é dos ambientalistas, porque a conferência não é ambiental. É sobre desenvolvimento sustentável. Ênfase vocal no desenvolvimento. O problema desse argumento é que, de 1992 para cá, o mundo teve extraordinário progresso econômico. O último estágio desse avanço acontece agora na África, onde vários países crescem a ritmo maior que a média dos países asiáticos que sempre cresceram mais. Houve muito progresso social, no Brasil e em todo o mundo. Ninguém cuidou do ambiental.
Entre 1992 e 2012, o quadro ambiental e climático piorou muito, em parte por causa do desenvolvimento econômico e social global. Tivemos espantosa perda de biodiversidade. A poluição atmosférica matou, e continua a matar, milhares de pessoas anualmente em todo o mundo. Estamos no oitavo ano consecutivo em que eventos climáticos extremos afetam a agricultura globalmente, mantendo os preços agrícolas em patamares que condenam milhões à fome.
O agravamento do quadro ambiental e climático está aumentando os gastos com saúde, reduzindo a produção da agricultura global, gerando insegurança alimentar, causando bilhões de dólares de prejuízos econômicos para a indústria de seguros. A crise ambiental causa pobreza e fome. Afeta a economia dos desenvolvidos e dos mais pobres. A seca no Texas e seca e inundações na Austrália destruíram muito capital econômico e natural. Eventos climáticos extremos estão produzindo uma devastação social. No Leste da África (Etiópia, Somália, Djibouti e Quênia) e em Bangladesh, por exemplo, secas e inundações afetaram uma população que ultrapassa 12 milhões de pessoas, mais do que toda a população do Estado do Rio de Janeiro.
É o pilar ambiental que está ruindo e ele levará ao desmoronamento econômico e social. Por isso precisávamos sair da Rio+20 com uma organização mundial para o meio ambiente e metas de desenvolvimento sustentável. Munida de metas ambientais quantitativas para equilibrar os pilares econômico, social e ambiental e integrá-los, buscando a sustentabilidade. Para colocar a questão ambiental no topo do multilateralismo, como disse François Hollande.
Na Rio+20 não se conseguiu consenso sobre o mínimo necessário para começarmos essa caminhada rumo à sustentabilidade. Chegou-se ao compromisso possível. Mas não é assim que funciona com o clima e o ambiente. A natureza do desafio mudou. No século XX, o compromisso era possível, porque as questões eram políticas e de segurança militar. No século XXI, as forças que nos ameaçam não admitem compromissos, nem atraso.
Sérgio Abranches é sociólogo e cientista político
FONTE: O GLOBO
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