quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

O nome é crise - Tereza Cruvinel

Antes, havia uma crescente e continuada judicialização da política. Mas agora o Congresso constata, e, dizem seus líderes nas coxias, ocorre também a politização do Supremo

Por mais que os atores e os narradores evitem pronunciá-lo, não há outro nome para a situação que se instalou entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal: trata-se de uma crise institucional. O poder que detém a representação popular, composto por 513 deputados e 81 senadores, foi paralisado pela decisão monocrática de um ministro do Supremo. Não foi em protesto que o Congresso, sob a condução do mais experiente e sereno de seus integrantes, o ex-presidente José Sarney, optou, no fim de um dia marcado por tensão, revolta e perplexidade, por nada mais votar este ano. Nem mesmo o Orçamento Federal para 2013, com todos os transtornos que isso trará ao país. A liminar do ministro Luiz Fux, proibindo a apreciação dos vetos à Lei dos Royalties antes dos outros mais de 3 mil acumulados, também declarou "sobrestadas" todas as demais deliberações. Ou seja, trancou a pauta.

O artifício que foi tentado para contornar o problema, sem desobedecer à determinação do ministro da Suprema Corte, foi votar em bloco a fila de vetos, em sua maioria irrelevantes, incluindo em último lugar os vetos recentes da presidente Dilma à lei que divide a Federação. Há alguns anos é assim que um Congresso atolado em MPs e outras demandas vem apreciando os vetos. Depois, entrariam em pauta o Orçamento e dezenas de créditos suplementares, liberando nestes dias finais do ano recursos aguardados por órgãos e instituições para concluir projetos e a execução de políticas públicas. Como era de se esperar, a metodologia dividiu a Casa. As bancadas do Rio e do Espírito Santo, estados produtores que desejam manter os vetos, ameaçaram com uma guerrilha regimental que exigiria alguns dias de votação. E, para completar, mais um deputado, o petista carioca Alessandro Molon, atravessou a rua e foi pedir nova liminar ao ministro conterrâneo Luiz Fux, agora contra a votação em bloco. Não chegou a ser concedida nem foi preciso mais essa paulada para a crise se instalar. Que outro nome tem a situação em que um poder, supostamente independente, é imobilizado pela ação de outro?

A decisão anterior do plenário do Supremo, de declarar cassados os mandatos dos deputados condenados no julgamento do mensalão, já havia criado fervura e revolta na Casa, mas não tão generalizada. Como os réus são da base governista e o julgamento tomou ares de guilhotina do PT, a oposição preferiu ignorar o grave significado da decisão. Já a liminar de Fux, embora fundada no rito que a Constituição prevê para a apreciação de vetos, praticamente uniu as duas Casas. Mas elas têm suas culpas neste imbróglio.

O costume dos partidos e dos congressistas de pedir a intervenção do Judiciário em assuntos que deveriam ser resolvidos pelo Legislativo estimulou o avanço do Supremo e do TSE sobre as prerrogativas do Congresso. Há alguns anos o TSE legisla sobre eleições com suas resoluções, algumas polêmicas e refugadas pela realidade política, como ocorreu com a verticalização das coligações, imposta pelo TSE em 2002. Foi essa regra que levou o antigo PL, ao coligar-se nacionalmente com o PT, a pedir-lhe ajuda financeira para eleger seus deputados, proibido que estava de fazer outras coligações. O dinheiro chegou através do valerioduto. O presidente do partido, Valdemar Costa Neto (PR-SP), terminou condenado pelo STF, na ação do mensalão, por corrupção passiva e venda de voto.

Além do costume de pedir socorro ao Judiciário, o Congresso pecou por omissões, deixando muitas vezes de fazer o que lhe competia. O Judiciário vinha e resolvia. Nos anos recentes, verificou-se a falta de líderes e grandes nomes. O Congresso descuidou-se muitas vezes da liturgia e foi negligente com a escolha de líderes e dirigentes, nem todos de ilibada reputação. Tudo isso vem acontecendo há algum tempo, mas o Supremo era outro. Agora, a Corte mudou de figurino, ganhou novo protagonismo com o julgamento do mensalão, a presidência de Joaquim Barbosa e o ingresso de outros integrantes. Antes, estava havendo uma crescente e continuada judicialização da política. Mas agora o Congresso constata, e, dizem seus líderes nas coxias, ocorre também a politização do Supremo.

O ano político termina muito mal. O novo ano também começará mal nessa seara. A promessa de que as votações serão retomadas em 5 de fevereiro não se cumprirá. Nesses dias, o Congresso terá eleito novos presidentes e estará recompondo as comissões técnicas.

Base unida. Um jantar na residência do deputado peemedebista Luiz Pitiman (DF), em torno do candidato de seu partido à Presidência da Câmara, Henrique Eduardo Alves, demonstrou a unidade da coalizão em torno da candidatura. A bancada do PMDB compareceu em peso, o vice-presidente Michel Temer circulou com a velha desenvoltura de parlamentar. Os ministros chegaram mais tarde. O PT reiterou que o acordo vai bem. Lá estiveram, entre outros, os deputados petistas Cândido Vaccarezza (SP), Nelson Pellegrino (BA) e Vicente Cândido (SP).

Temer apresentava sua receita para contornar a crise entre STF e Câmara em torno dos mandatos dos deputados condenados. Que o STF mande o acórdão à Câmara, quando concluído, notificando-a das condenações. A Casa, em seguida, daria curso às cassações, com base na perda dos direitos políticos. Assim, as cassações ocorreriam por decisão da Mesa, dispensada a votação em plenário, por voto secreto.

Fonte: Correio Braziliense

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