Os
juros não vão subir nesta reunião do Copom, mas a inflação em alta está pondo
todos no mesmo córner: o Tesouro, o Banco Central, as contas públicas e as
famílias brasileiras. O INPC pode passar de 5% e esse é o índice que corrige
várias despesas do Orçamento da União. Os gastos, portanto, subirão mais do que
o calculado no projeto enviado ao Congresso, porque a inflação acelerou no
segundo semestre. O Banco Central não elevará os juros nesta quarta-feira, mas
esse fator novo, a taxa de inflação, tira o Copom da zona de conforto. Quando
ele tiver que subir a Selic, a dívida fica mais cara.
Para
as famílias, a alta da inflação atinge um nervo exposto. O IPCA subiu 0,89% em
novembro. As maiores altas são dos preços de alimentos e de alguns serviços que
não podemos deixar de consumir. Para o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio,
o que mais pesou nos índices divulgados ontem, depois dos alimentos, foi a luz.
E ele calcula que dezembro deve trazer uma taxa de 1%:
— Com 1% em dezembro, o IPCA vai a 4,16%, mas pode ser um pouco mais. O INPC iria para mais de 5%, porque no ano o INPC acumula 3,93%, e o IPCA, 3,13%.
A
inflação de alimentos e bebidas teve alta de 12,14% no ano e 15,94% em 12
meses. Quando se mede a alta só dos alimentos no domicílio a taxa chega a
21,13% em 12 meses. Ou seja, ela é maior nos itens que pesam mais no bolso. As
famílias estão chegando ao fim do ano num país em que o desemprego subiu, a
renda caiu, o auxílio deixará de ser transferido aos mais pobres, e a comida
está mais cara. Visivelmente mais cara. E existem aumentos à espreita para o
começo de 2021. Muito reajuste foi adiado porque a ideia é que a esta altura
estaríamos livres da pandemia. Mas não. Estamos numa segunda onda de aceleração
da doença. Planos de saúde, tarifas de serviços públicos, remédios subiram
menos ou não foram reajustados em 2020. E essa conta chegará em 2021.
O
projeto de orçamento que está no Congresso previa que as despesas indexadas —
salário mínimo, benefícios previdenciários e assistenciais —seriam corrigidas
por 2,09%. Se o INPC, que indexa, terminar o ano acima de 5%, teremos um
aumento muito grande das despesas, como já alertamos aqui neste espaço na
semana passada. Talvez R$ 17 bi ou mais. O teto de gastos é corrigido também,
mas pelo IPCA em 12 meses até junho, que deu 2,13%. O teto subirá menos que a
despesa fixa. Haverá, portanto, mais dificuldade para ajustar o orçamento. E há
um problema extra: ainda não temos nem a LDO aprovada.
O
Tesouro terá um vencimento de R$ 600 bilhões de dívida nos quatro primeiros
meses do ano. O governo tem que estar bem atento a isso, exatamente porque a
dívida deu um salto forte com a pandemia. É por isso que o Ministério da
Economia está querendo deixar bem claro que pelo menos metade desses recursos
de refinanciamento da dívida já está garantida.
—
Teremos R$ 100 bilhões de pagamento do BNDES da dívida que o banco tem com o
Tesouro, e vamos ficar com R$ 190 bilhões do lucro contábil do Banco Central —
diz uma fonte da equipe econômica.
O
Tesouro do Brasil tem uma dívida alta, e com muitos vencimentos no curto prazo.
A grande vantagem é a Selic estar em 2%. Mas por quanto tempo mais a Selic
ficará nesse patamar com a inflação subindo além do previsto? Um dos poucos
pontos de alívio dos últimos tempos é a reversão da alta do dólar. O câmbio
vinha pressionando muito os preços, mas nas últimas semanas o real se valorizou
frente à moeda americana.
A
inflação quando sobe de forma rápida sempre desorganiza tudo. Não era
previsível que ela subisse, já que o país está em um contexto recessivo. A taxa
não está em níveis tão altos quanto, por exemplo, em 2015, mas o que já subiu
teve efeito de tornar mais apertado o orçamento das famílias, elevar o gasto
público e alimentar a dúvida sobre quanto tempo mais o BC pode permanecer sem
elevar a taxa de juros.
Pior do que a inflação de agora é a sensação de que outros preços vão subir quando o país ainda não se recuperou. De que eles estão à espreita, como eu disse. A vida de todo mundo fica mais difícil: do governo e das famílias. Até porque essa é uma inflação que tem muitas origens: a alta de alimentos, a falta de insumos na cadeia produtiva, os adiamentos de reajustes de preços administrados, a subida do dólar. A vida não ficará fácil tão cedo. Em todos os sentidos, mas hoje falo da inflação, aquela velha senhora.
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