EDITORIAIS
Alta rotatividade no MEC prejudica
políticas públicas
O Globo
Não se discute a demissão de Milton Ribeiro
diante das graves denúncias de que verbas públicas eram negociadas de forma
nada republicana dentro do MEC, por pastores estranhos ao quadro da pasta.
Isolado, Ribeiro não tinha mais o apoio nem da bancada evangélica. Não havia
como permanecer no comando de um dos ministérios mais sensíveis da
administração. Após três anos e três meses de governo Bolsonaro, o MEC já vai
para o quinto ministro.
Como mostrou reportagem do GLOBO, desde a redemocratização, Jair Bolsonaro foi o presidente que, proporcionalmente, mais fez trocas no comando da Educação — uma a cada 296 dias. O que mexeu menos foi Fernando Henrique Cardoso — durante oito anos, teve apenas um ministro da Educação, Paulo Renato Souza. Certamente não é por acaso que o ensino passou por avanços inegáveis. Dilma Rousseff também fez muitas mudanças, porém num período maior: seis ministros entre janeiro de 2011 e maio de 2016.
Primeiro titular da pasta no governo
Bolsonaro, Ricardo Vélez Rodríguez ficou pouco mais de três meses, gestão
marcada por uma sucessão de crises, disputas internas e polêmicas
desnecessárias. Em vez de se preocupar com os inúmeros problemas da Educação,
Vélez se empenhava em revisar livros didáticos sobre o golpe de 1964 e a
ditadura militar. Seu desempenho foi tão sofrível que o próprio Bolsonaro
reconheceu que não estava “dando certo”.
O sucessor, Abraham Weintraub, ficou pouco
mais de um ano. Expoente da ala ideológica do bolsonarismo, promoveu uma gestão
incendiária. Quando deixou o governo, era alvo de acusações de racismo e
ataques ao Supremo. Carlos Alberto Decotelli, antecessor de Ribeiro,
protagonizou uma passagem-relâmpago. Caiu antes mesmo de assumir, em meio a
denúncias constrangedoras de informações falsas no currículo acadêmico e plágio
em sua dissertação de mestrado.
Por mais que as demissões tenham sido
necessárias, é inegável que a descontinuidade afeta as políticas públicas da
área. Os resultados desastrosos do setor não deixam dúvidas. O novo ministro
assumirá faltando nove meses para o fim do mandato. Volta-se à estaca zero
depois de três anos e três meses praticamente desperdiçados. Ainda que mantenha
as equipes do antecessor, as diretrizes podem não ser as mesmas. Convém lembrar
que, na administração inepta de Ribeiro, houve debandada de quadros
qualificados em órgãos vitais, deteriorando o funcionamento da pasta.
Pela quantidade de ministros que embarcaram
e desembarcaram em tão pouco tempo, percebe-se que a Educação nunca foi
prioridade do governo Bolsonaro, mas apenas um trampolim para divulgar a
ideologia bolsonarista e tentar impor programas equivocados. É o caso da nova
Política Nacional de Educação Especial, que, na contramão do ensino inclusivo,
previa turmas exclusivas para crianças com deficiência — felizmente foi vetada
pelo Supremo.
É lamentável que essa sucessão de crises
aconteça num momento crucial, quando os desafios são gigantescos, depois de
dois anos de escolas fechadas, sob a omissão criminosa do MEC durante a
pandemia. Diante do caos vivido até agora na Educação, o mínimo a esperar do
novo ministro é que comece a reescrever esse roteiro medíocre.
É inaceitável que deputado Daniel Silveira
afronte decisão do Supremo
O Globo
Mesmo que tenha direito às prerrogativas
parlamentares, o deputado federal Daniel Silveira (União-RJ) não está acima da
lei — nem ele nem ninguém. Lamentavelmente, parece pensar o contrário. Nos
últimos dias, numa série de manobras para chamar a atenção, Silveira tem
protagonizado algumas das cenas mais bizarras já vistas no Congresso, na
tentativa de evitar cumprir a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do
Supremo Tribunal Federal (STF), determinando que ele passe a usar tornozeleira
eletrônica por ter desrespeitado medidas cautelares.
Na terça-feira, em decisão monocrática, que
será analisada pelo plenário do STF, Moraes ordenou que a Polícia Federal fosse
até a Câmara para fazer cumprir a ordem. Faz parte do jogo democrático, cujas
regras, infelizmente, Silveira teima em desprezar. O parlamentar bolsonarista
resolveu partir para a afronta ao STF. Afirmou que não acataria a ordem da
Corte e condicionou a instalação da tornozeleira a uma deliberação da Casa.
“Quem decide isso são os deputados”, alegou. E desfraldou em seguida seus
ataques costumeiros, afirmando que Moraes deveria ser “impichado e preso”. Em
atitude ridícula, passou a noite em seu gabinete para evitar os policiais
federais.
Ainda que monocrática e tomada no âmbito de
um inquérito sujeito a críticas, a decisão de Moraes é legítima e tem de ser
obedecida. Alvo de investigações sobre a disseminação de desinformação por
milícias digitais e a promoção de atos antidemocráticos contra instituições da
República, Silveira foi preso em fevereiro do ano passado depois de publicar um
vídeo em que fazia ataques a ministros do Supremo e defendia o tenebroso Ato
Institucional nº 5, instrumento da ditadura militar para intimidar e calar de
forma arbitrária opositores do regime.
Foi libertado em novembro, sob a condição
de cumprir medidas cautelares. Entre elas, a proibição de contato com outros
investigados e de participar de manifestações. Desrespeitou-a sem pudor. No dia
20, foi a ato em São Paulo com o empresário Otávio Fakhoury, também investigado
no inquérito das milícias digitais. Instada por Moraes, a subprocuradora-geral
da República Lindôra Araújo pediu ao STF que Silveira fosse impedido de tomar
parte em eventos públicos e passasse a ser monitorado por tornozeleira.
É desprezível o uso da imunidade parlamentar
e da liberdade de expressão como argumentos para disfarçar ameaças a ministros
do Supremo e agressões à democracia. A decisão sobre a prisão de Silveira foi
tomada por unanimidade no STF e referendada na Câmara por 364 votos a 130. As
instituições brasileiras não aceitam o comportamento criminoso de alguém que
age como um valentão ginasiano se recusando a arcar com a responsabilidade por
seus atos. Considerando a folha corrida de Silveira, não surpreende seu
malabarismo para tentar escapar da polícia. Surpreende é que ele ainda
frequente a Câmara com mandato outorgado pelos brasileiros.
Pessimismo em alta
Folha de S. Paulo
Datafolha mostra piora da percepção sobre
economia; cenário está em evolução
A nefasta combinação de inflação e
desemprego elevados impulsiona piora sensível da percepção do eleitorado sobre
as condições da economia brasileira, como sugere a pesquisa Datafolha realizada
nos dias 22 e 23 de março.
Os que esperam agravamento geral da
situação somam
40% dos entrevistados no país, o dobro exato dos 20% que declaravam
expectativa pessimista em dezembro. Para
74%, a alta dos preços vai aumentar, enquanto 50% preveem o mesmo para a
taxa de desocupação.
É plausível que o encarecimento brusco dos
combustíveis no início deste mês tenha tido influência considerável na
deterioração dos humores da opinião pública. Há mais a listar, entretanto.
O perfil da inflação nos últimos meses, com
grande peso de produtos cujo consumo não pode ser significativamente reduzido,
é especialmente cruel com os mais pobres. São 24% os que relatam que a quantidade
de comida em casa é insuficiente para a família —parcela similar às
apuradas em maio (25%) e dezembro (26%) de 2021.
Note-se que de lá para cá foi instituído o
Auxílio Brasil, versão ampliada do Bolsa Família com a qual o presidente Jair
Bolsonaro (PL) procurou ampliar suas chances de reeleição. O Datafolha apurou
que 23%
dos brasileiros vivem em domicílios atendidos pelo programa, mas que 68%
dos beneficiários consideram os valores insuficientes.
Todas as percepções negativas têm sua razão
de ser, dadas as frustrações com a retomada da economia do país depois de
superado o pior do impacto da pandemia. Mas, se nenhum especialista espera um
desempenho brilhante neste ano, restam fatores que podem alterar o quadro e as
expectativas.
Analistas projetam uma redução da inflação
nos próximos meses, mas, mesmo que tal prognóstico se confirme, o IPCA deve
registrar variação de ao menos 6% neste ano —muito acima da meta fixada pelo
Banco Central, de 3,5%. A instituição já indicou que deve subir a taxa básica
de juros dos atuais 11,75% para 12,75% anuais.
Mesmo com o arrocho monetário, contudo, a
atividade econômica pode se beneficiar do aumento da demanda em serviços com a
melhora da situação sanitária. Há também a valorização dos produtos primários
exportados pelo país, acentuada pela guerra na Ucrânia, que favorece a moeda
nacional.
Outro fator é o rápido aumento da ocupação
nos últimos meses, que já reduziu o desemprego ao patamar anterior à pandemia.
Nesse cenário, pode haver algum incremento de renda adiante.
Tudo somado, não é implausível que a
economia mostre alguma melhora de curto prazo mais à frente —sempre a depender,
claro, de o governo não cometer novos erros.
Um pequeno passo
Folha de S. Paulo
Negociação entre Rússia e Ucrânia vai além
da propaganda, mas está longe do fim
Quando a dissecção desses dias terríveis da
invasão russa à Ucrânia estiver concluída, possivelmente será possível dizer
que foi uma guerra das mais opacas em tempos supostamente mais transparentes.
Lados beligerantes mentem, distorcem e
tentam ganhar o público desde o Peloponeso, para ficar no registro clássico.
Mas o misto de guerra com o ambiente de balbúrdia informativa instantânea era
inédito até aqui em tal escala.
Com isso, a retomada de negociações
presenciais para tentar acabar com o combate —sob a égide do turco Recep Tayyip
Erdogan e associada a uma suposta pausa nos ataques russos contra as regiões de
Kiev e Tchernihiv— trouxe dupla leitura: ou era um avanço notável ou uma
mentira útil, principalmente para Vladimir Putin.
É evidente que o ponteiro aponta mais para
a segunda interpretação, mas será
engano não concluir que um pequeno passo foi dado em Istambul. O fim do
conflito, de todo modo, parece distante.
As demandas russas são conhecidas, mas seus
objetivos militares visíveis indicam ambições maiores que a tomada do Donbass,
região separatista no leste ucraniano.
Já Kiev não parece se contentar com nada
menos do que uma retirada dos russos, para daí aceitar os termos de sua
rendição. Ainda assim, deixou uma lista de itens por escrito, o que sugere um
amadurecimento das conversas que ocorrem há semanas com Moscou.
Endurecer a retórica faz parte do jogo
—inclusive porque todos sairão perdendo de alguma maneira ao fim de um conflito
tão destrutivo. O que parece estar na mesa é o tamanho da derrota e o quanto
ela poderá ser embalada para os públicos internos como uma vitória.
Para Putin, uma Ucrânia fatiada de áreas
pró-Rússia e de vez fora da Otan, o clube militar comandado pelos Estados
Unidos, parece mais do que suficiente para esse fim. Tal objetivo não condiz
com a escala de sua guerra, é verdade, mas as críticas aos alegados erros
militares poderão não ter grande peso para o público doméstico.
Já para o ucraniano Volodimir Zelenski,
sobreviver com um acordo no qual Putin pareça o derrotado no Ocidente também
soa como um saldo razoável. E o americano Joe Biden terá o que dizer para os
eleitores parlamentares de novembro.
Por óbvio, nada disso evitará o impacto da guerra nas relações internacionais, que pode mudar o alcance da globalização, nem o drama humano ora em curso.
A incrível reabilitação de Valdemar
O Estado de S. Paulo
Triunfo do PL na janela partidária marca a
volta por cima do mensaleiro, que deveria estar fora da política, mas, sob
Bolsonaro, tornou-se chave para o governismo
O Partido Liberal (PL) terminará a chamada
janela partidária – período em que deputados federais estão autorizados por lei
a trocar de partido sem perder o mandato – com a maior bancada na Câmara. Em
2018, o PL conseguiu eleger 33 deputados, um número considerável, mas
suficiente apenas para fazer do partido mais uma das siglas que compõem o
Centrão. Até o dia 29 passado, como mostrou recente reportagem do Estadão, essa
bancada havia duplicado para 66 deputados, um crescimento que tem o potencial
para alterar o balanço de poder na formação da nova coalizão de governo a
partir de 2023. Seja quem for eleito em outubro, o próximo presidente
provavelmente terá de compor com o dono do PL, o notório Valdemar Costa Neto.
O inequívoco triunfo do partido – afinal,
logrou vencer uma disputa pela filiação do presidente Jair Bolsonaro e trouxe a
reboque dezenas de deputados seduzidos pela expectativa de poder – representa,
em última análise, o auge da reabilitação política de Valdemar Costa Neto, uma
personalidade que, fosse a democracia representativa um tanto mais madura no
Brasil, há muito estaria proscrita dos fóruns de decisão sobre os rumos do
País.
Há quase 30 anos, Valdemar Costa Neto,
então deputado e líder do governo Itamar Franco, ganhou súbita notoriedade
nacional não por seus feitos legislativos, mas por ter apresentado a modelo
Lilian Ramos a Itamar durante os desfiles das escolas de samba do Rio de
Janeiro. Fotos constrangedoras daquele encontro entraram para o anedotário
nacional. Desde então, Costa Neto tem se notabilizado pela adulação aos governantes
de ocasião, independentemente de suas colorações partidárias ou ideologias. A
tática de deixar a coerência – e os escrúpulos – de lado para parasitar o poder
ao longo de todos esses anos rendeu bem mais do que projeção política ao chefão
do PL.
Em 2012, Valdemar Costa Neto foi condenado
pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 7 anos e 10 meses de prisão pelos crimes
de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito do mensalão petista. Como
cacique do PR, partido que depois seria rebatizado de PL, foi um dos artífices
da montagem do esquema para compra de apoio parlamentar no primeiro mandato do
petista Lula da Silva na Presidência. Costa Neto cumpriu parte da pena até 2014
e, dois anos depois, o STF declarou extinta sua punibilidade por aqueles crimes.
Do ponto de vista jurídico, portanto, Valdemar Costa Neto é um cidadão quites
com a Justiça. O que merece consideração são as circunstâncias de sua
reabilitação política e o estado da democracia representativa no
Brasil.
Alguém com um passado tão desabonador como
Valdemar Costa Neto ainda ter relevância política em 2022 só é possível porque
Bolsonaro é um presidente incapaz de governar o País e não tem densidade moral
e política para construir uma base de apoio parlamentar genuinamente fiel a seu
governo, seja por princípio, seja por afinidade programática. Até o célebre
Eduardo Cunha se sentiu encorajado a voltar para a Câmara dos Deputados nesse
ambiente.
Dependente do Congresso para se manter no
cargo, Bolsonaro se entregou para todos os que estivessem dispostos a carregar
o fardo, pagando em troca dotes para lá de generosos. Ao ingressar no PL e
abraçar o Centrão, tão demonizado pelos bolsonaristas, o presidente disse se
sentir “em casa”. É nesse contexto que ganham projeção figuras como Valdemar Costa
Neto, altamente experientes em aproveitar as deficiências de presidentes
fracos.
A longevidade política de Valdemar Costa
Neto e de outros da mesma estirpe também lança luz sobre a enorme incapacidade
dos partidos – ou a falta de estímulo popular – para arejar suas propostas,
trazê-las para o século 21 e, sobretudo, formar novas lideranças. Cabe somente
aos eleitores mudar essa realidade a partir de suas escolhas nas urnas.
Enquanto os eleitores permitirem, velhos
caciques continuarão ditando os rumos do País, atendendo ao interesse público
apenas quando e se este coincidir com seus interesses paroquiais.
Lula promete arruinar a Petrobras
O Estado de S. Paulo
Lula rejeita a política de desinvestimento
da Petrobras que vem permitindo à empresa se reerguer depois do saque do PT.
Prometeu a volta da velha política petista
Lula da Silva falando sobre como a
Petrobras deve funcionar é o equivalente a Jair Bolsonaro discorrendo sobre as
melhores práticas em defesa dos direitos humanos. É um deboche que o PT, depois
do assalto e do aparelhamento político que realizou na petroleira, deixando-a
endividada e vulnerável aos mais diversos aproveitadores, venha dizer ao País o
que deve ser feito na empresa.
Diante de tudo o que foi revelado – e, vale
lembrar, nada foi negado pela Justiça –, Lula deveria pedir perdão aos
brasileiros pelo que seu partido fez com a petrolífera. No entanto, além de
agir como se o petrolão não tivesse existido, como se o País não tivesse
presenciado a brutal história de corrupção envolvendo o PT e a Petrobras,
o ex-presidente anunciou que, caso volte ao
poder, retomará os mesmos passos que levaram a empresa ao endividamento recorde
e ao seu aparelhamento político.
Na terça-feira, Lula chamou de “destruição
da Petrobras” o plano de desinvestimentos que vem sendo implementado desde o
governo de Michel Temer e precisamente tem permitido à empresa reequilibrar sua
dívida e retomar sua vitalidade. “Esse país precisa ter novas refinarias, ou
pegar as que estão velhas e sucateadas e fazer uma renovação nelas”, disse, em
defesa da antiga política petista de expansão de refino. Ou seja, Lula quer a
volta da política que ajudou a produzir os escândalos e os bilionários
prejuízos da Petrobras. É assombroso.
O ex-presidente petista prometeu também a
reedição da “política de fortalecimento das empresas nacionais”. O País bem
sabe o que isso significa num governo do PT. Não é fortalecimento do ambiente
de negócios, aumento da produtividade nacional ou mesmo inserção da indústria
nas cadeias de produção global. É, ao contrário, aquele ambiente fechado e
atrasado, no qual políticos detêm poder discricionário sobre a atividade
econômica, estabelecendo incentivos para alguns poucos amigos que, depois, são
instados a retribuir ao partido e a suas lideranças as benesses recebidas.
Segundo Lula, é preciso “construir uma
narrativa” diferente a respeito da relação entre o PT e a Petrobras. A tal
narrativa petista, que Lula pede à militância que difunda País afora, é
manifesta desinformação, misturando negacionismo com teoria da conspiração. O
líder petista quer que os brasileiros se esqueçam das evidências trazidas por
investigações policiais, confissões e mesmo devoluções de dinheiro desviado, e
acreditem que a Petrobras teria sido saqueada não pelo PT, por Eduardo Cunha ou
por tantos condenados no esquema do petrolão, mas pela Lava Jato em parceria
com os Estados Unidos. Parece loucura, mas essa é a tese petista: a Lava Jato e
os Estados Unidos seriam os causadores do rombo da Petrobras.
Por óbvio, Lula não tem nenhuma solução a
oferecer sobre a Petrobras ou mesmo sobre política de preço de combustíveis.
Recorre à alta da gasolina apenas para desinformar e para propagar propostas
populistas, que, além de equivocadas, são o ambiente propício para a corrupção
e o aparelhamento da máquina pública. “Quando o petróleo é nosso, a gasolina é
mais barata, o óleo diesel é mais barato, o gás é mais barato”, disse Lula,
reiterando a tese petista de que o aumento dos combustíveis seria causado pelo
repasse do lucro aos acionistas da Petrobras.
Perante tantas patranhas, é útil recordar algumas verdades fundamentais, como fez o ainda presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, justamente no mesmo dia em que Lula prometia bagunçar a Petrobras para atender a seus projetos de poder. Lembrou que, por lei, a petroleira “não pode fazer política pública” com os preços dos combustíveis e “menos ainda” política partidária. “Empresas que tabelaram combustíveis tiveram perda de capacidade de investimento”, disse. “Essa dívida ‘monstra’ da Petrobras foi de tabelamento de preço.” Foi por pensar assim, em primeiro lugar na Petrobras e no País, deixando em segundo plano os imperativos eleitoreiros do presidente Bolsonaro, que Silva e Luna foi demitido – e, fosse Lula o presidente, teria tido o mesmo destino.
Comunicação pública, benefícios privados
O Estado de S. Paulo
Os órgãos de controle e o eleitorado precisam estar atentos ao uso da máquina pública nas campanhas
Do que se tem notícia, o astronauta Marcos
Pontes passou seus três anos de comando do Ministério da Ciência e Tecnologia
no mundo da lua. Sua pasta foi um exemplo de inoperância, enquanto no mundo
sublunar seu chefe disseminava obscurantismo e desmantelava órgãos de pesquisa.
A poucos minutos do jogo entre Brasil e Bolívia pelas eliminatórias da Copa,
Pontes surgiu em cadeia nacional para louvar os triunfos científicos do
governo.
Pontes é um dos oito a dez ministros que
devem deixar o cargo para disputar as eleições, na maior debandada desde a
redemocratização. Serão cerca de 40% das pastas. Nos outros governos o índice
variou entre 20% e 30%.
O pronunciamento em cadeia nacional é um
instrumento crucial da comunicação pública conferido aos Poderes da República e
ministros de Estado para divulgar assuntos de interesse nacional.
É difícil imaginar um assunto de maior
interesse do que a pandemia de um vírus letal – tanto mais por ter sido
acompanhada de uma feroz “infodemia” –, que impactou todos os âmbitos
administrados na Esplanada dos Ministérios.
Mas em 2020, nenhum ministro falou à
população em cadeia nacional. Era o auge do pânico – mas longe das eleições
federais. Em 2021, foram oito pronunciamentos. Nos três meses de 2022, já foram
seis – cinco por pré-candidatos.
O Ministério Público (MP) também acusa o
uso de aviões da FAB por parte de ministros para participar de eventos de
natureza eleitoral. Segundo o MP, Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e
Fábio Faria (Comunicações) teriam se deslocado para compromissos oficiais e
realizado “pedido explícito de votos”. Outros, como Ciro Nogueira (Casa Civil)
ou Marcelo Queiroga (Saúde), também fizeram uso incomum das aeronaves para
participar de eventos em seus redutos eleitorais.
Há poucos dias, funcionários da TV Brasil
divulgaram nota protestando contra o aparelhamento da emissora: desde que foi
fundida com a emissora do governo (TV NBR), multiplicam-se as entrevistas com
ministros e quadros do governo e censuras internas a matérias críticas ao
Planalto. “Não há mais como o telespectador diferenciar o que é comunicação
pública”, diz a nota, “e a TV do governo, com conteúdo pago por contrato com a
Secretaria de Comunicação.”
Enquanto os correligionários de Jair
Bolsonaro tentam censurar artistas, sua propaganda corre solta na TV, rádio,
rede digital, comícios, motociatas, igrejas e compromissos oficiais. É público
e notório que Bolsonaro, seguindo os passos de seu antípoda, Lula da Silva,
jamais tirou os dois pés do palanque. A diferença é que agora é ele quem tem as
duas mãos na máquina pública.
É flagrante que figuras alçadas da mais
espessa obscuridade para a Esplanada dos Ministérios, como Abraham Weintraub ou
Damares Alves, usaram suas pastas para se autopromover. Agora outros
pré-candidatos entram na dança. Os órgãos de controle precisam estar com os
olhos bem atentos a esses abusos. Mas o maior controle é do eleitor. Cabe a
ele, nas urnas, afastar da máquina pública tantas mãos que a manipulam para
suas ambições privadas.
Até um bom acordo com FMI divide o governo
argentino
Valor Econômico
A divisão interna pode sepultar as
pretensões de Cristina e de Fernández
O Fundo Monetário Internacional fez um
acordo com poucas exigências para refinanciar US$ 45,5 bilhões de dívidas da
Argentina, com 4,5 anos de carência. O Fundo aceitou as premissas de um
programa basicamente elaborado pelo governo argentino, sem exigir reformas
relevantes e mantendo espaço para o crescimento das despesas públicas. Poderia
ser um momento de alívio para o presidente Alberto Fernández, mas o mundo está
prestes a cair em sua cabeça depois que a vice-presidente Cristina Kirchner se
opôs ao acordo e os deputados e senadores kirchneristas votaram contra ele. O
Congresso o aprovou por ampla maioria, mas o racha entre as duas alas
governistas pode se tornar irreversível.
O Fundo já havia emprestado com muita
rapidez US$ 45 bilhões ao governo liberal de Mauricio Macri e teve sua
reputação arranhada. O maior empréstimo stand by da história da instituição foi
um fracasso, nenhuma de suas metas foi cumprida e ajudou a sepultar a reeleição
de Macri. É o que teme agora Cristina Kirchner, para quem as chances de
Fernández se reeleger tornaram-se remotas se o governo atender às parcas
exigências do Fundo. Ela cogita desembarcar do governo ou seguir manifestando
sua contrariedade com os passos do presidente. Em ambos os casos, a estratégia
pode aumentar as chances do kirchnerismo e de seu filho, o deputado Máximo
Kirchner, de disputar a Presidência nas eleições de 2023.
O Fundo voltou a repetir a avaliação de seu
staff que a “dívida argentina é sustentável, mas não com alta probabilidade” e
percebeu dissonâncias na Casa Rosada sobre a natureza do programa. “O apoio
político pode ser frágil e potencialmente se enfraquecer antes das eleições de
2023, ou antes, se a confiança não for rapidamente reconstruída”.
Para além das dificuldades políticas, o
momento da conclusão do acordo não foi auspicioso. O entendimento foi anunciado
em 3 de março, pouco mais de uma semana depois que a Rússia invadiu a Ucrânia.
A guerra atinge diretamente pontos sensíveis do acordo. A inflação voltou a
disparar na Argentina, depois de ter fechado 2021 em 50,9%. O índice de preços
ao consumidor subiu 4,7% em fevereiro e seu núcleo, 4,5%. Os analistas privados
preveem novas altas em março e um avanço para a casa dos 60% anuais. O objetivo
a ser atingido no acordo é suave, prevê um recuo de 5 pontos percentuais por
ano durante os 30 meses de vigência e uma estabilização de 10% a 15% no médio
prazo - ainda assim, alta.
A Argentina teria de chegar ao fim do ano
com inflação entre 38% a 48%. Com uma queda de três pontos percentuais em
relação ao ano passado já se cumpriria o combinado. Mas ligado à inflação há um
aspecto chave do acordo, que é o da redução dos subsídios da energia em 0,6% do
PIB este ano. As cotações de energia e gás estão disparando no mundo inteiro e
a Argentina corre o risco de ter o fornecimento reduzido em pleno inverno. A
conta de subsídios totais foi de 3% do PIB em 2021 e tem de baixar para 2,2%
este ano, 1,9% em 2023. As atuais tarifas cobrem apenas 37% do custo da
eletricidade e 44% do gás.
Outro pilar do plano é o fim do
financiamento do déficit pelo Banco Central, fonte inflacionária. O BC terá de
reduzi-lo de 3% do PIB no ano passado para 1% em 2022 e 0,6% em 2023. Para
isso, terá de se financiar em pesos e reverter sua política de juros negativos.
A taxa paga para o Estado financiar a dívida de curto prazo subiu de 35% para
40,25% e a de médio, da faixa de 42 a 45% para 47% a 49,25%. Falta algum
caminho para se chegar a taxas reais e ele pode ser mais longo se a inflação
continuar subindo.
Quanto ao déficit primário, a curva
descendente recomendada é suave. De 3% do PIB no ano passado para 2,5% neste
ano e 1,9% em 2023. O governo não terá de cortar muito suas despesas, que
permanecerão ao redor de 20,7% do PIB porque se espera que a arrecadação
cresça. Mesmo assim, há a suposição do acordo de que a economia reduza sua velocidade
à potencial, saindo de algo como 4% este ano para 2% a médio prazo.
O governo argentino terá de ser um pouco
austero e disciplinado, mas estas virtudes não são comuns entre os ocupantes da
Casa Rosada e ainda menos visíveis nos peronistas. Os kirchneristas acham que a
dívida não deve ser paga porque foram dilapidadas por Macri, manipuladas com
fins eleitorais e que o país não tem condições de fazê-lo. A razão principal é
que não querem amarra de gastos para tentarem se manter no poder. Após o governo
perder a eleição legislativa de meio de mandato, sua divisão interna pode
sepultar as pretensões de Cristina e de Fernández.
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