O Estado de S. Paulo
Sem a cooperação governamental, a política
anti-inflacionária permanece como tarefa exclusiva do Banco Central
Exibindo mais otimismo do que o mercado, o governo continua apostando em crescimento econômico de 2,5% neste ano, mas sem prometer às famílias um custo de vida muito mais suportável. Fora do governo, têm melhorado a cada semana as projeções de aumento da produção, já elevadas a 2% no final da semana passada. Mas a alta de preços prevista para o ano – aquele terror vivido nas lojas, nos supermercados e nos endereços de serviços – permanece acima do teto da meta, fixado oficialmente em 4,5%. No mercado, a inflação estimada para 2025 ainda estava em 5,57% no final da semana passada, segundo o boletim Focus, publicado pelo Banco Central (BC). Nem o pessoal do Ministério da Fazenda tem mencionado projeções abaixo de 5%, mesmo com a expectativa de uma boa safra de comida.
Puxados pelo aumento da atividade e do
emprego, os salários têm crescido, permitindo aos brasileiros algum aumento de
consumo, condições de vida um pouco melhores e expectativas um pouco melhores.
Mas os preços continuam subindo e nenhum sinal de acomodação apareceu até agora
no horizonte da economia brasileira. O encarecimento da cesta básica já afetou
a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tornando mais
complicado o quadro eleitoral previsto para 2026. Ele se recusou a intervir nos
preços e, assim, evitou um erro perigoso e muito comum na história brasileira.
Ao evitar esse caminho, o presidente rejeitou
uma solução tão populista quanto enganosa, mas ainda falhou na escolha de uma
ação mais eficaz contra a inflação. A importação de alimentos foi uma
iniciativa de maior sentido prático, embora de efeito muito limitado naquele
momento. Uma ação mais clara e mais convincente na direção do equilíbrio
deveria incluir o ajuste das contas públicas por meio de uma firme contenção
dos gastos federais, sem aumento de tributos. O mero anúncio de um esforço de
contenção já poderia produzir efeitos positivos no setor financeiro e um
rearranjo de políticas em outros setores da economia. Mas contenção de gastos é
uma solução geralmente incompatível com os padrões políticos do presidente Lula
e das tradições dominantes no petismo.
Enquanto o presidente avança de acordo com
seus padrões, as tensões inflacionárias permanecem muito visíveis nas
estatísticas. Em março, a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), foi de 0,56%. É um número bem menor que o do
mês anterior (1,31%), mas ainda muito alto. O indicador subiu 2,04% ao longo do
primeiro trimestre e acumulou alta de 5,48% em 12 meses, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A meta central, um objetivo permanente, é uma
inflação de 3% a cada período equivalente a um ano. A margem de tolerância é de
1,5 ponto porcentual para mais ou para menos. Além de continuar muito longe do
centro, a taxa acumulada em 12 meses tem superado o teto da meta. No período
encerrado em dezembro de 2024, a variação foi de 4,83%.
Enquanto a inflação se mantém acima do limite
superior e muito longe da meta central, o governo segue seu dia a dia sem nada
fazer de relevante para frear o aumento de preços. Sem a cooperação
governamental, a política anti-inflacionária permanece como tarefa exclusiva do
Banco Central, isto é, da autoridade monetária mais visível e mais cobrável.
Para conter a inflação e tentar conduzi-la à meta, o Banco Central utiliza como
principal instrumento a taxa básica de juros. Encarecer o dinheiro, mantendo-o
caro pelo tempo julgado necessário, é sua forma de controlar a demanda por bens
e serviços e, assim, dificultar a elevação dos preços.
Juros altos são tão impopulares entre
consumidores e empresários quanto abominados por autoridades governamentais,
porque atrapalham a expansão dos negócios e reduzem os efeitos expansionistas
da política econômica. Durante semanas, o presidente americano, Donald Trump,
pressionou o presidente do Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados
Unidos, para afrouxar a política monetária. Ameaçou trabalhar pela demissão de
Jerome Powell, presidente do Fed, mas acabou recuando e tentando uma
pacificação.
No Brasil, o presidente Lula diminuiu há
tempos as pressões mais ostensivas sobre o presidente do Banco Central, Gabriel
Galípolo. Agora menos pressionado – pelo menos publicamente –, Galípolo
reafirma o compromisso de trabalhar para conduzir a inflação à meta e assume
com todas as palavras a intenção de ser, se necessário, o chato da festa. Ao
traduzir a chatice como a disposição de mandar recolher as bebidas quando todos
estão muito animados, Galípolo oferece uma boa descrição do condutor da
política monetária.
Dirigentes sérios de bancos centrais poderiam
ser mais agradáveis, mais festivos e bem menos incômodos, se as autoridades com
poder para gastar e escolher a destinação do dinheiro público fossem mais
contidas e mais cautelosas em suas políticas. Se agissem dessa forma, a
autoridade responsável, em última instância, pela preservação do valor do
dinheiro teria menos motivos para intervir e estragar a festa. Para testar essa
afirmação, basta olhar a história do Brasil.
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