Folha de S. Paulo
Mas o que aconteceu com os partidos de
direita que o PT, segundo Jefferson, comprava?
Há vinte anos, o então deputado Roberto
Jefferson deu
entrevista a esta Folha denunciando o mensalão.
Segundo Jefferson, o governo Lula estaria
pagando uma mesada para parlamentares que votassem a favor de suas propostas no
Congresso.
O escândalo
que se seguiu modificou profundamente a política brasileira, mas a
maior parte do público ainda não percebeu seus desdobramentos.
Em seu livro "Nervos de Aço" (Record, 2006), Jefferson deu mais detalhes sobre o que estava denunciando. Nos governos de direita, partidos como o PTB recebiam ministérios ou a chefia de órgãos públicos e ali cobravam suborno ("caixa dois") das empresas que faziam negócios com a administração pública.
Quando o PT chegou ao
governo, surgiu um problema novo: por diferenças ideológicas, o PT não queria
dar cargos aos aliados de direita. Passou então a cobrar o suborno das empresas
e distribuir o dinheiro para os aliados. A luta de Jefferson, ele diz com todas
as letras no livro, era pelo direito de coletar seu próprio caixa dois.
Mesmo petistas que reconhecem que o dinheiro
dado aos aliados era sujo nunca admitiram que organizaram a mesada. Nunca
saberemos se é verdade: a investigação deveria ter começado quebrando o sigilo
bancário de todos os parlamentares de direita que o PT, segundo Jefferson,
comprava.
Mas essa turma também se vendeu em outros
governos e ainda se venderia a muitos outros. Ninguém queria que abrissem o
bico.
O julgamento do mensalão deu ao STF um status
que ele nunca tinha tido. O STF já era responsável por julgar políticos, mas
isso nunca tinha acontecido, porque só a direita governou até 2003. E a direita
tinha uma blindagem, construída durante a ditadura e preservada na transição
para a democracia: maioria parlamentar permanente, predominância na mídia,
apoio da elite econômica.
É porque o STF começou a julgar políticos no
mensalão que os golpistas de Bolsonaro tiveram tantos aliados quando começaram
sua cruzada golpista. Para a extrema direita do Jair, os ataques ao STF são só
a página um do manual do ditador moderno, o mesmo que fizeram Chávez, Orban,
Erdogan; para o resto da direita, é uma maneira de ameaçar o STF: se vocês nos
julgarem como julgaram os petistas, vai dar ruim.
O mensalão tirou do PT o eleitorado de classe
média, que passou a associar o partido à corrupção.
Mas o que aconteceu com os partidos de direita que o PT, segundo Jefferson,
comprava?
Graças à onda de direita que derrubou o PT em
2016 e elegeu Bolsonaro em 2018, são os partidos mais poderosos do Brasil.
Desde a reforma política de 2017, vêm construindo máquinas partidárias
riquíssimas. O PL de Valdemar Costa Neto é o partido de Bolsonaro, o que faz
todo sentido: o golpe de 1964 também foi profundamente ladrão. O PP se federou
com o União Brasil e tornou-se a maior bancada do Congresso. Roberto Jefferson
está preso por ter atirado contra a polícia defendendo o golpe de Estado do
Jair.
Hoje em dia vivem de emendas que superam o
valor do mensalão em várias ordens de grandeza. Já se livraram do PSDB e
esperam, quando Lula sair de cena, se livrar do PT, reinando absolutos sobre o
orçamento público, contando com os bolsonaristas para ameaçar quem tentar
julgar seus esquemas.
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