quarta-feira, 25 de junho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

STF não deve abrir exceção ao julgar artigo do Marco Civil

O Globo

Excluir crimes contra honra da regra que responsabiliza plataformas por conteúdo favorecerá os criminosos

O julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet, retomado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira, já resultou em avanço considerável. A Corte formou maioria para tornar as plataformas digitais corresponsáveis pelo conteúdo que veiculam a partir do momento em que notificadas de violações à lei — e não apenas depois de a Justiça determinar a exclusão desse conteúdo. Sete dos 11 ministros votaram para considerar o artigo inconstitucional no todo ou em parte. Falta, porém, estabelecer de modo objetivo as regras que passarão a vigorar.

Em meio à regulação deficiente — resultado da omissão do Congresso, onde o PL das Redes Sociais não avançou —, as redes sociais se tornaram campo propício ao florescimento de ódio e crimes. Não se pode achar normal que sejam usadas para incentivar automutilação ou suicídio de crianças, articular massacres em escolas, disseminar extremismo ou organizar golpes contra a democracia, entre tantas outras aberrações. É preciso chamar as plataformas à responsabilidade.

No lugar do artigo 19, deverá entrar em vigor o mecanismo descrito no artigo 21 do Marco Civil (hoje aplicado nos casos de violação de intimidade): a responsabilidade das redes valerá a partir do momento em que notificadas pelas partes atingidas, sistema conhecido como notice and take down. Era o que previa o texto original da lei, depois modificado no Congresso.

A regra já está em vigor na União Europeia e tem se revelado factível. As evidências colhidas por lá mostram que a medida é necessária, mas ainda insuficiente para coibir totalmente as violações perpetradas nas redes, que continuam ocorrendo. Não se trata de censura, como alegam defensores do sistema atual. As redes terão liberdade para manter o que julgam ser legal — e certamente manterão (como tem ocorrido na Europa), pois disso depende seu modelo de negócios.

Os relatores dos casos em julgamento, ministros Luiz Fux e Dias Toffoli, votaram acertadamente pela inconstitucionalidade total do artigo 19. Mas o presidente de Corte, Luís Roberto Barroso, propôs abrir uma exceção: preservar o mecanismo do artigo 19 para crimes contra honra, como injúria, calúnia ou difamação. Sob o argumento de que a mudança comprometeria a liberdade de expressão, ele sugeriu que as plataformas continuem a ser corresponsáveis por tais crimes apenas depois de ignorar ordem judicial para remover conteúdos. A proposta foi endossada pelos ministros Gilmar Mendes e Flávio Dino e rejeitada por Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin, que acompanharam os relatores. O placar está, portanto, em 4 x 3 a favor da plena responsabilização das plataformas.

Barroso, Gilmar e Dino estão errados. Não faz sentido resolver apenas parte do problema. Redes sociais são hoje terreno fértil para injúrias, calúnias e difamações de toda sorte. A despeito dos danos graves às vítimas, tais conteúdos criminosos costumam gerar engajamento e lucro para as plataformas. Na prática, o mecanismo do artigo 19 incentiva a prorrogação das ofensas, já que não há responsabilidade jurídica das plataformas, mesmo quando o conteúdo é flagrantemente ilegal. Quando a sentença chega, o estrago está mais que consumado, e de pouco adianta posterior reparação. Depois da vida, a honra é o valor maior da dignidade humana. Por que protegê-la menos que outros direitos?

Faltam os votos dos ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia e Nunes Marques. Barroso tem dito que pretende buscar uma decisão consensual. É positivo que tente aparar as arestas, mas deve perseguir uma regulação adequada à gravidade do problema e à altura dos desafios atuais, e não tentar convencer os colegas que ainda não votaram a endossar uma regra frouxa, que continuará permitindo a criminosos cometer barbaridades atrás do biombo da liberdade de expressão, em benefício do modelo de negócios das plataformas digitais.

Trump é essencial para que cessar-fogo entre Irã e Israel seja duradouro

O Globo

Apesar de a trégua ter se revelado instável no início, todos os lados do conflito teriam a ganhar com ela

É fundamental o esforço do presidente americano, Donald Trump, para manter o cessar-fogo entre Israel e Irã anunciado na segunda-feira. A trégua foi testada nas primeiras horas por hostilidades de lado a lado. Apesar desses reveses, é preciso que o cessar-fogo tenha chances de pavimentar o caminho a um acordo duradouro.

Israel conseguiu, se não destruir, pelo menos retardar significativamente o programa nuclear e danificar o poderio militar iraniano. Trump comprovou a eficácia de suas bombas subterrâneas, demonstrou arrojo e ousadia ao tomar uma decisão que paralisou vários presidentes americanos e faturará politicamente se o ataque tiver bastado para interromper um conflito intratável. Por fim, os iranianos, ainda que derrotados, podem reivindicar a retaliação contra a principal base militar dos Estados Unidos na região, no Catar.

Quem tem mais a perder com o prolongamento da guerra é o próprio Irã. O país investiu anos e recursos para montar uma rede de aliados com capacidade de destruir Israel. Desde a barbárie terrorista do Hamas em 7 de outubro de 2023, porém, ela vem sendo desmantelada pelos israelenses.

O Hamas foi reduzido a ruínas em Gaza. O Hezbollah perdeu lideranças, suas bases e o poder que tinha no Líbano. O regime de Bashar al-Assad foi derrubado na Síria. Os houthis iemenitas têm sofrido bombardeios regulares. Para completar, Israel dizimou proteções antiaéreas, mísseis balísticos e lideranças iranianas, deixando o próprio Irã vulnerável. Rússia e China não demonstram o menor interesse em ajudar seu aliado na região.

Para Israel, o temor de um Irã nuclear é hoje muito menor. As principais instalações foram atingidas e, ainda que o programa iraniano não tenha sido “obliterado” como disse Trump, a bomba atômica se tornou uma fantasia bem mais distante para os aiatolás. Há ainda o fator de dissuasão. Eles sabem que, a qualquer indício de produção de armas nucleares, estarão sob a mira não apenas dos aviões israelenses, mas também da artilharia americana.

Para Trump, uma guerra prolongada seria um estorvo. É certo que ele faria de tudo para evitar o envio de tropas terrestres. A ala isolacionista do trumpismo é veementemente contrária a intervenções militares no exterior. Outro risco seria a explosão da inflação. Num conflito mais longo, o Irã poderia tentar fechar acesso ao Golfo Pérsico, levando o petróleo para as alturas.

Embora todos os lados tenham razões para encerrar o conflito, as primeiras horas do cessar-fogo mostram que não será tarefa fácil. Cabe a Trump usar seu poder de persuasão de modo mais eficaz para que a trégua vingue.

País melhora competitividade, mas terá que se esforçar mais

Valor Econômico

A trajetória da posição brasileira no Ranking Mundial de Competitividade desde 2011 sugere uma estagnação, sempre entre os últimos lugares

O Brasil recuperou sua melhor posição em cinco anos no tradicional ranking de competitividade elaborado pelo International Institute for Management Development (IMD), da Suíça, em colaboração com o Núcleo de Inovação e Tecnologias Digitais da Fundação Dom Cabral (FDC), do Brasil. Mas nada indica que conseguirá avançar mais ou até mesmo manter a posição na próxima avaliação. Os pontos fortes que garantiram a escalada, como o crescimento da economia, devem perder impulso. Além disso, os problemas estruturais já crônicos, como o custo do crédito e a educação, não estão sendo enfrentados com eficiência.

A posição brasileira no Ranking Mundial de Competitividade passou da 62 colocação para a 58 entre 2024 e 2025. Mas já teve melhor classificação. Em 2021, ocupou o 57 lugar e, há dez anos, em 2011, o 56. Ou seja, a trajetória do país nesse período sugere uma estagnação, sempre entre os últimos lugares. No ano passado, 69 países foram analisados. Na América Latina, o Brasil ficou atrás do Chile (42 lugar), Colômbia (54) e México (55) e à frente apenas da Argentina (62) e da Venezuela (69), o que não mostra grande mérito.

O ranking do IMD é baseado na análise de quatro fatores: performance econômica, eficiência governamental, eficiência empresarial e infraestrutura. Dentro de cada fator, são examinados subfatores totalizando 336 indicadores que determinam a classificação.

Entre os quatro fatores, a melhor posição brasileira no novo ranking é em performance econômica, na qual aparece em 30 lugar, favorecido pelo aumento de 3,4% do Produto Interno Bruto (PIB). O fluxo de investimento direto estrangeiro e o crescimento de emprego no longo prazo pesaram positivamente na classificação. A taxa de desemprego foi de 6,6% em 2024, a menor da série histórica da Pnad Contínua, iniciada em 2012 pelo IBGE. Do outro lado, há deficiências na exportação de serviços, na receita de turismo e no comércio internacional.

Já a pior classificação do Brasil é no ranking de eficiência governamental: é o penúltimo lugar, só à frente da Venezuela. Nesse fator, os pontos fracos são custo de capital (69 lugar), protecionismo (68) e finanças públicas (67). Em política tributária, o país está em 47 lugar. Para o IMD, reverter esse quadro passa pela simplificação e pela digitalização de processos regulatórios, maior responsabilidade fiscal, mais transparência e controle de despesas, velhas recomendações que não têm tido muita repercussão.

Em relação à eficiência empresarial, apesar de se situar em 8 lugar em iniciativa empreendedora, os brasileiros enfrentam problemas de custo de capital e financiamento da dívida corporativa (68 lugar), indicando a dificuldade e o preço alto para obter recursos para investimentos, expansão e inovação. A recente elevação da Selic a 15% ao ano, com a perspectiva de que permanecerá em patamar elevado por um longo período, indica que não haverá alívio nessa frente. A situação não é melhor em mão de obra qualificada (68), produtividade e eficiência (59) e práticas gerenciais (48).

No fator infraestrutura, os contrastes são mais acentuados. Baixo custo comparativo de energia móvel coloca o Brasil em 15 lugar nesse ranking, em que fica em 21 em exportação de serviços de TI e comunicação, e em quinto em energia renovável. Já na infraestrutura básica e na tecnológica cai para o 52 e o 57 lugares, respectivamente. Mas a pior colocação é em educação (65), ficando em penúltimo lugar no ranking em educação primária e secundária, e em último em habilidades linguísticas.

A educação é uma das áreas em que o Brasil mais parece patinar. Apesar dos esforços feitos, falha em atingir as metas qualitativas e até as quantitativas. Recente Pnad Contínua Educação mostrou algum avanço no ensino superior, na instrução básica, na redução do analfabetismo e do abandono escolar. No entanto, diversas metas do Plano Nacional de Educação (PNE) não foram cumpridas e ainda estão distantes.

Algumas das metas que provavelmente não serão atingidas são ter nas creches 50% das crianças de 0 a 3 anos; alcançar a universalização da escolarização para as faixas de 4 e 5 anos e de 15 a 17 anos; e erradicar o analfabetismo. No grupo de 4 a 5 anos, o percentual de crianças na escola subiu para 93,4% em 2024, mas ainda fica abaixo da universalização do PNE. Na faixa de 15 a 17 anos, 93,4% estão matriculados, também abaixo da universalização. Só na faixa de 6 a 14 anos, 99,5% estavam matriculados em 2024.

As crianças e jovens podem até estar nas escolas, mas o aprendizado deixa a desejar. As falhas são ainda piores nos testes de avaliação de conhecimento. As provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2023, compilados pela ONG Todos pela Educação, mostraram que a parcela dos jovens com conhecimento adequado não passa de 5,2% em matemática e de 32,4% em português.

Melhorar a competitividade do Brasil no cenário internacional certamente não é uma tarefa simples dada a complexidade da questão, os vários fatores envolvidos e as desvantagens crônicas do País. Mas aprimorar o desempenho na Educação é um ponto de partida imprescindível.

Brasil tem saneamento de país subdesenvolvido

Folha de S. Paulo

Segundo o Banco Mundial, país estava atrás da Índia em 2022; expansão depende de investimento privado e saúde econômica

No panorama global, o Brasil é um país remediado —isto é, longe da bonança dos ricos, porém a uma distância considerável dos miseráveis. Ocupa o 84º lugar entre 193 países no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medida da ONU que leva em conta renda per capita, expectativa de vida e escolaridade.

Essa posição intermediária pode camuflar, entretanto, as profundas disparidades nacionais, entre estratos sociais, regiões geográficas e também indicadores de bem-estar social. Um exemplo evidente de setor em que não superamos o pior do subdesenvolvimento é o saneamento básico.

Conforme a Folha noticiou, estatísticas do Banco Mundial mostram que em 2022 menos da metade da população brasileira (exatos 49,6%) tinha acesso a coleta e tratamento de esgoto. Deplorável por si só, o dado expõe um vexame na comparação internacional.

Naquele ano não muito distante, países mais pobres ostentavam índices melhores, casos de Índia (52,1%), Iraque (52,8%), Paraguai (55,2%) e África do Sul (71,7%). Ficamos também abaixo da média global, de 56,6%.

O número oficial mais recente, 55,2% em 2023, parece indicar um avanço, mas a base de dados do Banco Mundial não permite o cotejo no período. O fato é que o Brasil só recentemente tomou providências essenciais para enfrentar um atraso de décadas.

Não sem resistências corporativistas e ideológicas, foi aprovado em 2020 o novo Marco Legal do Saneamento, que abriu caminho para maior investimento privado no setor a fim de cumprir metas de universalização dos serviços até o início da próxima década.

O diploma, felizmente, sobreviveu às investidas do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em favor da obsoleta hegemonia das estatais —cujos resultados expõem a ineficácia de modo eloquente.

Impactos da nova legislação já se fazem sentir. No ano passado, com o impulso da desestatização da gigante paulista Sabesp, o atendimento privado chegou a 30% dos municípios brasileiros, seis vezes o percentual observado em 2019, antes da implementação do marco regulatório.

O setor público não dispõe dos recursos capazes de viabilizar os investimentos necessários para a universalização, estimados em R$ 45,1 bilhões anuais ao longo do próximo decênio. Já houve aumento expressivo nos últimos anos, de R$ 18,8 bilhões em 2021 para R$ 25,6 bilhões em 2023.

A expansão dos serviços depende do mercado. Reportagem do jornal Valor Econômico informa que os leilões de concessão devem somar neste ano R$ 27 bilhões em aportes no setor. Há obstáculos, no entanto.

Entre os principais, obviamente, estão os juros básicos de 15% anuais aplicados pelo Banco Central para conter a inflação elevada pelos gastos excessivos da administração petista. O cumprimento da promessa de universalização não depende da benevolência dos governantes, mas de regras estáveis e boa saúde econômica.

É preciso preservar a lei Cidade Limpa

Folha de S. Paulo

Projeto que desfigura o diploma exige debate transparente para impedir retrocessos no controle da poluição visual em SP

A lei Cidade Limpa, aprovada em 2006, diminuiu de forma significativa a poluição visual na cidade de São Paulo, ao restringir e regular a exposição de propaganda e a sinalização em fachadas de comércios.

Agora, uma proposta em tramitação na Câmara Municipal pode desfigurar a lei, aprovada por 93% dos paulistanos, segundo levantamento da Offerwise, empresa especializada em pesquisa de mercado na América Latina.

Causa espécie o açodamento da votação em primeiro turno, realizada no final de maio, de um projeto capaz de impactar para pior a paisagem urbana local.

Enquanto a norma atual veta ocultar qualquer fração da fachada de bens de valor cultural, como prédios históricos, a proposta de autoria do vereador Rubinho Nunes (União Brasil) autoriza cobrir até 70% da fachada desse tipo de imóvel com painéis de LED.

Um dos artigos desfaz quase todas as proibições referentes à exploração publicitária de espaços públicos, como ruas, praças, postes, viadutos, entre outros.

Nunes diz que esse dispositivo será derrubado e que o foco é criar uma Times Square —referência à famosa rua de Nova York conhecida pela profusão de painéis luminosos— em algum ponto restrito da capital. De acordo com o vereador, a iniciativa traria ganhos ao incentivar o turismo.

A ideia não é nova. Como noticiou a Folha em 2023, a gestão municipal de Ricardo Nunes (MDB) e a estadual de Tarcísio de Freitas (Republicanos) avaliavam formas de implementar uma demanda de empresários do centro —transformar a esquina das avenidas Ipiranga e São João numa versão da praça novaiorquina e criar ali um corredor turístico com casas de shows e hotéis.

O interesse do poder público seria direcionar o dinheiro arrecadado para revitalizar a região.

Sobre o projeto de lei, o prefeito Ricardo Nunes afirmou que não apoia desfigurar o diploma vigente, mas disse ser favorável à "criação, em pouquíssimas ruas específicas, de uma espécie de Times Square, com o intuito de requalificar a avenida São João".

Mesmo com a lei, observam-se hoje irregularidades. Especialistas apontam preocupação com a proposta em tramitação, que pode gerar mais retrocessos.

A notícia menos má foi a abertura de audiências públicas nas próximas semanas, com participação da sociedade, para discutir as alterações até a segunda e derradeira votação.

Espera-se que o debate se dê de forma transparente e que os vereadores preservem esse importante mecanismo de controle da poluição visual em São Paulo.

BC faz a coisa certa, por enquanto

O Estado de S. Paulo

Ao elevar os juros básicos para 15%, o BC sepulta a chance de uma redução até o início de 2026 e irrita os petistas. Resta saber se, no ano eleitoral, o banco resistirá à pressão de Lula

Em um momento de tantas incertezas, a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) serviu para o Banco Central (BC) deixar claro que não há qualquer possibilidade de que a taxa básica de juros caia tão cedo. O receio no mercado financeiro residia no fato de o BC ter sinalizado, na semana passada, que o aumento dos juros em 0,25 ponto porcentual, para 15% ao ano, seria o último de um ciclo iniciado em setembro do ano passado. Isso abriu espaço para especulações sobre a hipótese de o Copom iniciar os cortes na Selic no primeiro trimestre de 2026, a poucos meses das eleições presidenciais.

A ata demonstra que o BC tem feito um bom uso da autonomia que o Congresso Nacional lhe garantiu por lei. Com sete dos nove membros indicados pelo presidente Lula da Silva e comandado pelo “menino de ouro” Gabriel Galípolo, o BC decidiu, por unanimidade, elevar a Selic ao maior nível desde julho de 2006. Não é pouca coisa, sobretudo quando praticamente metade do mercado financeiro tinha bons motivos para apostar na manutenção dos juros em 14,75% ao ano.

O fato é que até mesmo quem se surpreendeu com a decisão gostou dela. As expectativas para a inflação deste ano e do próximo permanecem acima da meta, respectivamente em 5,2% e 4,5%, segundo o boletim Focus, assim como os núcleos, que expurgam itens com preços mais voláteis e explicitam a tendência dos preços de forma geral.

A taxa de desemprego permanece em níveis historicamente baixos, o crédito continua pujante, sobretudo o crédito direcionado, e a atividade ainda apresenta dinamismo, muito embora o BC considere que já há certa moderação no crescimento em setores mais sensíveis ao ciclo econômico, como comércio, serviços e indústria. Por isso, manter os juros em 15% ao ano por “período bastante prolongado” será essencial para que os efeitos dessa desaceleração se consolidem.

Também houve recados para o governo. O Copom destacou que uma política fiscal previsível, crível e anticíclica – o exato oposto do que o Executivo tem feito – ajudaria a conduzir a inflação à meta. O BC mencionou ainda que o debate entre governo e Congresso sobre o peso do gasto tributário no Orçamento é um fator que pode afetar a percepção dos investidores sobre a sustentabilidade da dívida e, consequentemente, o prêmio da curva de juros.

“Na discussão sobre esse tema, a principal conclusão obtida e compartilhada por todos os membros do comitê foi de que, em um ambiente de expectativas desancoradas, como é o caso do atual, exige-se uma restrição monetária maior e por mais tempo do que outrora seria apropriado”, sacramentou a ata, ressaltando que o ideal seria que as políticas fiscal e monetária atuassem de forma alinhada.

Como não existe a menor chance de que isso ocorra, resta ao BC manter os juros nas alturas e ao governo espernear. E foi o que a tropa de choque de Lula da Silva fez. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, considerou “incompreensível” a decisão do Copom. “O Brasil espera que este seja de fato o fim do ciclo dos juros estratosféricos”, afirmou, em suas redes sociais. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, disse que a taxa era “indecente e proibitiva”. “Não dá para aceitar como normal o novo aumento da Selic pelo Banco Central”, declarou, também por meio de suas redes sociais. E alguns dos candidatos à presidência do PT foram ainda mais incisivos. “Galípolo não é amigo. É inimigo”, disse Valter Pomar, segundo a Coluna do Estadão.

Juros elevados serão um obstáculo adicional à recuperação da popularidade de Lula da Silva, mas o governo não pretende ficar parado esperando a economia esfriar. O presidente aposta em medidas para colocar o novo Auxílio Gás para rodar e lançar o crédito para entregadores de aplicativos adquirirem motocicletas e uma linha de financiamento para reforma de casas. São iniciativas como essas que explicam a resiliência das expectativas de inflação e reforçam o acerto da mais recente decisão do Banco Central. A dúvida é se a instituição saberá resistir à enorme pressão que virá nos próximos meses.

Entre a diplomacia e a tragédia

O Estado de S. Paulo

A ofensiva militar contra o Irã criou uma chance rara de paz. O desafio agora é político: conter o Irã sem ilusões e consolidar uma nova ordem regional com pragmatismo e pressão internacional

A trégua entre Israel e Irã, selada após quase duas semanas de confrontos e bombardeios de alta intensidade, não encerra uma guerra – apenas suspende seus fogos. E, ainda assim, representa uma inflexão estratégica. A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de ordenar ataques cirúrgicos às instalações nucleares iranianas, amparando militarmente uma campanha israelense já em curso, foi uma aposta de alto risco. Mas, ao menos por ora, se pagou. O Irã recuou. Israel colheu vitórias substanciais. E os Estados Unidos reafirmaram sua primazia regional.

Contudo, seria um erro confundir vantagem militar com solução política. A paz ainda está longe de ser consolidada. A ofensiva pode ter desorganizado a teocracia iraniana, mas não a destruiu. Seu regime permanece no poder, humilhado, imprevisível e perigosamente encurralado. Se mal administrado, este momento de vantagem pode degenerar em tragédia. Se bem aproveitado, pode abrir um caminho – estreito, mas real – para uma nova arquitetura de estabilidade no Oriente Médio.

Trump merece crédito pelo pragmatismo tático. A operação foi precisa, limitada e eficaz. Os alvos nucleares foram duramente atingidos, sem provocar mortes americanas nem ampliar a escalada para além do controle. A resposta iraniana – um ataque telegrafado à base de Al Udeid, no Catar, sem vítimas – mostrou que, por trás da retórica incendiária, Teerã ainda opera com racionalidade estratégica. A prioridade do regime continua sendo a sobrevivência, não o martírio.

Mas o sucesso militar não elimina as incertezas. Não se sabe se o Irã foi, de fato, impedido de produzir armas nucleares. Também é incerto se aceitará negociar sob pressão, ou apenas ganhará tempo enquanto reconstrói sua capacidade em segredo. O risco de reconstituição do programa nuclear, de apoio renovado a milícias como o Hezbollah ou os houthis, e de ações clandestinas contra alvos israelenses ou americanos é real. A vigilância deve ser constante.

É nesse ponto que a diplomacia se impõe. Trump afirmou que “agora é hora de paz”. Se acredita nisso, deve abandonar fantasias maximalistas. A exigência do fim total do enriquecimento de urânio ou a retórica triunfalista de mudança de regime apenas reforçará os setores mais duros do establishment iraniano. A alternativa – mais realista e eficaz – passa por um acordo em que o Irã interrompa o enriquecimento para fins militares e aceite inspeções intrusivas, em troca de algum grau de capacidade civil, operada por consórcio regional sob supervisão internacional.

O regime iraniano não merece confiança. Sua conduta – da repressão doméstica ao patrocínio de grupos terroristas – comprova seu caráter delinquente. Por isso, qualquer negociação deve ser acompanhada de forte pressão internacional, de mecanismos de verificação robustos e de garantias críveis para Israel quanto à contenção de armamentos convencionais e ao fim do apoio a milícias extremistas.

Ao mesmo tempo, a nova correlação de forças cria oportunidades. Israel, fortalecido, pode negociar a partir de uma posição vantajosa. O enfraquecimento dos aliados iranianos na região – e o alívio de líderes árabes, mesmo entre os que protestaram publicamente – sinaliza que uma coalizão pela estabilidade é possível. Trump, por sua vez, detém agora uma alavancagem inédita sobre Binyamin Netanyahu. Deveria usá-la para forçar um cessar-fogo em Gaza condicionado ao retorno dos reféns, e iniciar, com apoio árabe, um processo sério de reconstrução política palestina. A paz duradoura no Oriente Médio exige também uma solução para o conflito israelo-palestino.

Os próximos passos definirão o legado dessa ofensiva. A alternativa à diplomacia – o retorno à guerra – é sombria. Mas ignorar a nova oportunidade aberta pela contenção do Irã seria tão temerário quanto ceder a seus avanços nucleares. Entre a força e a conciliação, Trump encontrou um ponto de equilíbrio momentâneo. Para consolidá-lo, precisará liderar com firmeza e realismo. A vitória tática já ocorreu. Evitar a tragédia – e construir algo mais duradouro – será a verdadeira prova de sua presidência.

O interesse pela Foz do Amazonas

O Estado de S. Paulo

Disputa de multinacionais por áreas petrolíferas na Margem Equatorial reforça potencial da região

O resultado do leilão de áreas de petróleo realizado neste mês pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) confirmou não apenas o interesse da indústria pela Margem Equatorial, que desponta como a nova fronteira exploratória brasileira, mas também a confiança de que, finalmente, pode ter início a atividade em alto-mar na Bacia de Foz do Amazonas, onde a Petrobras busca autorização para perfurar o primeiro poço em um bloco adquirido há mais de uma década.

Foz do Amazonas concentrou a maior disputa, com 19 dos 34 blocos arrematados no leilão, e marcou o retorno de grandes multinacionais à região. Além da Petrobras, as norte-americanas ExxonMobil e Chevron, e a chinesa CNPC foram destaque na disputa, mas não por acaso. As três atuam na prospecção de petróleo na margem equatorial dos vizinhos Guiana e Suriname, transformados em novo polo petrolífero em razão das descobertas recentes de reservas de bilhões de barris.

Companhias estrangeiras, como Total e BP, abandonaram projetos na margem equatorial brasileira depois de esperarem por anos, em vão, pela licença do Ibama. A Petrobras manteve a concessão em Foz do Amazonas e somente há poucas semanas obteve permissão para deslocar ao local a sonda que fará um simulado de vazamento de óleo. Trata-se de um exercício que precede a concessão da licença, que nesse estágio só é negada em caso de incapacidade flagrante na contenção de acidentes.

Por óbvio, o progresso da Petrobras, após 12 anos de persistência, e o grande potencial que especialistas veem na região garantiram o interesse das petroleiras estrangeiras. Diante das incertezas de um mundo mergulhado em conflitos, que envolvem diretamente grandes produtores de petróleo, como Rússia e países do Oriente Médio, investir em novos campos é fundamental na busca de suficiência energética, mesmo em meio ao processo de transição para energias renováveis – até para financiar a transição, que tende a ser lenta e custosa.

O Brasil promoveu, em 2013, o leilão que ofertou blocos na Bacia de Foz do Amazonas e cujo imbróglio com o Ibama se arrasta até hoje. Será, no mínimo, uma leviandade repetir o embaraço nos blocos que acabam de ser concedidos pela ANP. É inquestionável a importância da avaliação dos impactos ambientais em uma atividade de alto risco como a de exploração de petróleo, mas é inaceitável que o exame dessas condições ultrapasse a barreira técnica para virar uma espécie de profissão de fé de ambientalistas mais preocupados com a repercussão midiática do que propriamente com a garantia da segurança da atividade.

É urgente descobrir se estão na Margem Equatorial os reservatórios que evitarão a maior dependência do Brasil à importação de derivados de petróleo a partir de 2032, como prevê a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). A Bacia de Campos, que foi o principal polo produtor, está em franco declínio, e a de Santos, que concentra o pré-sal, entrará em declínio até 2031. A de Foz do Amazonas, uma grande promessa, está emperrada pelo radicalismo ambiental.

Negacionismo conduz riscos à saúde pública

Correio Braziliense

Se a pandemia mostrou que as vacinas salvam vidas, a mudança desse cenário depende, principalmente, das famílias brasileiras

Esta vacina deixa uma cicatriz característica e eterna: uma bolinha no braço direito. Ela também protege contra a hanseníase, popularmente conhecida como lepra. - (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Criado pelo produtor de televisão canadense R. Scott Gemmill, a série The Pitt, exibida na Max, é uma das sensações do streaming em 2025. A produção se volta a um único dia em um hospital de pronto-socorro de Pittsburgh, na Pensilvânia. Dentro do equipamento de saúde, diversas nuances são problematizadas com foco nos desafios profissionais, humanos, morais e éticos enfrentados pelos trabalhadores da saúde. 

Em um dos episódios, a equipe coordenada pelo doutor Michael Robby se depara com uma família desesperada para descobrir a doença do filho. Após uma anamnese bastante desafiadora, o chamado diagnóstico por exclusão conclui que o pré-adolescente está com sarampo — doença controlada na maior parte dos países, inclusive no Brasil, graças à vacina tetraviral, que também protege contra a rubéola, a caxumba e a varicela. 

A reação da equipe de Robby em "The Pitt" é automática: questionar os pais sobre os motivos da não vacinação do filho e ressaltar que o imunizante existe e é aplicado sem custos, mesmo em um país com um sistema de saúde pública de alto custo, como os Estados Unidos. 

A partir dali, o que se vê no desenrolar do caso é uma mãe resistente ao tratamento médico por conta de informações falsas compartilhadas nas redes sociais. A resposta só é permitida com anuência do pai, que aproveita um momento de distração da progenitora para autorizar o combate à doença, que, só em 2025, infectou cerca de 1 mil pessoas nos EUA.  

A negação à vacinação infantil é um problema mundial e com reflexos no Brasil, como mostrou o Anuário Vacina BR, dissecado pelo Estado de Minas em matéria publicada na semana passada. No caso de Minas Gerais, as coberturas vacinais vêm caindo desde 2015, com quedas acentuadas a partir da pandemia de covid-19. A dificuldade é ainda mais crescente quando se olha para a adesão aos esquemas completos, ou seja, as imunizações que precisam de doses de reforço.

A publicação é resultado do cruzamento de dados públicos sobre vacinação com registros populacionais e de nascidos vivos e cobre o período de 2000 a 2023. De acordo com o estudo, a tríplice viral, que protege contra o sarampo e outras viroses, só teve sua meta de cobertura de 95% alcançada em quatro estados para a primeira dose. No entanto, nenhum deles conseguiu ultrapassar 80% de cobertura para o esquema completo, e 14 unidades federativas ficaram abaixo de 50%. 

Os dados ligam o alerta para um problema social de profundos reflexos para a saúde pública brasileira. Se a pandemia mostrou que as vacinas salvam vidas, a mudança desse cenário depende, principalmente, das famílias brasileiras, ainda que o poder público tenha que cumprir seu papel com a oferta de imunizantes de maneira descentralizada e com a elaboração de campanhas de conscientização. São os pais os principais responsáveis por essa proteção das crianças.

O combate ao negacionismo é o maior desafio nesse panorama. É necessário monitoramento contínuo das informações fraudulentas que circulam nas redes sociais, a partir de um protocolo de resposta assertivo e ágil. Iniciativas como a oferta da imunização nas escolas são bem-vindas, mas é por meio da comunicação governamental que esse retrocesso precisa ser freado.

Aumentam as queimadas no Brasil

O Povo (CE)

A grande oportunidade para o Brasil e o mundo discutirem como enfrentar a emergência climática, de modo a preservar o planeta, será a COP30, a ser realizada em Belém (PA), em novembro deste ano

Relatório do MapBiomas divulgado ontem mostra que no ano de 2024 foram registrados 30 milhões de hectares de queimadas em todo o País. De acordo com o levantamento, foi a segunda maior extensão que o fogo atingiu nos últimos 40 anos, com média de 62% acima do período entre 1995 e 2024.

Do total queimado, 72% foram áreas de vegetação nativa, com a cobertura florestal sofrendo o maior impacto, com 7,7 milhões de hectares incendiados.

Mais da metade da área atingida (15,6 milhões de hectares) concentrou-se na Amazônia, o maior número da série histórica. A alta de incêndio foi de 117% em relação à média dos últimos 40 anos.

Conforme o relatório da MapBio, pela primeira vez as florestas superaram as pastagens como a cobertura mais atingida, representando 43% da área queimada na região amazônica.

O Pantanal também sofreu com recordes negativos, mas todos os biomas, além dos já citados, tiveram perdas significativas causadas pelo fogo, como a mata atlântica, caatinga, cerrado e o pampa.

Em declaração à Agência Brasil, o coordenador de mapeamento da Amazônia do MapBiomas, Felipe Martenexen, afirma que a região foi muito afetada pelo fenômeno El Ninho, em 2023 e 2024, deixando o bioma mais seco e suscetível ao fogo. Mas ele também disse que foi necessária a ação humana para que os incêndios tivessem início.

Ou seja, o aumento das queimadas ocorre por dois fenômenos que podem ser controlados. Primeiro, aumentando a fiscalização para coibir a atividade dos incendiários; depois, implementando propostas para combater o aquecimento global. No entanto, essa última providência não depende apenas de iniciativas isoladas de cada país.

Quanto ao desmatamento, o levantamento do MapBio traz números positivos. Em 2024, pela primeira vez em seis anos, houve queda de desmatamento em todos os biomas, com exceção da mata atlântica, que permaneceu estável, mas apresentou queda de 60% no ano anterior.

A grande oportunidade para o Brasil e o mundo discutirem como enfrentar a emergência do clima, de modo a preservar o planeta, será a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), a ser realizada em Belém (PA), em novembro de 2025.

Sob a presidência brasileira, o Palácio do Planalto considera a COP 30 "uma oportunidade histórica para o Brasil reafirmar seu papel de liderança nas negociações sobre mudanças climáticas e sustentabilidade global".

No entanto, a responsabilidade do governo também aumenta perante ao mundo, tanto pelas medidas que tem de tomar em relação ao Brasil para a proteção do meio ambiente, quanto pelas metas ousadas contidas na carta assinada pelo embaixador brasileiro, André Aranha Corrêa do Lago, presidente da COP 30.

 

 

 

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