O Estado de S. Paulo
Os atritos políticos ao redor do pacote
fiscal vêm crescendo há dias e prometem ainda mais acirramento, dada a forte
oposição do Congresso às medidas adotadas pelo ministro Fernando Haddad.
Até agora, o governo Lula se recusou a passar o facão nas despesas públicas porque teme perder voto popular. E é um comportamento que se repete. Se tiver, por exemplo, de rever o critério de correção do salário mínimo, que atualmente leva em conta a inflação do ano anterior e o avanço do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes, para cortar despesas com aposentadorias e com o Benefício de Prestação Continuada (BPC), o presidente Lula imagina que enfrentaria reação negativa dos mais de 40 milhões de beneficiários do INSS e dos quase 6 milhões de beneficiários do BPC.
A lenga-lenga com esse pacote, a insistência
em basear o ajuste no aumento de impostos, mais a recusa do governo a reduzir
despesas, já começam a produzir enorme desaprovação entre as classes médias e
os outros segmentos formadores de opinião, como os índices de avaliação do
governo já vêm demonstrando.
Lula e Haddad dão mostras de má avaliação de
risco. Não parecem se dar conta de que os riscos políticos gerados com os
aumentos sistemáticos da carga tributária começam a ficar mais altos do que o
custo político que fosse provocado por medidas de austeridade fiscal.
Em outros termos, do ponto de vista dos
interesses eleitoreiros do presidente Lula, começa a ficar difícil conferir o
que é pior: se fazer o que tem de ser feito em relação aos cortes de despesas
ou se continuar a enfrentar as resistências políticas do Congresso e da
sociedade a esse pacote de renitente aumento de impostos.
Uma das características do jogo político, em
qualquer país e em qualquer época, é a de que a demonstração de fragilidade de
um ator político provoca o aumento de ataques dos seus oponentes com o objetivo
de desestabilizá-lo de uma vez. Alguns desses documentários da TV mostram que,
se um grupo de focas estiver mal acomodado sobre um bloco de gelo, o grupo de
orcas que o rodeia passa a agitar as águas ou a tentar revirar o bloco para
caçar as focas. É o que se vê hoje no Brasil. Aumentaram tanto os sinais de
fragilidade da jangada do presidente Lula que a oposição passou a redobrar suas
forças para inviabilizar seu governo e sua reeleição.
Do ponto de vista do funcionamento da
economia, já há um punhado de incertezas que provém dos desequilíbrios da
atividade global, como o tarifaço de Trump, a desorganização dos fluxos de
comércio mundial, a forte oscilação do valor das moedas e as guerras em curso.
E, na economia brasileira, há as incertezas
provenientes do agravamento das contas públicas e da dívida, da inflação que
roda acima do teto da meta e dos juros que têm de permanecer lá em cima por
muito tempo.
A esse cenário de incertezas, somam-se as
novas incertezas causadas pela perda de força política do governo Lula.
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