O Estado de S. Paulo
No banco dos réus, ex-presidente, generais e delegados federais deram um show sem graça e sem nexo
A estratégia do ex-presidente Jair Bolsonaro de encenar o boa gente, dizer que tudo foi só “retórico” e “desabafo”, fazer gracinha para o ministro Alexandre de Moraes e chamar golpistas de malucos foi um fiasco. Ele se submeteu ao ridículo à toa. Desagradou aos seguidores, não agradou a ninguém, não vai mudar o rumo do julgamento no Supremo nem teve algum ganho político ou midiático. Só perdeu.
O que fica de concreto da longa encenação de
Bolsonaro foi ele admitindo que, como presidente, buscou as Forças Armadas e
alimentou alternativas para impedir a posse de um sucessor legitimamente eleito
e se manter no poder. Isso é... tentar um golpe. E não tem graça nenhuma.
Se o principal personagem da fase de
testemunhas foi o brigadeiro Carlos Baptista Jr., quem se destacou na fase de
depoimentos dos réus do “núcleo crucial” do golpe foi o general Walter Braga
Netto. Baptista Jr., pela clareza e contundência ao confirmar a liderança de
Bolsonaro na trama. Braga Neto, no sentido oposto, por titubear, tentar
desmentir a delação do tenentecoronel Mauro Cid e negar provas óbvias,
inquestionáveis.
O brigadeiro já era alvo e se tornou inimigo
n.º 1 de Bolsonaro, enquanto o general, além de passar vergonha, usou o
depoimento contra si, cavou sua cova ainda mais fundo. Bolsonaro pelo menos
tinha uma estratégia, errada ou não, no cara a cara com Moraes. Braga Netto,
nem isso.
É constrangedor, quase claustrofóbico, ver um
ex-presidente no banco dos réus no STF, testando sua capacidade de enganar todo
mundo ao mesmo tempo, e ouvir generais de quatro estrelas negando cadernetas
manuscritas, vídeos gravados e mensagens de celular, inclusive insuflando as
corporações militares contra colegas legalistas e até suas famílias.
Também causa incômodo ver um almirante de
esquadra jurando não ter visto, ouvido e falado tudo aquilo que militares
respeitáveis relatam que ele viu, ouviu e falou quando o então presidente lhe
apresentou a forma já burilada do golpe: que colocava tropas da Marinha à
disposição.
E o que dizer de um delegado federal que
comandava a Abin – justamente a Agência Brasileira de Inteligência –, mas não
tinha a menor noção, muito menos informação sobre tudo o que se passava? E do
outro federal que usou o Ministério da Justiça para rastrear votos do então
candidato Lula e impedir que se repetissem no segundo turno?
E não é que – por coincidência? – saiu do
ministério para a Secretaria de Segurança do DF, responsável pela garantia da
Praça dos Três Poderes? No fatídico 8 de Janeiro, estava curtindo o Mickey e o
Pato Donald na Disney. Nem precisou de R$ 2 milhões da vaquinha de Bolsonaro...
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