Folha de S. Paulo
Medida contribui para preservar a confiança
dos cidadãos nos juízes e tribunais
Edson Fachin acerta ao buscar fortalecer
independência, imparcialidade e integridade da Justiça
A Justiça brasileira se beneficiaria muito
com a adoção de um código de conduta. A autoridade da Justiça deriva de sua
capacidade de aplicar a lei com independência, imparcialidade, consistência,
integridade e em prazo razoável. Quando o comportamento dos magistrados
compromete a reputação dos tribunais, a autoridade da Justiça declina e cresce
a disposição para desrespeitar suas decisões ou mesmo afrontá-las.
A Justiça brasileira desempenhou e desempenha um papel fundamental na defesa da democracia. Num mundo marcado por crescentes ataques às instituições constitucionais, a postura do Judiciário brasileiro tem se demonstrado um indispensável ativo democrático. Mas isso não é suficiente para garantir sua autoridade.
As diversas vulnerabilidades apresentadas
pelos tribunais e por alguns de seus membros abrem espaços para atos de
retaliação por parte dos inimigos da democracia. A aprovação do PL da redução
das penas aos golpistas;
a recusa pela Câmara em cassar a deputada Carla
Zambelli, condenada criminalmente;
a aprovação da PEC do marco
temporal. Tudo isso são exemplos de retaliação da maioria
parlamentar à autoridade judicial.
A falta de compromisso dessas facções
parlamentares com as regras do jogo democrático é conhecida. Mas sua capacidade
de retaliar o Judiciário cresce num contexto em que este se demonstra mais
vulnerável do ponto de vista reputacional. Os supersalários, o compadrio, a
falta de consistência, o excesso de decisões monocráticas, a suspeita de
parcialidade e o próprio esvaziamento dos plenários deixam os tribunais mais
vulneráveis a ataques à sua independência ou mesmo à captura por interesses
poderosos.
Tribunais ao redor do mundo têm sido alvo de
investidas. É inegável que os tribunais brasileiros, em especial o Supremo, são
muito poderosos e detêm uma grande capacidade de resistir e mesmo de negociar
com aqueles que os ameaçam. Mas isso inevitavelmente afetará a sua
independência e confiabilidade, quando não os obrigar a realizar concessões no
campo dos direitos de grupos vulnerareis. A erosão dos direitos indígenas e
trabalhistas no Brasil talvez seja um exemplo.
Acerta, portanto, o ministro Edson Fachin ao
propor uma série de medidas voltadas
ao fortalecimento da independência, imparcialidade e integridade da Justiça
brasileira. Acerta ao propor a adoção de um código de conduta para a
magistratura e outro específico para os tribunais superiores, de acordo com
suas especificidades.
Os códigos de conduta, já adotados na
Alemanha, na França, em Portugal ou nos Estados Unidos, têm por função
fundamental contribuir para a preservação da confiança dos cidadãos em seus
juízes e tribunais.
Impõem aos membros desses tribunais agir de
forma íntegra e imparcial. Mais do que isso, alertam para a importância do
comportamento dos magistrados, dentro e fora dos tribunais, para preservar a
reputação da Justiça. Há, portanto, dois grupos de bens protegidos por esses
códigos: a imparcialidade e a integridade, de um lado, e a reputação e a
confiança, de outro.
Vivemos tempos bicudos, não apenas no Brasil.
A democracia liberal (e social) está sob ataque e, com ela, a própria ideia de
independência do Judiciário. O desarranjo entre os Poderes no Brasil aponta
para um agravamento da crise institucional na próxima legislatura.
É imperativo que o Judiciário brasileiro se
torne menos vulnerável. A adoção de um código de conduta seria um excelente
antídoto contra aquilo que mais o fragiliza.

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