O PT não consegue decidir se é o partido do governo ou se faz oposição a Dilma Rousseff. Se suas bancadas no Congresso Nacional estão lá para dar apoio aos projetos do governo, como o pacote de ajuste fiscal, ou para "marcar posição" junto ao eleitorado, como tentou explicar o líder do partido no Senado, Humberto Costa (PE), quando interpelado sobre o fato de boa parte da bancada petista no Parlamento estar se alinhando contra as medidas de austeridade fiscal propostas pela equipe econômica. Os petistas, por exemplo, são os autores da maior parte das emendas às Medidas Provisórias (MPs) 664 e 665, que se propõem a corrigir distorções na regulamentação de alguns direitos trabalhistas.
A atitude do senador Humberto Costa é típica do lulopetista diante de situações críticas: dizer uma coisa e fazer outra. Foi exatamente o que fez Dilma Rousseff como candidata à reeleição, quando garantiu a intocabilidade dos direitos trabalhistas "nem que a vaca tussa". Logo depois de assumir o segundo mandato, deu o dito por não dito e anunciou "correções" que tornam mais rigoroso o acesso a benefícios como seguro-desemprego, abono salarial, pensão por morte e auxílio-doença. É exatamente o que, segundo o senador pernambucano, os parlamentares petistas estariam fazendo agora: acenar publicamente com críticas às propostas impopulares do governo e depois votar pela aprovação delas.
Essa ambiguidade - ou mendacidade, para sermos mais precisos - está criando problemas sérios no relacionamento já complicado do governo e do PT com o maior partido da base aliada, o PMDB, que se recusa a arcar sozinho com o ônus político das medidas impopulares enquanto o PT posa de defensor intransigente dos direitos trabalhistas. Vários parlamentares peemedebistas têm declarado que só votarão a favor das medidas de ajuste fiscal depois que os petistas manifestarem claramente sua disposição de votar a favor delas no Congresso. Essa intenção foi informada à equipe econômica do governo que se reuniu com os peemedebistas na semana passada para fornecer informações e esclarecer dúvidas a respeito das medidas que estão sendo propostas.
Se essa situação incomoda o PMDB, causa inquietação muito maior ao governo. Levantamento feito pelo jornal O Globo revela que uma surpreendente quantidade de senadores e deputados petistas está disposta a pura e simplesmente votar contra as propostas impopulares de ajuste que precisam ser aprovadas pelo Congresso.
Segundo o levantamento, entre 59 parlamentares petistas consultados de um total de 79 - 12 dos 14 senadores e 47 dos 65 deputados -, 40 desaprovam as propostas do governo consubstanciadas nas duas medidas provisórias e, entre eles, 20 votarão contra em qualquer circunstância, desobedecendo a orientação do Palácio do Planalto e da direção do partido. Apenas 18 dos consultados se manifestaram a favor e 1 se recusou a declarar seu voto. Entre os 40 que desaprovam as medidas, 10 poderiam se tornar favoráveis a elas "dependendo de modificações".
De qualquer modo, os parlamentares petistas consideram praticamente impossível a aprovação das MPs 664 e 665 sem modificações que atenuem as restrições a direitos trabalhistas. O próprio líder do PT no Senado, tomando a precaução de tirar a responsabilidade das costas de sua bancada e transferi-la ao conjunto do Congresso, foi categórico: "Algumas coisas têm que mudar; se o governo não negociar, o Congresso vai fazê-lo".
Pronunciaram-se na mesma linha, segundo O Globo, o senador petista Lindbergh Farias (RJ) e o deputado Vicentinho (SP). Para o primeiro, "ninguém vai faltar ao governo, mas temos que alterar essas medidas, colocar a conta também para os mais ricos pagarem". Para o deputado paulista, "tem que haver um limite entre a economia que o governo quer fazer, o combate às fraudes e assegurar os direitos dos trabalhadores".
Na verdade, as bancadas petistas no Senado e na Câmara ressentem-se, principalmente, da falta de articulação política do Planalto com o Parlamento. As duas MPs que tanta controvérsia têm provocado dentro do próprio PT foram enviadas ao Congresso sem consulta ou entendimento prévio entre a equipe econômica e a bancada governista. É por essas e outras que os petistas não conseguem decidir se são governo ou oposição.
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